Rangel Alves da
Costa*
Isso
aconteceu - de verdade verdadeira - lá pelas bandas da Cantirana, um dos
lugares mais distantes e escondidos dos sertões nordestinos, mas que com a
chegada da modernidade via internet e tudo mais, nada ficou a dever aos centros
urbanos mais avançados. Basta ver a cocotagem e os modismos. Até comércio com
nome difícil se alastrou por lá, a exemplo dos sempre abarrotados “Shoppis
Centis Jiboia Dourada” e “Sexis Shopis Calango Aceso”.
Pois foi
na Cantirana, em meio a uma família das mais tradicionais da região, que se deu
o famoso caso da troca de sexo. E mesmo quando ainda não estava tão na moda
como agora está essa história de mexer nas partes de baixo, ou vergonhas
encobertas, como se dizia por lá. Pois vou contar como foi, e segundo ouvi de
um cabra lá de Serrinha.
Para não
fazer rodeios, bom que se diga logo que a dita troca de sexo envolveu alguém
que até então era tido e havido acima de qualquer suspeita. Homem de
reconhecida reputação, pai de família e de netos, de farto poder econômico, de
conceito dos mais elevados na sociedade cantiranense. Difícil de acreditar que
um senhor com tais características, na casa de seus sessenta anos, fosse se
envolver com troca de sexo. Enfim.
Mas se
envolveu e quase o mundo acaba por causa disso. Não só a cidade, mas a região
inteira parou estupefata com o fato, com a desavergonhada história daquele até
então inatacável senhor e sua mudança de sexo. Contudo, há também de se dizer
que tudo começou por culpa do próprio homem, que já naquela idade e querendo
aflorar seu outro lado que se mantinha comportadamente escondido.
Tudo
começou depois de uma conversa que ele manteve, em confissão, com o vigário do
lugar. Acostumado a usar o artifício do confessionário para falar fofocas e
pecaminosidades com o desavergonhado do padre, principalmente sobre as
safadezas desenfreadas da rapaziada, acabou soltando uma frase que deixou o
outro de cabelo em pé. Disse que era triste ver a sexualidade tão aflorada e
ele não poder aproveitar nada daquilo. Por isso mesmo que não suportava mais e
ia mudar de sexo.
Ao ouvir
isso, o padre quase engasgou. Sem acreditar no que ouvia, emudeceu de vez e nem
respondeu à despedida do outro. Não procurou entender o contexto das palavras e
se pôs a martelar que o amigo havia acabado de assumir aquilo que ninguém
poderia imaginar. Depois de velho, sair do armário e mudar de sexo. Era demais.
E não suportava, como sempre acontecia, guardar em segredo aquela confissão.
Tinha de contar a alguém. E deu de cara logo com a beata mais fofoqueira da
paróquia.
Após ouvir
a fofoca, por três vezes a beata ameaçou enfartar, começou a se abanar de cima
a baixo, sentou e levantou, e logo resolveu tocar adiante a novidade, porém
jurando por tudo na vida que jamais contaria de qual boca havia saído a nova. Desse
modo, o fogo já estava aceso, a fumaça se espalhava por todo lugar, e logo
viria incêndio. E certamente seria um incêndio dos maiores.
Verdade é
que da boca da beata o senhor já saiu com fama ainda pior. Um velho safado, pai
de família e que agora se revelava querendo não só boiolar, mas afeminar de vez.
De janela a janela a situação foi ficando ainda mais feia para o seu lado. Já
era chamado de florzinha, viado velho, quenga velha, dentre coisas ainda mais
escabrosas. E a coisa ficou esquisita mesmo quando a conversa chegou aos
ouvidos dos familiares.
Até esse
momento, mesmo estranhando que algumas pessoas o olhassem sorrindo, com
zombaria e até dizendo palavras que não conseguia entender, o homem nada sabia
daquela conversa envolvendo o seu nome. Lembrava apenas que havia dito ao padre
que estava pensando em usar das armas da medicina e fazer um implante de um
órgão sexual muito mais novo e mais potente, vez que estava perdendo a
virilidade e precisava estar preparado para qualquer circunstância diante
daquela moçada fogosa.
Pois bem.
Quis dizer, e disse uma coisa, e o padre ouviu outra, ou deu uma maldosa
interpretação ao escutado. Se ouvisse apenas que o safado do amigo dizia que
pensava trocar sua ferramenta velha por uma nova, a coisa não tinha tomado a
proporção que tomou. Assim, mudar de sexo significa simplesmente trocar aquilo que
tinha como imprestável por um membro potente e jovial.
Partindo
de uma brincadeira, pois sabendo da impossibilidade de isso acontecer, o homem
acabou chamando para si toda a desgraça do mundo. A esposa arrumou-lhe a mala
no mesmo instante que soube da história; os filhos juraram nunca mais olhar na
sua cara; um neto disse que dali em diante não ia mais estudar de jeito nenhum;
a vizinhança fechou-lhe a porta; toda a cidade ecoou em alarde aquele prato
cheio.
Então ele
se lembrou de onde poderia ter partido aquela conversa. Saiu correndo em
direção à igreja, e de arma em punho fez o padre seguir até a porta e de
alto-falante na mão trazer a verdade à tona. Aí sim, nesse momento uma grande
verdade foi revelada, pois o padre, além de pedir perdão pelo mal entendido,
acabou confessando que na realidade aquele sonho de troca de sexo era seu, e de
mais ninguém.
Ele sim,
que não suportava mais ser padre se por dentro era uma freira, uma sacerdotisa,
uma libélula esvoaçante...
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
Um comentário:
Pois bem Professor Rangel: Acho que ficou melhor uma capa fixa para seu blog. Acredito que facilita seu trabalho, logo que basta postar a matéria escrita: crônicas, artigos etc. sem ser necessário preocupar-se com capa.
Quanto ao acréscimo que você solicitou por e-mail, assim que Gabriel tiver tempo e chegar aqui no meu computador, falarei com ele.
Quanto a crônica A TROCA DE SEXO, desejaria saber, dentro da sua criatividade onde conseguiu o cidadão de SERRINHA para contar-lhe tal estória. Contudo, como existe mais de uma SERRINHA no Brasil, creio que o CONTADOR DE ESTÓRIA é habitante de outra terra - quiçá - de outro Planeta. Como você conhece gente de outros Planetas, devo acreditar na história do homem das bandas de CANTIRANA.
Abraços,
Antonio Oliveira - Serrinha-Ba.
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