Rangel Alves da
Costa*
No último
final de semana coloquei o pé na estrada e segui em direção ao berço de
nascimento. Foram apenas três dias de reencontro com as raízes, os amigos e as
tantas belezas e misérias que ladeiam aquelas distâncias. Poucos dias, mas
tempo suficiente para novamente me alimentar da seiva essencial espalhada em
todo canto do meu Poço Redondo. Prefiro a denominação escrita no coração: Nossa
Senhora da Conceição de Poço Redondo.
Os
caminhos são distantes e desafiadores. Após chegar os limites do autêntico
sertão sergipano, quando a fotografia da vida ganha outra cor e outro matiz,
são as beiradas das estradas que logo dizem da real situação naquele momento.
Os olhos logo avistam as paisagens secas e esturricadas ou os campos
verdejantes. Dessa vez o meu olhar se mostrou sorridente. As últimas chuvas
fizeram renascer a vida naquelas imensidões antes devastadas pelas estiagens.
Os campos
desmatados e os mandacarus solitários faziam surgir a vegetação rasteira se distanciando
até perder de vista. As mesmas casas empobrecidas de beira de estrada com suas
portas abertas e parecendo abandonadas. Mas certamente que não, pois o
sertanejo sempre ao redor na sua lide ou pelos fundos da moradia fazendo uma
coisa ou outra. Ali um cachorro, acolá um menino correndo.
Poucas
árvores, lamentavelmente. Uma ou outra catingueira, um umbuzeiro numa malhada,
uma árvore perdida no meio do tempo. Desde muito que o sertão vem sendo
devastado impiedosamente e sem que se pense em qualquer replantio. Passaram a
lâmina e a serra em tudo, derrubaram tudo para a coivara e o preparo do chão
para o plantio. Mas depois a terra empobrecida, sem nutrientes, se transforma
apenas num campo desolado e sem vida. Eis a situação avistada por lá agora.
Nesse
passo, com o olhar num misto de admiração e desalento, pois a colcha verdejante
não afastava a certeza de um sertão consumido pela mão do homem, cheguei ao
refúgio do sol. Agora sim, agora o verdadeiro entristecimento. Sempre chego por
lá na esperança de encontrar alguma novidade boa, alguma obra importante,
alguma transformação na cidade e no município, mas tudo parece surgir de forma
cada vez mais negativa e dolorosa.
Poço
Redondo, diferentemente de todas as cidades sertanejas, regride impiedosamente,
cada vez mais vai se transformando numa cidade abandonada, maltratada,
praticamente destroçada. Não há nada, absolutamente nada, que se possa apontar
como obra que tenha trazido qualquer melhoria para os habitantes. Isto na
cidade, no cartão postal do município, e mais degradante ainda nas povoações
que formam o maior município, territorialmente, de Sergipe. São quase 1200km²
de abandono.
Da entrada
da cidade ao ponto mais longínquo, quando não há crateras nos calçamentos há
buracos no chão batido. É um verdadeiro sacrifício caminhar por ruas que desde
muito não sabem o que seja uma camada de massa cimentada por cima dos
paralelepípedos. Praças abandonadas, canteiros recobertos de areia seca, uma
tristeza infinita. E dói mais ainda ao lembrar que nas gestões de Alcino Alves
Costa a cidade era reconhecida pela beleza de suas praças, pelos verdadeiros
jardins floridos e verdejantes.
A cidade,
toda feia e negligenciada pela administração municipal, estava em festa. E uma
festa forjada para mostrar a incoerência com que tratam o município.
Anteciparam as comemorações da festa da padroeira Nossa Senhora da Conceição e
contrataram nove bandas para apresentações na Praça de Eventos. E não vejo
qualquer necessidade de uma prefeitura contratar tantas bandas, a um custo
elevadíssimo, para fazer festa num município de menor índice de desenvolvimento
humano de Sergipe, com a maioria da população vivendo na linha da miséria, com
o desalento morando atrás de cada porta.
Soa como
demasiada incoerência que a prefeitura tivesse dinheiro para pagar as bandas e
não tenha feito o depósito do salário dos professores nem pagado um centavo
sequer aos fornecedores. E também falta de visão administrativa, pois se os
professores tivessem recebido seus salários certamente teriam aquecido as vendas
no comércio local e durante as comemorações. Mas ouvi coisas de indignar sobre
os motivos tanto do contumaz atraso nos pagamentos como do abandono a que o
município está relegado.
Por mais
que muitos amigos me chegassem para contar suas mágoas, resolvi que não
discutiria nada sobre a situação do município nem sobre a politicagem que reina
por lá. Mas disse que não adiantava mostrar ódio ou enraivecimento se mais
tarde a maioria estaria erguendo a bandeira partidária do grupo que está no
poder e votando apaixonadamente. E acontece sempre assim.
Todo
poço-redondense sabe que sou adversário da atual administração, que não rezo na
cartilha da corrupção de jeito nenhum, ainda que parentes meus estejam sempre
de boca aberta debaixo das tetas. E estão gordinhos demais. Mas não sou contra
nomes nem grupos políticos. Sou contra todo aquele que torna o meu município
num meio de enriquecimento pessoal e administra para o caos, para o abandono,
para a destruição. Eis a feição atual de Poço Redondo.
Mas o que
avistei por lá, em cada amigo que encontrei e pude abraçar, foi muito mais
forte que toda tristeza sentida e ressentida. A cada dia que passa, a cada vez
que chego por lá, sinto o quanto sou admirado pelos meus conterrâneos. A elite
do poder me evita, mas não pode evitar de ver o quanto as pessoas simples se
sentem bem na presença de um verdadeiro amigo. E hei de retribuir, tornando
realidade o desejo de muitos, toda essa consideração. Quem viver verá.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
Um comentário:
Professor Rangel: O meu BOM-DIA após seu retorno da sua querida Cidade do Poço Redondo.
Vejo como é grande o seu zelo pela Cidade que lhe viu nascer!
Não sei se a sua militância como Advogado na Capital de seu Estado não lhe permite retornar definitivamente à política de sua Terra e candidatar-se na próxima eleição, além das atividades literárias que você as ama de coração. O que eu vejo é a sua forte amizade nas terras de seu pai - o saudoso ALCINO ALVES COSTA. Embora tenha trabalhado na Divisa Bahia/Sergipe, não tive o prazer de conhecer Poço Redondo, Terra de um povo corajoso que enfrenta desafios, assim como todo o nosso Sertão Nordestino.
Abraços,
Antonio José de Oliveira
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