Rangel Alves da Costa*
Sei que há uma ponte mais adiante ou em
qualquer lugar. E ela me espera passar.
Há um início e um fim. E uma ponte a divisar.
E ela me espera passar.
Uma ponte no outro lado do passo, no outro
lado do olhar. E ela me espera passar.
Pensamos viver em terra firme, assentando o
passo como donos do mundo, sem a verdade sobre a ponte despertar. Mas ela está
diante de todos. E ela me espera passar.
A quem foi dado destino de estar do lado de
cá, outro destino lhe aguarda do lado de cá. A única certeza da vida é a
existência da ponte. E ela me espera passar.
Vaidades, egoísmos, arrogâncias, soberbas e
ostentações pesam demais sobre a ponte. Somente o ser despido em maldade consegue
atravessar. E talvez ela me deixe passar.
Não adianta fazer rodeios, fugir, outros
caminhos buscar. A ponte existe como um caminho do homem, destino que jamais
poderá mudar. E ela me espera passar.
Não conheço a largura nem a extensão, se de
madeira ou cimento, se envolta em névoa ou na claridade do sol, mas sei que ela
está lá. E ela me espera passar.
A ponte no passo, no caminho, na direção.
Ninguém se eterniza onde está, eis que tem de seguir adiante, e a ponte não
pode esperar. E ela me espera passar.
Há dois lados separando a ponte, um onde
estou agora e outro mais ao longe, aonde terei de chegar. É o outro lado que
terei de alcançar. E a ponte me espera passar.
Em tudo há uma ponte, um limite que deve ser
ultrapassado. Depois da tristeza o caminho da alegria, depois da solidão alguém
encontrar. E a ponte me espera passar.
Mas a ponte não separa apenas a vida da
morte, pois também significa vencer as aflições de agora. Vence-se a agonia
para o sorriso chegar. E ela me espera passar.
Os objetivos na vida são apenas passos em
direção à ponte. Todos se esforçam para vencer os desafios e dificuldades e
logo a ela chegar. E ela me espera passar.
O homem vive além-fronteiras. Mas sabe que
também pertence ao lado de lá, onde ainda não esteve mas breve estará, após a
ponte ultrapassar. E ela me espera passar.
Difícil é ter a certeza da ponte e que dela
não se pode fugir, mas ainda assim ter de esperar no lado que está até o
instante que ela chamar. E a ponte me espera passar.
Dizem que há um rio debaixo da ponte, dizem
também que há um mar. Talvez apenas água corrente para o barco passar. E acima
dela todo caminhar. E a ponte me espera passar.
Na ponte está a folha em branco, a página
limpa, o papel esquecido. Ninguém chega à ponte permanecendo com a escrita de
cá. E ela me espera passar.
Os olhos molhados de lágrima se tornam
brilhosos após a ponte. A tristeza, a angústia e desilusão, tornam-se
contentamento após o seu limiar. E a ponte me espera passar.
E assim acontece porque a ponte também
significa transformação. Ninguém quer ultrapassar a ponte para continuar como
está. E ela me espera passar.
Ninguém deseja transformação sem que a
mudança seja com boa feição. E dificilmente as coisas mudam continuando no
mesmo lugar. E a ponte me espera passar.
A semente lançada é fruto após a ponte.
Depois da ponte o outono é primavera. As flores murchas e entristecidas logo
começam a brilhar. E a ponte me espera passar.
Difícil de ser avistada, mas a ponte sempre
está ao redor. Tantas vezes o homem se aproxima dela se ao menos notar, sem
nada desconfiar. Mas ela me espera passar.
O ser humano chega a terra através de uma
ponte e também por uma ponte irá retornar. O homem vive e ela permanece a
esperar. E ela me espera passar.
A existência é passagem, e não há outro
caminho a seguir senão através da ponte. E a vida permite que o chamado da
ponte possa se demorar. E ela há de me esperar pra passar.
Não tenho pressa de nada, não corro para
desejos alcançar, não dou um passo além nem para amar. Daqui avisto a ponte. Um
dia caminharei até ela atravessar.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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