SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

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terça-feira, 16 de dezembro de 2014

PAPAI NOEL, EU QUERIA...


Rangel Alves da Costa*


Desde criança que sempre tive certeza da existência do bom velhinho e não é agora, só porque já passei dos cinquenta, que vou desistir dessa crença. E ninguém, absolutamente ninguém, tem o direito de dizer que estou errado. Quero que Papai Noel continue existindo, e pronto.
Além de Papai Noel, acredito em muitas outras coisas que os renegados aos sonhos, ilusões e fantasias, há muito não acreditam. Creio que determinados personagens de livros são tão ou mais reais que muitas pessoas que andam por aí. E também sei que não são além do que realmente são todas vezes que as encontro nas páginas envelhecidas, descansando pelas estantes, quando as chamo para o mais belo dos diálogos: o da imaginação.
Não disse que quero a Papai Noel, mas apenas que eu queria, simplesmente porque deixo às crianças esse desejo bonito, de modo que aprendam a cultivar a esperança em ter e conquistar coisas boas. Já pedi muito no meu tempo de quero e se não consegui mais foi porque pedi demais. Naquele tempo eu quis apenas brinquedos e fiz até um estranho pedido: que chovesse no meu sertão. Infelizmente não fui atendido.
Mas a minha criança cresceu e a que ainda existe em mim de vez em quando dá vontade de arriscar um pedido ao bom velhinho. E silenciosamente vai dizendo eu queria isso e aquilo, eu queria aquilo outro e assim por diante. Contudo, a criança em mim está mais exigente, mais decidida, e troca brinquedos por situações muito mais sérias e até difíceis de serem atendidas pelo bom amigo.
Mas eu queria que o brinquedo antigo não desaparecesse completamente, que aqueles carrinhos de madeira e o cavalo de pau jamais deixassem de existir. Não que os brinquedos tecnológicos não sejam bonitos e atrativos, mas nada comparável àqueles objetos de se brincar no meio do tempo, no meio do mundo.
Eu queria que o menino pobre não tivesse de colocar o sapatinho velho à janela na noite de natal – nem em qualquer outra noite -, na esperança que o amanhecer lhe traga algo digno para ser usado. E também que os céus sob marquises não sejam aqueles cujas estrelas costumam cair para dizimar vidas inocentes abandonadas.
Eu queria que as ruas ainda fossem lugares para brincadeiras, espaços seguros para a meninada correr, jogar bola, arremessar bola de gude, brincar de se esconder, brincar de ciranda de roda, rodar com mãos dadas debaixo do imenso luar. E como eu queria ainda ouvir que se essa rua fosse minha eu mandava ladrilhar para o meu amor passar. E ouvir a voz infantil perguntando como pode um peixe vivo viver fora de água fria.
Eu queria encontrar a meninada debruçada em cadernos para desenhar castelos antigos, com reis, princesas, dragões, bruxas malvadas, cavaleiros valentes e um pé de feijão que vai crescendo, crescendo, crescendo. E também as mães e avós fazendo cafuné nos seus pequeninos e contando histórias antigas, sempre belas e cativantes. E avistar os seres encantados da natureza fazendo festa na floresta mágica da memória.
Eu queria que o mês de dezembro não se transformasse cada vez mais num mês qualquer no calendário, que as festas de fim de ano não signifiquem apenas comércio e troca de presentes e que o período natalino jamais perdesse sua sensibilidade humanista. Pois acredito e vivo o seu espírito, sinto a presença de coros angelicais e vejo brilhando aquela estrela anunciando o nascimento do pobre menino na manjedoura.
Eu queria um mundo de paz. Não da paz de paraíso, mas da paz possível de convivência sem tanta violência, sem tantas dores e aflições. Um mundo onde ainda fosse possível manter portas e janelas abertas, caminhar sem medo debaixo da lua e do sol, sentar na calçada para receber o sopro confortante da brisa do anoitecer. Nada disso seria impossível ao mundo, mas tão difícil de as pessoas acreditarem na sua possibilidade, e exatamente pela sua impossibilidade de novamente se humanizar.
Mas eu queria Papai Noel, eu queria...


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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