Rangel Alves da Costa*
O amor não é fácil de ser reconstruído. Há
quem afirme que jamais terá a mesma sustentação o amor que sofreu grande abalo.
Os alicerces já não serão os mesmos, ainda que sejam cimentados com mais pujança.
É que de repente o encanto vira pranto, a
felicidade se torna desilusão, e a magia amorosa apenas um sofrimento. As
perdas são constantes e sempre dolorosas, mas quando se fala em amor perdido,
terminado ou rompido, então a pessoa parece que vai se esvaindo, morrendo
também.
E assim porque o verdadeiro amor causa
sofrimento ao ser afetado. Quem ama faz do sentimento amoroso uma verdadeira
seiva de sobrevivência, faz da sensação amorosa um sentido sempre generoso à
vida. Alicerçado no coração, basta que os tremores dos desvãos da vida ameacem
e todo parece querer sucumbir.
A verdade é que o verdadeiro amor sempre
permanece. Quem ama não apaga o outro do sentimento nem da memória após uma
briga, uma separação, um distanciamento, um término, um adeus. O outro parte,
se vai, mas o amor permanece como algo muito mais forte que a pessoa ou a situação.
E o sofrimento causado pela separação se
torna assim tão doloroso exatamente porque o amor permaneceu. Porque continua
no coração, permanece na mente, ainda envolve os sentidos, é que faz agonizar
por dentro. Ora, se o amor fosse embora com a partida do outro seria diferente,
não restaria sofrimento algum. Mas também não seria amor.
Por isso mesmo que quem ama sofre, lamenta e
chora sua perda. Tudo que o coração acostuma se torna de difícil separação.
Sempre que a pessoa entrega parte de si, por amar e confiar, acaba sendo a
própria pessoa que se doa. E no adeus sempre fica faltando aquela metade tão
difícil de ser reconstruída.
Por mais que as relações modernas tornem
volúveis e inconstantes os namoros e os relacionamentos, ainda existem aqueles
que são verdadeiramente amorosos. E falar em amor verdadeiro implica muito mais
no convívio de um para o outro que um tirando proveito sexual ou meramente prazeroso
do outro.
O amor verdadeiro possui características
fáceis de serem reconhecidas, ainda que muitos jamais tenham sequer se
aproximado de suas feições. Coisas simples: o amor não é sexo, o amor não é
estar nem ficar, o amor não é qualquer coisa que se encontra, usufrui e depois
relega ao esquecimento. Nada disso é amor.
Olha a singeleza do amor: O amor é saudade.
Sim, pois somente quem ama sente saudade. O amor é sensação de prazer íntimo,
de encantamento no coração. O amor é o desejo do reencontro, é sentir na
distância a proximidade do lábio e o brilho do olhar. O amor é ternura, é
palavra singela que contente o outro, é toque de mão e promessa não revelada.
O amor é bilhete, é verso rimando amor com
sabor, é aquela sensação pulsante diante do outro. Uma carícia, um abraço apertado,
uma tal satisfação que a pessoa já não possa mais negar a si mesma: está
amando. O amor é construção, não tem sede de sexo, não vai tirando a roupa nem
procurando camisinha. Não. O amor sabe esperar, e espera cheio de
contentamento, pois sabe que aquela grandeza não se vive em instantes.
Mas eis o problema: O que fazer quando alguém
que ama assim se vê, pelas forças do destino, sem aquele de tanto amor? O que
fazer quando a perda ou a separação são inevitáveis, quando já não há mais
esperança de reencontro e refazimento? Reconstruir o amor, apenas isso.
Reconstruir o amor, apenas isso. Impossível
que a pessoa retorne, que retome seu lugar junto aos braços e aos lábios. O
sofrimento, a angústia, a saudade, tudo persistirá por muito tempo. E talvez nunca
se dissipe de vez. Mas o amor, por ser tão belo, possui, ele próprio, seus
instrumentos de reconstrução.
E a pessoa continuará amando sem sofrer.
Como? A pessoa que partiu, por não poder voltar se transformou na cor mais bela
do entardecer, na lua imensa, numa flor, no silêncio espiritual do alto da
montanha, no pássaro que segue a revoada, na borboleta que pousa no umbral da
janela.
Haverá coisa mais bela que isso? Tão belo
quanto o amor. Assim, reconstruir o amor de uma pessoa a partir do amor por coisas
singelas da vida é a forma mais eficiente de conservação e preservação dos
sentimentos. Então a pessoa olha a nuvem que passa e vê quanta poesia pode
escrever naquela folha em branco, mira a grandeza da lua cheia e percebe o
quanto de belo a vida tem a oferecer.
E assim vai reconstruindo seu amor. A partir
do amor a outros amores que nem sempre são perceptíveis aos nossos sentidos: a
chuva caindo, o nascer do sol, os encantos da vida.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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