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quarta-feira, 22 de junho de 2011

SABORES DA MULHER (Crônica)

SABORES DA MULHER

                          Rangel Alves da Costa*


Tudo depende do gosto e da fome de quem aprecia, mas a verdade é que se julga a mulher como se fosse um prato de comida e o faz antes mesmo de conhecer a procedência, os nutrientes corporais, o sabor, a textura, tudo enfim que diga respeito às suas qualidades. Assim, antecipadamente já sentenciam: Mas que mulher gostosa!
Se nada carregado demais no tempero presta, nem doce enjoativo nem muito salgado, nem muito cru nem muito cozido, nem frio demais nem muito quente, como seria então em relação à mulher, já que por antecipação ela é julgada como gostosa? E qualquer uma, basta que tenha seios e bunda e promova o tradicional rebolado, já é vista e tida como gostosa.
Se o problema é fome, então esse é um problema sério e difícil de ser resolvido, vez que mulher alguma é algo a ser servido para saciar a fome em um momento ou servir de petisco enquanto se engole outras coisas. Nem comida a mulher é, senão um favo de mel roubado do paraíso. E, com acerto, o poeta já disse que o que sacia na mulher é a essência feminina e não o que lhe está por cima.
Ao menos deveria ser assim que o faminto – tantas vezes por mero impulso - teria de considerar para não imaginar que toda mulher que encontra é comida que se deleita em qualquer lugar e a preço de banana de fim de feira. Certamente que encontrará o prato que deseja, mas apenas na mulher que se dê ao prazer de qualquer e ilimitado desfrute.
Verdade é que de vez em quando certas mulheres se revestem de frutas e começam a se vender como moranguinho, melancia, goiaba, jaca, bago de jaca, abacaxi podre e tudo mais, numa salada cuja vitamina tem aquele sabor já por demais conhecido da sem-vergonhice, do erotismo barato e até da pornografia. Mas há quem as tenha como sonho de consumo numa mesa de ilusões e de total falta de conhecimento sobre o verdadeiro prazer que deve proporcionar uma mulher.
Fato é que diferentemente do que a grande maioria das pessoas imagina, mulher não tem propriamente um sabor, mas um tempero próprio que a identifica e diferencia das demais, dando a cada uma característica e um jeito de se apreciar muito próprios. A boca conhece menos tais atrativos que os olhos. Estes possuem o privilégio de enxergar da raiz ao fruto, bastando que imagine o tipo de flor que sacie através do aroma.
Jorge Amado já colocou sabor de cravo e canela na sua Gabriela. Literariamente falando, nada impede que as frutas gulosamente mordidas ao amanhecer no pomar sejam trocadas pela fome da carne morena e macia ao anoitecer ou qualquer instante que surja a fome do amor. Mas também neste sentido a mulher não seria propriamente uma comida, mas um prazer que se tem na mesa sempre farta da paixão.  
Contudo, as valorosas especiarias que existem e devem ser apreciadas na mulher nada tem a ver com o sal, açúcar, cravo, canela, pimenta, cominho e açafrão, dentre muitas outras, mas sim um tempero tão próprio e tão pessoal que somente terá o prazer de senti-lo aquele que trocar o cego apetite pelo amor comedido, calmo, paciente, semeando e preservando seu alimento até a eternidade de algum dia.
O tempero da mulher, como já dito, não é condimento que se possa apreciar pela boca, pelo paladar, pelo uso como experimento. Não é produto que se possa pagar para ter, comprar para usufruir, adquirir para usar como bem quiser. Muito pelo contrário. Cabe ao olhar esse deleite de vê-la inteira no seu pomar majestoso de corpo e ao olfato sentir todos os perfumes e aromas.
Verdade é que o apetite sempre irá surgir, também a sede daquele suor que escorre na pele. Mas no deserto tudo também é isso, surgindo miragens de oásis com fartura de tudo. E o bom tuaregue não se deixa iludir com tudo que vê ao longe. Calmamente caminha até encontrar o que deseja, sem pressa e sem ilusões. Sabe que sua fome somente será saciada se não se deixar levar pela gula e pela ambição, senão até corre o risco de comer terra pensando que é farofa.
Por isso é preciso muito cuidado com o prato e o pote que vê à frente. Mulher existe que é um verdadeiro pote com nada dentro, um prato vazio, pura indigestão.



Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com  


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