Rangel Alves da Costa*
Dizem que a lua – esse mesmo corpo celeste que é satélite da terra e que vai girando elipticamente ao seu redor – é uma bela senhora que vive contente e majestosamente iluminada ao lado de suas filhas.
A lua em si, aquela que cada um avista lá em cima, douradamente iluminando a noite, não é, contudo, a mãe-lua ou a senhora lua, mas sim uma de suas filhas que é enviada pela genitora para cumprir seu alumiado percurso após o escurecer.
Como são muitas as filhas da lua e a matriarca apenas ordena o trabalho a ser realizado pela sua filiação, logo ao amanhecer é indicado a cada uma onde deverá surgir brilhando no céu daquela noite. Lua mais velha vá por ali, lua mais nova vá acolá...
Assim, enquanto a mãe continua recolhida na sua moradia astral, cada filha vai brilhar na noite do continente europeu, do asiático, do africano, do americano, e assim por diante. E é por isso que a lua não brilha igual e não se apresenta da mesma forma em todo lugar.
Imaginam que a lua seja uma só onde quer que apareça, mas não acontece assim não. A lua do Japão não é a mesma lua das cordilheiras andinas, a lua das estepes russas não é a mesma que ilumina as tradições noturnas dos aborígenes australianos.
A lua do sertão é muito diferente daquela avistada na cidade grande. Do mesmo modo, a lua que se derrama na escuridão de uma região não é vista de modo igual por todos que ali habitam. Até mesmo porque a lua que ilumina cada lugar está sempre acompanhada de outra lua, sua irmã.
E esta, de tão triste e recolhida, quase sempre é ofuscada pela luz principal. Mas não para todos, pois ela vem exclusivamente destinada a ser vista apenas por certas pessoas, que por seu estado espiritual ou sentimental, não conseguem reconhecer a lua principal. Apenas a lua triste.
Esta lua triste possui uma história tão triste quanto a tristeza de uma lua entristecida. Tida como filha problemática da família, principalmente por gostar de viver solitariamente recolhida, escrevendo versos no breu das galáxias, dizendo que preferia ter nascido estrela cadente a ser lua no seu mesmo percurso.
Enquanto suas irmãs brincavam e cantavam, a lua triste recolhia-se à janela para lançar os olhos lacrimejantes aos desvãos dos astros perdidos; enquanto suas irmãs se enchiam de joias douradas, perfumes etéreos e vestimentas bordadas nas nuvens, ela preferia a singeleza de uma lua vestida apenas com a cor dos olhos de quem a avistava.
Por ser assim e nunca aceitar ser forçosamente diferente, é que era rejeitada pelas irmãs e castigada pela mãe. Para diminuí-la, para que se sentisse como insignificante, é que jamais lhe foi permitido iluminar, sozinha, qualquer continente ou país, ou mesmo pequenina região.
E para aumentar seu castigo teria que trabalhar muito mais que as outras. Enquanto cada uma seguia para seu lugar na noite, ela tinha de dividir-se em muitas e acompanhar cada irmã aonde elas fossem. A irmã se apresentava imponente, cheia, bonita, enquanto ela ficava entristecida esperando uma chance de lançar qualquer raio de luz.
Assim, a aparição na noite da lua triste era e continua diferente daquela de suas irmãs. Acompanha, ao mesmo tempo, cada uma delas, mas não pode ser avistada por todos como acontece com aquela de luz indistinta, de luz principal.
Contudo, tal fato acabou se revelando de importância fundamental para muitas pessoas, ainda que a própria lua triste talvez nem tenha conhecimento disso. Como dito, pessoas existem que só conseguem avistar a lua triste, o astro entristecido que derrama sua luz em gotas de melancolia, em pétalas de saudade, como orvalhos poéticos e solitários.
Por mais que a outra lua resplandeça cheia, alegre, festiva, os olhos apaixonados só conseguem avistar a luz do outro luar, da lua triste. Assim, nas janelas solitárias da noite e nas montanhas dos corações amargurados, a lua triste passeia em sua plenitude.
E que luz encantadora, ainda que esteja ofuscada pela lágrima que cai.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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