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quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

FALTA ALGUÉM, QUEM VEM? (Crônica)


Rangel Alves da Costa*


Se de repente, para um acontecimento importante da vida, uma realidade ou encenação, um momento que não pode esperar, faltar alguém para ser principal personagem, para fazer a composição, para não desfalcar, quem virá?
O velho filósofo de lanterna à mão, subindo e descendo as ruas procurando o homem honesto na sociedade, não foi mais visto fazendo o percurso, não foi mais visto alumiando a face de cada um. E agora, quem virá procurar ao menos um ser que dignifique a existência e os trabalhos da Criação?
Se ninguém quiser ser Diógenes de Sínope, certamente aceitará outra missão, ser outra pessoa. Então quem estará disposto a subir a montanha, e lá em cima perto das nuvens, próximo ao primeiro degrau da escada do céu, confessar os seus erros, detalhar seus pecados, dizer a mais absoluta verdade sobre seus atos terrenos?
Proponho que alguém aceite fazer diferente do que realmente faz. Neste sentido, recomendo que reflita o quanto critica as ações dos outros sem agir muito diferente dos criticados; que critique as corrupções parlamentares, as ludibriações governistas, as improbidades das governanças municipais, ao mesmo tempo em que deixa de votar nestes mesmos parlamentares e governantes.
Ainda no caminho destas proposituras, proponho que surja alguém que vá além do discurso mesmista da indignação com a desagregação da família, a violência doméstica, os descuidos e omissões dos pais para com os filhos. E que, por isso mesmo, se preocupe mais com sua família do que com a dos outros, saiba ouvir e ponderar antes de partir para as agressões e xingamentos, procure saber o que os seus filhos andam fazendo e em qual companhia.
Verdade é que falta alguém que verdadeiramente saiba amar bem mais do que a palavra expressada sobre o amor. Quem é capaz de não confundir o amor relacional com o desejo carnal; de, com o coração verdadeiramente tomado do mais puro sentimento, levar diante do outro um poema na boca e dizê-lo baixinho perto da face, diante do lábio; de ter coragem para dizer que no momento só pode oferecer uma flor, mas quando puder presenteará com uma concha de mar enfeitada de onda?
Falta alguém, quem vem? Quem vem levantar da cadeira para dar o lugar ao idoso, à grávida, ao enfermo? Quem vem com o copo plástico na mão, o papel do picolé, o copinho do sorvete, a ponta apagada do cigarro, o embrulho do bagulho que acabou de comer, em direção à lixeira? Quem vem para ajudar ao idoso atravessar a faixa de pedestre, para ensinar sem enganações onde fica uma rua ou um local, e até para olhar para o próximo que passa sem ser com arrogância e frieza?
Mas ainda falta alguém, o problema é saber que vem. Quem vem com encorajamento para dizer que nunca deixou de ser romântico, que cantaria serenata à janela, jogaria pela janela uns versos rimados de amor, choraria pelo desamor, prantearia a saudade, deixaria no umbral da janela um buquê de flores do campo? Que vem dizer que ama de verdade e por isso tudo faria para demonstrar esse amor?
Quem vem se indignar com as pichações dos marginais, com as praças e jardins abandonados, com os animais abandonados pelas ruas, com as crianças drogadas jogadas embaixo das marquises, com o padre pedófilo que sobe no púlpito para falar em pecado, com a criança que foi violentada pelo padrasto ou familiar, com a mulher que todos os dias apanha do marido bêbado? Mas se vier que não venha apenas com silenciosa revolta, mas com a palavra ecoada perante o mundo. Um dia alguém ouvirá!
Quem virá para humildemente dizer que errou, confessar por vontade própria, redimir-se das injustiças praticadas, das falsidades promovidas, das mentiras espalhadas? Quem virá pedir perdão, erguer a mão, reconhecer no inimigo um irmão? Quem virá tomar ainda banho de chuva, não se envergonhar de cantar bem alto debaixo da molhação, dizer que ainda é criança, ter vontade de ser realmente adulto?
Mas ainda falta alguém. Quem vem? Você virá?...
  

Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com 

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