Rangel Alves da Costa*
“Queria
viver diferente...”.
“Está
descontente com a vida que tem?”.
“Não...”.
“E
então?”.
“Um viver
diferente nas páginas dos livros...”.
“Saindo de
si para ser personagem?”.
“E depois
voltar...”.
“É uma
ideia realmente interessante...”.
“Viver
dentro da trama, da história, do enredo...”.
“Mas
interferindo no contexto?”.
“Impossível,
pois seria reescrevê-la...”.
“E
começaria por onde?”.
“Talvez
dentro de algum livro de Jorge Amado...”.
“Uma
mulher agreste, talvez. Mas ele também utiliza muitas prostitutas nos seus
romances...”.
“Certamente,
mas prefiro ser uma daquelas mulheres entristecidas esperando seus esposos na
beirada do cais...”.
“Mas são
muito sofridas...”.
“Daí a
poesia nos personagens, naquelas mulheres. De repente, e toda a esperança da
vida no olhar tristonho que mira o véu das águas. E que contentamento ao
avistar o barquinho ao longe, voltando...”.
“Pensaria
em ser Penélope...”.
“Que honra
para qualquer mulher...”.
“Enquanto
Ulisses vence dragões, luta contra o desconhecido, sempre buscando
retornar...”.
“Ela
virtuosamente espera o seu esposo, fiando e desfiando a toalha da honradez
feminina...”.
“Creio ser
o exemplo maior da virtude conjugal...”.
“Sem
dúvida. E ela não sabia que o seu esposo um dia retornaria, apenas manteve-se
fiel ao seu juramento...”.
“E
conseguiu...”.
“As ações
de perseverança sempre dão bons resultados...”.
“E quais
outros personagens?”.
“Ana
Terra...”.
“Ah, sim
Ana Terra criada por Érico Veríssimo...”.
“No livro
O Tempo e o Vento, primeiro volume da trilogia...”.
“Lembra-se
das características...”.
“Uma
mulher que sofreu por amar um homem com sangue de índio, foi violentada por
bandoleiros, mas cujo filho com aquele seria um grande nome na história
sulista...”.
“Mas
somente mulheres?”.
“Não. Mas
vou citar mais uma que gostaria de ser...”.
“Qual...”.
“Tia
Anastácia, aquela mesma doceira do Sítio do Pica-Pau Amarelo criado por
Lobato...”.
“A negra
amiga de Dona Benta e dos meninos traquinas...”.
“Mas
principalmente pelos doces. Quanta gulodice meu Deus. Mas não dela, a minha
loucura por docinhos, bolinhos de chuva, aqueles biscoitos maravilhosos...”.
“Quanta
água na boca. Mas quanto aos outros personagens...”.
“Ah, mas
como eu queria entrar naquele livro de José Mauro de Vasconcelos...”.
“Rosinha,
Minha Canoa ou O Meu Pé de Laranja Lima, dentre outros que não lembro agora?”.
“O Meu Pé
de Laranja Lima, e para ser o danado do Zezé, aquele menininho porreta...”.
“E também
sofredor...”.
“Sim,
muito sofredor, principalmente pelo que fizeram com o seu amiguinho...”.
“O seu pé
de laranja lima...”.
“E também
o portuga...”.
“Coitado
do portuga. E vem aquele malvado trem e...”.
“Lembra-se
da frase dita por ele quanto perguntado por que estava triste?”.
“Não, mas
creio que disse que há uma semana haviam cortado seu pé de laranja lima...”.
“Tantos
personagens maravilhosos...”.
“Tantos
espelhos...”.
“Fotografias
escritas...”.
“Vidas...”.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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