Rangel Alves da Costa*
Cegueira é uma incapacidade orgânica que impede parcial ou totalmente a
visão. É a condição de falta de percepção visual, devido a fatores fisiológicos
ou neurológicos. É a incapacidade orgânica de ver.
Mas também, popularmente é tida como cegueira a falta de percepção ou
de apreensão da realidade, do significado das coisas ou acontecimentos; a falta
ou perda de bom senso, de lucidez, ou da capacidade de raciocinar, especialmente
devido a sentimento ou emoção intensos.
Do mesmo modo, e mais usualmente ainda, cegueira significa ignorância,
fanatismo, paixão exacerbada, intensidade no afeto, obcecação, tudo que perde o
sentido da racionalidade para se fazer sem limites.
A cegueira, vista sob o aspecto do forjamento do irreal, provoca
situações tão conflitantes que, na maioria das vezes, torna o indivíduo alheio
à realidade e passivo de ser reconhecido até como insano, completamente tomado
de loucura diante do absurdo que extasiantemente cria.
Haveria de se indagar, então, por que uma pessoa tida como normal, de
repente não consegue enxergar aquilo que para os outros está tão claro. Ou, de
outro modo, o porquê de uma pessoa simplesmente não querer perceber determinada
realidade naquilo que está à sua frente, ao seu lado, no seu convívio.
Uma velha estória serve como ilustração do dito acima. A casa foi
construída e jamais reformada. Um dia, debaixo de trovoada, as primeiras
goteiras começaram a surgir. E o dono da casa simplesmente ignorou. Passados
alguns, ele percebeu algumas pequenas rachaduras. Mas pequeninas, simplesmente
ignorou
Numa tarde de vendaval, a casa chegou a estremecer. Mas o homem apenas
olhou as estruturas no dia seguinte e concluiu que tudo continuava sem perigo
algum. Por ali passou uma velha senhora e disse, quase que profeticamente, que
do jeito que estava nem precisava de trovada ou vendaval para tudo desabar,
bastando que o dono cismasse de bater com martelo um prego na parede. E disse
ao homem que ou ele saía da casa para fazer os reparos necessários ou era
melhor esquecer seus quadros e retratos.
Quando a mulher saiu, raivoso com as observações, o homem bateu a porta
com ignorância e força. No mesmo instante ouviu um barulho estranho atrás, e
mal teve tempo de olhar para cima e ver parte do telhado desabando. Correu para
o meio do tempo, e da rua chorou feito criança ao ver tudo que tinha ficar
debaixo de escombros.
Outra pequena estória exemplar. O eleitor era tão fanático por um
candidato, mas tão apaixonado mesmo que aonde chegava vivia pregando suas
virtudes, seu senso humanista, seus gestos benevolentes, sua inatacável
condição de pai dos pobres e defensor dos oprimidos. E falava sobre planos,
sobre o muito que iria fazer, sobre as maravilhas do mundo nas mãos do seu
candidato.
Mas aonde chegava também encontrava alguém dizendo que muito cuidado
com o que dizia e defendia, pois se observasse desapaixonadamente, se tivesse
mais um pouquinho de atenção no seu deus candidato, logo saberia que o mesmo
não passava de um aproveitador e chegado à corrupção. Então era preciso que
alguém segurasse o fanático pra ele não aflorar todo tipo de violência.
Exemplos de cegueira se alastram por todos os cantos e meios. Nos seios
familiares, nas instituições, e também nas religiões, seitas e crendices. A
religiosidade impõe tamanha cegueira que se abdica da divindade para o apego a
ídolos e falsos profetas. Despersonalizando totalmente o indivíduo, aos poucos
o transforma num mero objeto sem identidade e sem qualquer tipo de resistência.
Então é a hora em que o espertalhão, aquele que tem o olho aberto demais,
começa a agir
E se assim vão os cegos tateando pelos seus mundos de ignorância, até
que o abismo os acolha dizendo que tem asas.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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