SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



terça-feira, 18 de dezembro de 2012

DIA 21: OS SINAIS DO FIM DO MUNDO (Crônica)


Rangel Alves da Costa*


Após a meia-noite do dia 21, os sinais do fim do mundo ocorrerão de momento a momento, seguidamente. Até...
Se no meio da noite o telefone tocar, é bom orar antes de atendê-lo. Nessas horas, até o amanhecer, dificilmente um telefone toca para avisar coisa boa. E se algum parente já estava muito doente, então. Pode ter sido o fim do mundo pra ele.
Os sinais são mais que visíveis ao tentar retornar para casa no meio da noite, madrugada adentro. Nas esquinas, nos becos, nos lugares mais inesperados, a bandidagem poderá estar à espreita para decretar o fim dos tempos de quem pensa que caminha em segurança.
Trovoada, tempestade ou vendaval na madrugada é um péssimo sinal, principalmente se a casa está com a estrutura danificada, telhado precisando ser reformado, paredes alquebradas pelo tempo. De hora pra outra pode ser o fim do mundo pra toda família.
A certa hora, já próximo ao amanhecer, a pessoa rola de lado a outro na cama com uma dor terrível no peito. Uma dorzinha que surgia e desaparecia, e por ser assim jamais despertou maiores cuidados. Com a respiração ofegante, a dor ainda mais acentuada, nem consegue falar ao telefone para pedir socorro. O descuido com a saúde acaba sendo o fim de muita gente.
Se conseguir, contudo, atravessar a madrugada sem o fim do mundo chegar, certamente levantará preparado para o que vier daí em diante. E isto implica, infelizmente, ter a certeza que ainda que seu mundo aparentemente não corra perigo, ainda assim o fim já chegou ou está chegando para uma imensidão de pessoas.
Ao abrir a janela, o alvorecer encantador não significa absolutamente nada, pode ser apenas uma ilusão; a paisagem em perfeita harmonia pode estar guardando segredos em seu âmago; a normalidade da manhã, a continuidade da vida, tudo isso poderá desandar no momento seguinte.
Basta fechar os olhos e imaginar-se noutras paisagens, noutros locais e cenários para enxergar o quanto o mundo foi cruel para tantas pessoas que naquele momento tiveram o seu fim. Crianças africanas mortas de fome e de sede, espalhadas pelos descampados da brutalidade da vida.
Os guerreiros, ou suicidas de toda guerra sem causa, já não conseguem sair de suas trincheiras, apertar o gatilho, mirar o inimigo. São vítimas de si mesmos e da errônea crença que batalhas, guerras e revoluções desumanas produzem algo útil nas suas vidas. E não precisou que nada descesse de cima para ceifar o destino, pois apenas colhem a morte semeada.
Ainda é cedo, mas desde as primeiras horas do dia que as famílias choram os seus mortos. Acertos de contas de drogas deixaram suas vítimas nas vielas imundas, da imunda vida imposta pelos vícios e tráficos. As overdoses chegaram famintas e cruéis naquela noite. Muitos se jogaram de cima, bem do alto de qualquer lugar, num voo perdido em busca do papelote, da última grama, da pedra mortal.
Ainda é manhã e ainda nem se imagina quantos jazem nesse que foi o último dia de suas vidas. Para estes os sinais do fim do mundo chegaram terrivelmente, mas muitos outros continuam reféns do que possa acontecer dali em diante. Porque tudo é invisível, quase silencioso, reconhecido apenas no grito de dor que irrompe.
Nesse dia nada cairá do céu para ferir ou matar. Nenhuma espada de fogo, nenhuma fenda se abrindo, nenhuma chuva de meteoritos. Na terra mesmo o ser humano se incumbirá de ser seu próprio algoz, do próximo e até do desconhecido. Em todo lugar há uma discussão, uma briga, uma violência, uma demonstração de força, uma morte. Há ainda a violência no trânsito, a violência das injustiças e arbitrariedades. E tudo isso mata.
Tais são, pois, os sinais do fim dos tempos. O dia 21 de dezembro de 2012 apenas simbolizará o final do que já vem sendo destruindo há muito. Mas não será nesse dia o ponto final, pois o homem – e é tão próprio dele – quer ter a capacidade de ele mesmo destruir tudo. E de uma vez por todas.

  
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

Nenhum comentário: