Rangel Alves da Costa*
Essa época festiva, de Copa do Mundo e
pensamentos voltados para as críticas e aplausos às seleções, tem se mostrado
como o momento ideal para outras festanças. Aproveitando-se da desatenção do
povo, de sua frágil vigilância acerca dos recentes acontecimentos nos poderes e
nos bastidores da política, eis que fatos vão acontecendo que nem a mídia tem
dado a importância devida, mesmo que mereçam grande repercussão.
Acaso acontecesse há uns dois meses atrás,
verdade é que bastaria o fato de o Supremo Tribunal Federal cogitar em
conceder, sob a nova presidência, a permissão para trabalho externo de alguns
dos principais condenados do mensalão, e logo as manchetes dariam o tom da
discórdia ou da aceitação. Indubitavelmente que os jornais impressos e
virtuais, bem como os noticiários televisivos, cuidariam do caso até com
estardalhaço.
Mas eis que o STF se reuniu tranquilamente e
julgou não só pela concessão da medida, mas também pela mudança do regime de
cumprimento da pena. E condenados como José Dirceu, Delúbio Soares e Valdemar
Costa Neto logo deixaram o Presídio da Papuda e foram para outros
estabelecimentos prisionais destinados ao regime semiaberto. Já começaram a trabalhar
e agora fazem planos maiores, que é a liberdade total, e de maneira muito mais
rápida que a pena imposta em sentença. E se a copa durasse mais certamente
conseguiriam de uma hora pra outra, e pelos motivos que mais adiante serão
citados.
A partir do mês de junho do ano passado e no
percurso até chegar a Copa do Mundo, não só a imagem da presidente Dilma vinha
capengando como sua reeleição correndo sério risco de dar com burros n’água.
Nunca se viu o planalto tão aflito, amedrontado, verdadeiramente temeroso do
que poderia acontecer durante a realização do mundial. Ora, se de vez em quando
as massas tomavam as ruas indignadas, raivosas e barulhentas, gritando palavras
de ordem contra os gastos excessivos com a competição em detrimento dos
investimentos em educação e saúde, certamente que o medo maior era que tudo
explodisse de vez no período do evento.
Alguns grupos ainda saíram às ruas, ainda
continuam esbravejando suas iras contra as políticas governamentais, os
políticos e também contra a governante, mas nada de provocar qualquer susto na
turma palaciana. Não obstante a inação do povo que tanto prometeu voltar às
ruas e depois preferiu erguer a bandeira da seleção e vestir sua camisa, a
omissão acabou se transformando em aceitação. E o que vem ocorrendo foge a toda
e qualquer expectativa, eis que ao invés de despencar de vez na aceitação
popular, a última pesquisa divulgada mostrou que a popularidade da presidente
começou novamente a subir.
Haveria de se indagar se as pessoas que foram
pesquisadas pelo Datafolha não estavam embriagadas em torno de um estádio, não
estavam festejando demais para sequer dar muita importância ao perguntado, não
deram qualquer importância ou simplesmente responderam como brincadeira. E
assim porque difícil imaginar que a população uma hora esteja jogando pedras e
na outra oferecendo flores. O crescimento foi pequeno, é verdade, mas também
inegável que diante de uma conjuntura totalmente desfavorável bastou tal fato
para que o governo já contasse como certa uma vitória no primeiro turno.
Seria injusto e perigoso tecer apenas suposições
diante do relatado, mas também não se pode deixar de cogitar intencionalidades
espúrias tanto no momento escolhido para beneficiar os condenados do mensalão
como na feitura da pesquisa, só para citar dois casos. Ora, não há como pensar
diferente. Tudo se mostra como verdadeira engenharia de ações premeditadas para
produzir os resultados desejados sem o povo perceber, reagir, criticar.
Aproveitaram-se da embriaguez patriótica, de momento de fragilidade crítica e
de inação contestatória do povo para agir em surdina. Havia certeza de que não
haveria debate sobre o acerto ou não das medidas tomadas.
Como se costuma dizer, tudo parece ter sido
planejado e bem planejado. Quer dizer, aproveitaram de uma ocasião em que a
população não se mostra com outra preocupação senão com a copa, aproveitaram de
um momento em que o povo está torcendo, vibrando, dialogando somente sobre
futebol, e resolveram agir. E cientes de que não haveria reações ou estas
seriam mínimas.
E assim, enquanto o povo festeja, vai esquecendo-se
de outros assuntos mais importantes para pensar somente em Copa do Mundo, falar
sobre a lesão de Neymar e as possibilidades da agora fragilizada seleção
brasileira, os poderes vão manejando o leme na direção que desejam. Amanhã,
quando voltar a abrir os olhos, já terá sido tarde demais. As ações já foram
perpetradas, os estragos já foram feitos e restará apenas o espanto de nenhuma
valia.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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