Rangel Alves da Costa*
O forró é estilo musical, é dança, é ritmo, é
melodia que se enraizou e se espalhou pelo Nordeste brasileiro como o próprio
xiquexique e o mandacaru. Se na terra não pode faltar as cactáceas espinhentas
suportando as agruras do sol, nos salões, salas de reboco e varandas não pode
faltar o forrobodó para alegrar a peleja cotidiana do sertanejo. Basta ouvir o
som da sanfona, do pandeiro, do triângulo e do zabumba que o espírito se contagia
e o corpo inteiro fica querendo chinelar.
Tradição tão nordestina, simbolizando a
verdadeira aptidão festeira do sertanejo, mas é de origem europeia,
modificando-se que foi das danças de salão. Mas já em fins do século XVI, em
Pernambuco, bailes populares eram acompanhados pelo ritmo da sanfona. Os ritmos
se diversificaram e ganharam nomes próprios como o xaxado, o baião, o xote e o
coco. Todos exigindo sensualidade e requebro dos dançadores. Mas foi o baião
que alcançou maior sucesso, principalmente após a ascensão de Luiz Gonzaga no
cenário musical brasileiro.
A partir de 1940, Luiz Gonzaga, depois
denominado Rei do Baião, começou a popularizar o ritmo na junção voz e
instrumentos. Com o baião também a sanfona alcançou status de reverência. E de
repente o forró deixava de ser exclusividade das festanças nordestinas para ser
apreciado e dançado em todas as regiões. A discriminação musical foi quebrada a
partir do sucesso obtido por sanfoneiros nordestinos no eixo Rio-São Paulo.
Nomes como Zé Calixto, Gérson Filho, Luiz
Gonzaga, Dominguinhos, Pedro Sertanejo, Sivuca, todos nordestinos, de repente
já estavam migrando do sul para as terras de origem sua arte musical. Quer
dizer, os ofícios aprendidos nos rincões nordestinos foram parar nos
auditórios, nas rádios, nos programas musicais dos grandes centros. E retornava
para o seu povo na forma de grandes sucessos para encantar os salões festeiros
durante todo o ano. E assim porque o nordestino não se contenta apenas com a
sanfona junina, querendo sempre mais a qualquer hora.
A partir dos grandes mestres da sanfona, do
acordeon, da concertina, do fole, todos dando o mesmo nome para o instrumento
do tocador, sanfoneiro ou forrozeiro, o forró foi resguardando seu lugar como
tradição cultural. Muitos outros nomes, ainda que apenas cantores ou participantes
de grupos, enriqueceram ainda mais a festança forrozeira. Marinês, Abdias,
Anastácia, Sebastião do Rojão, Elino Julião, Clemilda, Zenilton, Genival
Lacerda, Jacinto Silva, Jackson do Pandeiro, Mestre Zinho, Trio Nordestino e
tantos outros, mesmo sendo mais reconhecidos como cantadores, igualmente devem
ser vistos como forrozeiros.
Como se depreende, o forrozeiro é aquele que
cantando ou tocando, ou fazendo as duas coisas, faz a poeira levantar com os
casais chinelando no salão. Dominguinhos cantava e tocava, Luiz Gonzaga também.
O mesmo ocorrendo com Abdias e Sebastião do Rojão, só para citar alguns
exemplos. Já Clemilda, Genival Lacerda e Marinês são mais conhecidos pelas
vozes que enriqueceram as melodias. Mas Gérson Filho foi representante máximo
do autêntico forró pé-de-serra, aquele que nasce da pureza da sanfona e
acompanhado apenas pelos instrumentos tradicionais. Este sim, este alagoano de
Penedo foi forrozeiro na sua mais pura expressão.
Fiel às tradições nordestinas, Sergipe também
tem lugar garantido na história do forró. Mesmo sendo alagoanos, Gérson Filho e
Clemilda abraçaram Aracaju como chão de vivência e a partir daqui deram
continuidade às suas trajetórias de sucesso. Mas outros nomes souberam se firmar
com a maestria do dedilhar na sanfona e também na cantoria. Neste sentido, há
de se reconhecer a importância de forrozeiros e sanfoneiros como Erivaldo
de Carira, Cobra Verde, Domingos Vassoural, Luiz Paulo, Coelho dos Oito Baixos,
Edgar do Acordeon, Zé Américo de Campo do Brito, Robertinho. E também de
Mestrinho, Sávio e Renê, estes da safra mais nova.
Não posso
esquecer os forrós de antigamente no meu sertão de Poço Redondo. Diferentemente
de hoje, aquela região tinha sanfoneiro de não se contar nos dedos, em cada
canto, em cada pé de serra. Contudo, nem todo mundo que ostentava uma sanfona
no peito podia ser considerado sanfoneiro de verdade. Pra bebericar e rodar
salão valia com qualquer um, mas quando se falava em festa da padroeira, em
quermesse, em festa junina, então o sanfoneiro tinha de ser escolhido a dedo.
Ainda assim eram tantos nomes que até ficava
difícil escolher. Para se ter uma ideia, na região tinha passagem certa Agenor
da Barra, Zé Aleixo, Dudu e seu terno de linho branco, Zé Goiti e Didi, só pra
começar. Quando um cabra desses puxava o fole nem precisava que Zelito, o
cantador maior, acompanhasse, pois parecia que a própria sanfona já soava o
toque e trazia consigo a voz, a plangência de cada nota e o soar da melodia que
alegrava o sertão e suas noites de festança e forró.
No silêncio da distância de agora, felizmente
me chega a voz de Zelito. E tudo como se eu estivesse presenciando sua cantoria
em algum salão sertanejo, com o forró se derramando em suor. E ouço aquela incomparável
canção nordestina de Sebastião do Rojão na voz suada de Zelito: Olhe eu não
posso ver ninguém chorar, porque vem logo uma vontade em mim, quem foi que
disse que não chora por amor, pois os meus olhos já chegaram ao fim...
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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