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quinta-feira, 24 de julho de 2014

FORROZEIROS


Rangel Alves da Costa*


O forró é estilo musical, é dança, é ritmo, é melodia que se enraizou e se espalhou pelo Nordeste brasileiro como o próprio xiquexique e o mandacaru. Se na terra não pode faltar as cactáceas espinhentas suportando as agruras do sol, nos salões, salas de reboco e varandas não pode faltar o forrobodó para alegrar a peleja cotidiana do sertanejo. Basta ouvir o som da sanfona, do pandeiro, do triângulo e do zabumba que o espírito se contagia e o corpo inteiro fica querendo chinelar.
Tradição tão nordestina, simbolizando a verdadeira aptidão festeira do sertanejo, mas é de origem europeia, modificando-se que foi das danças de salão. Mas já em fins do século XVI, em Pernambuco, bailes populares eram acompanhados pelo ritmo da sanfona. Os ritmos se diversificaram e ganharam nomes próprios como o xaxado, o baião, o xote e o coco. Todos exigindo sensualidade e requebro dos dançadores. Mas foi o baião que alcançou maior sucesso, principalmente após a ascensão de Luiz Gonzaga no cenário musical brasileiro.
A partir de 1940, Luiz Gonzaga, depois denominado Rei do Baião, começou a popularizar o ritmo na junção voz e instrumentos. Com o baião também a sanfona alcançou status de reverência. E de repente o forró deixava de ser exclusividade das festanças nordestinas para ser apreciado e dançado em todas as regiões. A discriminação musical foi quebrada a partir do sucesso obtido por sanfoneiros nordestinos no eixo Rio-São Paulo.
Nomes como Zé Calixto, Gérson Filho, Luiz Gonzaga, Dominguinhos, Pedro Sertanejo, Sivuca, todos nordestinos, de repente já estavam migrando do sul para as terras de origem sua arte musical. Quer dizer, os ofícios aprendidos nos rincões nordestinos foram parar nos auditórios, nas rádios, nos programas musicais dos grandes centros. E retornava para o seu povo na forma de grandes sucessos para encantar os salões festeiros durante todo o ano. E assim porque o nordestino não se contenta apenas com a sanfona junina, querendo sempre mais a qualquer hora.
A partir dos grandes mestres da sanfona, do acordeon, da concertina, do fole, todos dando o mesmo nome para o instrumento do tocador, sanfoneiro ou forrozeiro, o forró foi resguardando seu lugar como tradição cultural. Muitos outros nomes, ainda que apenas cantores ou participantes de grupos, enriqueceram ainda mais a festança forrozeira. Marinês, Abdias, Anastácia, Sebastião do Rojão, Elino Julião, Clemilda, Zenilton, Genival Lacerda, Jacinto Silva, Jackson do Pandeiro, Mestre Zinho, Trio Nordestino e tantos outros, mesmo sendo mais reconhecidos como cantadores, igualmente devem ser vistos como forrozeiros.
Como se depreende, o forrozeiro é aquele que cantando ou tocando, ou fazendo as duas coisas, faz a poeira levantar com os casais chinelando no salão. Dominguinhos cantava e tocava, Luiz Gonzaga também. O mesmo ocorrendo com Abdias e Sebastião do Rojão, só para citar alguns exemplos. Já Clemilda, Genival Lacerda e Marinês são mais conhecidos pelas vozes que enriqueceram as melodias. Mas Gérson Filho foi representante máximo do autêntico forró pé-de-serra, aquele que nasce da pureza da sanfona e acompanhado apenas pelos instrumentos tradicionais. Este sim, este alagoano de Penedo foi forrozeiro na sua mais pura expressão.
Fiel às tradições nordestinas, Sergipe também tem lugar garantido na história do forró. Mesmo sendo alagoanos, Gérson Filho e Clemilda abraçaram Aracaju como chão de vivência e a partir daqui deram continuidade às suas trajetórias de sucesso. Mas outros nomes souberam se firmar com a maestria do dedilhar na sanfona e também na cantoria. Neste sentido, há de se reconhecer a importância de forrozeiros e sanfoneiros como Erivaldo de Carira, Cobra Verde, Domingos Vassoural, Luiz Paulo, Coelho dos Oito Baixos, Edgar do Acordeon, Zé Américo de Campo do Brito, Robertinho. E também de Mestrinho, Sávio e Renê, estes da safra mais nova.
Não posso esquecer os forrós de antigamente no meu sertão de Poço Redondo. Diferentemente de hoje, aquela região tinha sanfoneiro de não se contar nos dedos, em cada canto, em cada pé de serra. Contudo, nem todo mundo que ostentava uma sanfona no peito podia ser considerado sanfoneiro de verdade. Pra bebericar e rodar salão valia com qualquer um, mas quando se falava em festa da padroeira, em quermesse, em festa junina, então o sanfoneiro tinha de ser escolhido a dedo.
Ainda assim eram tantos nomes que até ficava difícil escolher. Para se ter uma ideia, na região tinha passagem certa Agenor da Barra, Zé Aleixo, Dudu e seu terno de linho branco, Zé Goiti e Didi, só pra começar. Quando um cabra desses puxava o fole nem precisava que Zelito, o cantador maior, acompanhasse, pois parecia que a própria sanfona já soava o toque e trazia consigo a voz, a plangência de cada nota e o soar da melodia que alegrava o sertão e suas noites de festança e forró.
No silêncio da distância de agora, felizmente me chega a voz de Zelito. E tudo como se eu estivesse presenciando sua cantoria em algum salão sertanejo, com o forró se derramando em suor. E ouço aquela incomparável canção nordestina de Sebastião do Rojão na voz suada de Zelito: Olhe eu não posso ver ninguém chorar, porque vem logo uma vontade em mim, quem foi que disse que não chora por amor, pois os meus olhos já chegaram ao fim...


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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