Rangel Alves da Costa*
O correto seria escrever eu o conheço, mas
não precisa que seja assim. Eis que conheço tanto ele que abdico dos
formalismos para ir direto ao assunto. Então urge que eu exponha todas as
impressões que tenho a respeito dele.
Ele é pessoa absolutamente comum. Por ser
assim, tão de carne e osso igual a todo mundo, vive balançando nas faces da
vida. É encontrado triste em alguns momentos e vendendo alegria em outros;
silencioso demais em alguns instantes e de palavra solta em outros.
De repente parece estar nas nuvens, mas no
instante seguinte já rente ao chão. Recolhe-se pensativo, cabisbaixo, e dali a
pouco já estará cruzando as ruas e avenidas. É sonhador sim, porém atento à
realidade. Sabe que é na realidade, no cotidiano da existência, que tudo pode
ser realizado.
Como observado, nada diferente de outras
pessoas. Talvez seja mais sincero que outros ou menos sincero que outros,
talvez nunca seja do jeito que tanto gostaria de ser. E nisso tudo a
normalidade, a cópia e o retrato tão visível na parede de tanta gente.
Ama. Ou já sentiu tanto amar. Talvez não ame
tanto como antigamente, mas tem o amor como essencialidade para a paz corporal,
mental e espiritual. Na realidade, muito difícil definir o amor que sente. E
por ele já sorriu, já caminhou, já caiu e levantou. E tudo faria novamente se
encontrasse um motivo que tanto alegrasse seu coração.
Também se angustia, chora, sorri, grita, quer
a paz e não foge da guerra. Os amigos são muitos e os inimigos também, mas
estes nunca revelados senão pelas falsidades e as inconveniências que vão
surgindo. Sabe muito bem em quem pode confiar, mas jamais lança desconfiança em
qualquer pessoa.
Nunca foi rico, nunca foi pobre, apenas tem
como sobreviver sem se submeter a humilhações nem estar pedindo favores a uns e
outros. Apenas se veste, apenas calça, apenas se serve do que tem à mesa.
Nenhum luxo, nenhum requinte, somente o essencial para sobreviver. Queria ter
mais, muito mais, porém prefere a riqueza da paz que possui aos perigosos
idílios da riqueza.
Sonha os mesmos sonhos dos outros sonhadores.
Talvez seja assim. Deita e encontra um mundo no telhado. E ali uma estrada, um
porto, um balão ou barco, qualquer coisa que o leve adiante, bem longe. E vai
imaginando coisas, passeando por paisagens maravilhosas, tendo e sendo tudo
aquilo que somente em pensamento é possível alcançar. E depois o sono vai
chegando. E adormece para viagens outras.
Mas também tem a noite como instante propício
para abrir os velhos baús, folhear os álbuns na memória, reencontrar com
pessoas, com o passado, com a sua vida em outros. E recorda, sente saudade,
entristece, lacrimeja, tudo faz para não ser assim, mas não tem jeito. As
lembranças chegam como ventanias que açoitam os varais da mente.
Não se sente vaidoso, egoísta, arrogante ou
falso. Mas sabe que tanto faz que imagine ser assim, pois todo mundo se reveste
de santidade perante os demais, mesmo reconhecendo não ser flor que se cheire.
Ao menos ele tem a consciência tranquila e sabe muito que os erros cometidos
não vão muito além daqueles necessários na batalha da vida.
Queria ser diferente. Queria ter aproveitado
muito mais da vida, do passado, do que a estrada lhe ofereceu. Mas tem
consciência que ninguém aproveita o instante como deveria fazê-lo e que somente
amanhã, ou algum tempo depois, haverá a vontade de retornar para fazer mais,
menos ou diferente.
Queria ter mais amigos e verdadeiros amigos.
Mas não se reconhece o grão com o milho ainda na palha, sabe bem disso. Queria
novamente tomar banho na chuva, roubar fruta no pomar, chutar a bola além do
muro da vizinhança. E tanto mais queria.
Mas quem é ele, quem é essa pessoa sobre a
qual escrevi por que conheço? Juro que não sei. Talvez eu, talvez você ou
qualquer um. Digo que conheço porque as pessoas normais e comuns geralmente são
assim.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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