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quinta-feira, 26 de setembro de 2013

NAS CURVAS DA LINHA RETA


Rangel Alves da Costa*


Com acerto e sabedoria, alguém já disse que por mais que a vida possa ser avistada do começo ao fim, pois um só percurso do nascer ao morrer, a maioria das pessoas insiste em fazer curvas na linha reta. Rompem as barreiras da estrada, transgridem suas fronteiras, ultrapassam as laterais e adentram nas veredas do imprevisível.
Mas nem tanto imprevisível, considerando-se principalmente que muitos conhecem muito bem as consequências nefastas advindas da simples opção de enveredar pelos atalhos mais perigosos. É como se dissesse que não vá por ali e a pessoa seguir adiante; não tente colher daquele fruto podre e o sujeito avançar com afoiteza; implorar para que não entre por determinada senda e o indivíduo se fazer de surdo.
Em situações tais, logicamente que a pessoa será, ela própria, unicamente culpada pelo pior que lhe possa acontecer. Quantas e tantas vezes os pais, com vozes sempre repetidas de pedidos e rogos, imploram para que os seus não façam isso ou aquilo, não andem rondando o perigo nem cometam o erro de ir se arriscar perante o desconhecido. E nem sempre são ouvidos, e quase sempre sofrem injustamente as consequências das ações danosas dos seus.
Depois começam a ecoar as lamentações em torno do caminho espinhento escolhido pelo sujeito. É de boa família, teve uma infância sob os maiores cuidados, nunca lhe faltou nada, tudo tinha para grandes conquistas na vida, mas de repente passou a agir de modo totalmente contrário ao imaginado. E diferente porque deixou de seguir o percurso normal, a estrada que lhe caberia percorrer rumo às melhores e possíveis realizações.
Certamente que a linha reta citada é aquela da vivência comum, na normalidade da vida. Sem antecipar-se aos fatos e sem antever os espinhos que estarão na estrada, pressupõe-se que o ser humano nasce e caminha segundo o delineado como destino até o dia do adeus terreno. E em tal percurso a infância, a adolescência, a idade adulta e a velhice.
Do mesmo modo, certamente que as linhas na curva reta dizem respeito aos atalhos e fugas que a pessoa, por conta própria e risco, se permite adentrar. Quer dizer, tem tudo para viver seu percurso sem trazer para si mesmo surpresas e circunstâncias desagradáveis, porém procura modificar o traçado e incorrer em afoitezas e perigos.
Com efeito, por mais que muitos afirmem que sempre procuram viver zelando pela pureza de seu espírito e alma, cuidando de si mesmos, agindo honestamente, fugindo das armadilhas mundanas e evitando tudo aquilo que seja pernicioso, traga desgostos e contratempos, a verdade é geralmente outra. Eis que agem, e premeditadamente, para transformar a retidão da linha da vida em curvas e precipícios intermináveis.
Na maioria das situações, tem-se como normalidade da vida a convivência pacífica, a semeadura para colher os melhores frutos da sobrevivência, a busca de realizações e conquistas, o esforço para o reconhecimento social através do trabalho. E isto se dá através da honradez, da coragem produtiva, do estudo, da responsabilidade, do elevado esforço para sobreviver com dignidade e paz.
Tais aspectos, que se reconheça, não devem ser vistos como características de apenas alguns, pois todos, indistintamente, nascem com poder de realização e de seguir dignamente pela normalidade da vida, percorrendo aquela linha reta inicialmente citada. Portanto, tanto o pobre como o mais financeiramente aquinhoado, todos possuem as características únicas da existência para usufruir, dentro de suas capacidades, o melhor que a vida possa oferecer.
Contudo, jamais poderá ser admitido como normal que a pessoa pretenda desconstruir a normalidade da estrada e onde haja chão firme e flores do campo e passe a semear ervas daninhas, espalhar pedras pontiagudas e espinhos perfurantes. E também que vá além da margem da estrada em busca de labirintos, precipícios, abismos e outras fendas destruidoras.
Há de se reconhecer, contudo, o quanto difícil é seguir sempre pela linha reta da vida sem que o seu curso seja desafiado. De repente, os próprios labirintos se tornam até mais atraentes que o horizonte seguro. Espelham chamativas ilusões, fantasias, experiências de toda sorte. E muitos, principalmente os mais jovens e inexperientes, cessam a caminhada segura para experimentar as utopias fáceis espelhadas no labirinto. Dificilmente pensam no que pode estar no outro lado, nas sombras da destruição.
Talvez ajam assim porque a caminhada pela linha reta da vida lhes parece previsível demais. E se dizem que estudar, trabalhar, lutar para sobreviver, suar para conquistar, tudo não passa de chatice cotidiana. Havendo novas coisas a fazer, outras situações a experimentar, então nada melhor que arriscar. Pensam assim e logo tomam outro rumo. Ao invés de prosseguir cimentando o futuro, preferem as facilidades do desconhecido. Mas dificilmente conseguem retornar e retomar sua estrada.
Daí que a linha reta da vida, ainda que seja percurso previsível demais para muitos e sem as experiências fulgurantes que as veredas ilusoriamente ofereçam, sempre foi o caminho mais seguro para as grandes realizações. É cansativa, desafiadora, mas um oásis para aqueles que a segue com retidão.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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