Rangel Alves da
Costa*
Aura
ensolarada e tez envernizada pelo calor do dia; olhar meigo e distante e
sorriso sempre acenando; uma sertaneja, uma mulher vestida de sol. Os romances,
as novelas, a poesia e até as conversas de boca a boca sempre reconheceram a
beleza simples e singela da mulher sertaneja.
E uma
passagem bíblica, logicamente expressa noutro contexto, servirá muito bem para
sintetizar tal reconhecimento. Diz o Livro do Apocalipse, 12,1 que: Apareceu em seguida um grande sinal no céu:
uma mulher vestida do sol, tendo a lua debaixo dos seus pés e uma coroa de doze
estrelas sobre sua cabeça.
Ora, a
mulher vestida de sol não era outra senão Maria, mãe de Jesus. E Maria, mais
que qualquer outro, é nome que simboliza a mulher sertaneja. E estar revestida
de sol, tomada pelos seus raios, também não deixa de remeter ao sol sertanejo
pairando sobre suas belas filhas.
E mais. No
contexto sertanejo, ter a lua debaixo dos pés pode muito bem significar a
procura por momentos de paz e felicidade e também os instantes propícios para a
caminhada em busca de dias melhores. Tendo o sol sobre sua cabeça, símbolo de
luz mas também de padecimento, tem a lua sobre seus pés simbolizando a paz tão
almejada.
E o que
seria a coroa de doze estrelas sobre a cabeça da mulher sertaneja? Na Bíblia,
as doze estrelas representam os doze apóstolos, aqueles escolhidos para semear
as palavras de Deus. Perante a realidade sertaneja, cujo aprendizado é fruto da
vivência no seu chão, a coroa de doze estrelas seria o diadema refletindo as
singularidades dessa mulher também singular.
Tais
singularidades podem ser encontradas em algumas características sempre
existentes na verdadeira mulher sertaneja. Desse modo, as doze estrelas seriam:
simplicidade, humildade, perseverança, amizade, destemor, honestidade,
singeleza, religiosidade, beleza, meiguice, cordialidade e força.
Eis,
assim, a mulher sertaneja vestida do sol de seu mundo, caminhando em busca de reconhecimento
e conquistas, sempre ornada com as características básicas que lhes dão
singularidade e encanto. E não haverá alguém que tenha bons olhos para ver,
sincero coração para sentir e razão para discernir, que não veja em cada uma a
mais pura expressão da singela e encantadora feminilidade.
E não importa
se mora numa tapera de barro e cipó, nos escondidos da mataria distante, nas
margens empobrecidas dos centros urbanos ou nas cidades. Não importa se usa
chinelo de dedo ou sapato enfeitado, se usa vestido de chita e flor no cabelo
ou roupa comprada em butique. Não importa se pobre ou rica, bastando que se
revista daquele sol sertanejo para ser reconhecida na sua beleza.
Contudo,
mesmo o sol sertanejo, reconhecido pela sua força e fulgor, deixa de brilhar
sobre aquelas cabeças que, falseando sua vivência e seu meio, insistem em
transgredir as características e conceitos próprios da mulher sertaneja.
Tomadas pelos modismos, tantas vezes omitindo o seu próprio chão, acabam se
desvirtuando nas tentativas de ser aquilo que, por destino e escolha divina,
não lhes foi permitido.
Mas as
ovelhas desgarradas logo deixam de ser reconhecidas pelo rebanho. E naquelas
que continuam abraçando sua terra com orgulho e prazer, que permanecem com
hábitos e costumes próprios de seu mundo ou que se tornam modernas sem ser
diferentes, nestas sempre será avistada toda a beleza cabocla.
Pois,
repetindo sempre, beleza sem igual é a desta mulher. Desde aquela mocinha que
ao entardecer fica sonhando na sua janela, aquela outra que se respinga de
lavanda para atrair olhares sempre apaixonados, ou ainda aquela outra que
simplesmente passa e os olhares se enchem de graça e a paisagem agrestina
agradece por existir assim tão majestosa. E também a já envelhecida, calejada
pelas labutas tantas. Uma flor, ou flores sertanejas. Simplesmente isso.
A bela
flor do cacto e do inexistente jardim sertanejo. Inexistente pela aspereza da
terra e pela sequidão do tempo, mas quando existir ali garantida já estará sua
flor: bela flor que é essa mulher vestida de sol.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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