Rangel Alves da
Costa*
Lendo e
relendo, encontrei no poeta alemão Friedrich Schiller (1759-1805) um pensamento
que me tomou grande parte da noite. Nas palavras vi o homem e vi a escada, avistei
o homem nela subindo, e o enxerguei a construindo. Mas também vi um homem
submetendo outro homem para fazê-lo de aviltante degrau e, sem remorsos nem
piedade, querer subir cada vez mais alto.
Eis a
frase exemplar de Schiller: “Nada existe tão alto que o homem, com força de
vontade, não possa apoiar a sua escada”. Por outras palavras, nada é impossível
ao homem que corajosa e persistentemente vai construindo sua conquista. Mas
também, nada mais vergonhoso no indivíduo que deseja alcançar as alturas sem
ter uma escada para subir, fazendo do esforço do outro cada lanço de sua
ambição e ganância.
Tantas
vezes o homem anseia por uma escada para escalar seus desejos e objetivos na
vida. Precisa subir e ir cada vez mais alto porque são muitos seus sonhos, seus
planos, suas diretrizes a serem alcançadas. E é próprio de cada um desejar sair
do chão do nada conseguido. Contudo, recolhe-se ao sentimento de impotência
logo no primeiro instante que sente não dispor de qualquer degrau para iniciar
a subida.
Justos são
os desejos daqueles que se esforçam para encontrar uma escada. Quando sentem
dificuldades para encontrá-la, eis que não descansam enquanto não constroem sua
estrada para o alto. Assim a grande diferença daqueles que vão juntando pedaços
e pregos para ter onde colocar o seu passo, e aqueles que querem encontrar uma
escada de qualquer jeito, da forma mais fácil possível ou fazendo de degrau
cada um que encontre pela frente.
Será que
tudo tem de ser alcançado tão apressadamente que não possa se esforçar e, no
passo do sacrifício e da persistência, ir construindo lentamente, passo a
passo, madeira a madeira, seus próprios degraus? Será que só tem serventia a
escada já pronta, já colocada debaixo de onde deseja iniciar a subida, ou mesmo
que alguém tenha de ir colocando seu pé em cada degrau da escalada?
É preciso
saber que nada é tão fácil quanto o desejado, que as escadas existentes já
possuem os seus donos e aquele que está lá no alto sabe que nada será alcançado
num simples voo ou de forma demasiadamente fácil. E não apenas isto, pois, além
da escada, o indivíduo terá de também avistar um prêmio lá em cima que mereça
ser conquistado. E só acontecerá assim se ele realmente for merecedor de chegar
até o almejado topo.
Ora,
haveriam de dizer que uma escada é fácil demais de ser conseguida, que basta tomar
emprestada aquela de alguém do lado e rapidamente conseguir o que deseja. Ledíssimo
engano pensar assim. Como dito, cada escada tem o seu dono, cada um também
deseja subir para encontrar o melhor. E quanto mais sente que merece iniciar a
subida mais encorajamento terá para iniciar a escalada.
Infelizmente,
como tantas vezes acontece, a pessoa até pode encontrar meios de alçar para o
alto até mesmo por cima da cabeça de outras pessoas, submetendo-as
forçadamente, mas sempre a custa de um poder qualquer que sempre veja no
próximo uma forma vil de se alcançar o topo. Entretanto, o simples fato de
alguém sempre querer subir pela força e sacrifício dos outros, inevitavelmente
terá as consequências mais indesejáveis.
Aquele que
está servindo de escada certamente cansará de ser usado, de ser mero degrau para
que o outro alcance o que deseja por meio de seu sacrifício. E logo sentirá
insuportável demais o peso nas costas por continuamente se submetido, abusado,
subjugado e escravizado. Sente que não é justo se expor a tanto esforço e
sacrifício naquilo que não lhe traz qualquer proveito. Então a pedra se
humaniza, a corda arrebenta, a escada tende a cair. E o que é sempre mais
provável: a queda daquele que se manteve lá em cima sem ao menos olhar pra
baixo.
As revoltas
e transformações começam a acontecer assim.
Chega um dia que a insuportabilidade do peso nas costas é tamanho que
apenas um gemido de dor não alivia o corpo já dilacerado. O silêncio passivo é
transmudado em palavra de insatisfação, esta logo se transforma em grito. E
quando o grito ecoar certamente que o do alto estará por um fio para se
esparramar pelo chão. Ora, tanto subiu e tanto encontrou que nem se lembrou
daquele que sofrivelmente lhe dava sustentação.
Até parece
com outras realidades tão conhecidas. Mas pode-se perceber que a escada não é
apenas uma metáfora que envolve o poder como busca de facilidade a todo custo,
a submissão humana como meio de conquista, o abuso como silenciosa imposição e
a ingratidão como forma desumana e injusta de reconhecimento. A escada é, acima
de tudo, o instrumento tanto de conquista como de derrocada. Tudo depende da
forma como é usada.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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