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quarta-feira, 11 de setembro de 2013

O HOMEM E SUA ESCADA


Rangel Alves da Costa*


Lendo e relendo, encontrei no poeta alemão Friedrich Schiller (1759-1805) um pensamento que me tomou grande parte da noite. Nas palavras vi o homem e vi a escada, avistei o homem nela subindo, e o enxerguei a construindo. Mas também vi um homem submetendo outro homem para fazê-lo de aviltante degrau e, sem remorsos nem piedade, querer subir cada vez mais alto.
Eis a frase exemplar de Schiller: “Nada existe tão alto que o homem, com força de vontade, não possa apoiar a sua escada”. Por outras palavras, nada é impossível ao homem que corajosa e persistentemente vai construindo sua conquista. Mas também, nada mais vergonhoso no indivíduo que deseja alcançar as alturas sem ter uma escada para subir, fazendo do esforço do outro cada lanço de sua ambição e ganância.
Tantas vezes o homem anseia por uma escada para escalar seus desejos e objetivos na vida. Precisa subir e ir cada vez mais alto porque são muitos seus sonhos, seus planos, suas diretrizes a serem alcançadas. E é próprio de cada um desejar sair do chão do nada conseguido. Contudo, recolhe-se ao sentimento de impotência logo no primeiro instante que sente não dispor de qualquer degrau para iniciar a subida.
Justos são os desejos daqueles que se esforçam para encontrar uma escada. Quando sentem dificuldades para encontrá-la, eis que não descansam enquanto não constroem sua estrada para o alto. Assim a grande diferença daqueles que vão juntando pedaços e pregos para ter onde colocar o seu passo, e aqueles que querem encontrar uma escada de qualquer jeito, da forma mais fácil possível ou fazendo de degrau cada um que encontre pela frente.
Será que tudo tem de ser alcançado tão apressadamente que não possa se esforçar e, no passo do sacrifício e da persistência, ir construindo lentamente, passo a passo, madeira a madeira, seus próprios degraus? Será que só tem serventia a escada já pronta, já colocada debaixo de onde deseja iniciar a subida, ou mesmo que alguém tenha de ir colocando seu pé em cada degrau da escalada?
É preciso saber que nada é tão fácil quanto o desejado, que as escadas existentes já possuem os seus donos e aquele que está lá no alto sabe que nada será alcançado num simples voo ou de forma demasiadamente fácil. E não apenas isto, pois, além da escada, o indivíduo terá de também avistar um prêmio lá em cima que mereça ser conquistado. E só acontecerá assim se ele realmente for merecedor de chegar até o almejado topo.
Ora, haveriam de dizer que uma escada é fácil demais de ser conseguida, que basta tomar emprestada aquela de alguém do lado e rapidamente conseguir o que deseja. Ledíssimo engano pensar assim. Como dito, cada escada tem o seu dono, cada um também deseja subir para encontrar o melhor. E quanto mais sente que merece iniciar a subida mais encorajamento terá para iniciar a escalada.
Infelizmente, como tantas vezes acontece, a pessoa até pode encontrar meios de alçar para o alto até mesmo por cima da cabeça de outras pessoas, submetendo-as forçadamente, mas sempre a custa de um poder qualquer que sempre veja no próximo uma forma vil de se alcançar o topo. Entretanto, o simples fato de alguém sempre querer subir pela força e sacrifício dos outros, inevitavelmente terá as consequências mais indesejáveis.
Aquele que está servindo de escada certamente cansará de ser usado, de ser mero degrau para que o outro alcance o que deseja por meio de seu sacrifício. E logo sentirá insuportável demais o peso nas costas por continuamente se submetido, abusado, subjugado e escravizado. Sente que não é justo se expor a tanto esforço e sacrifício naquilo que não lhe traz qualquer proveito. Então a pedra se humaniza, a corda arrebenta, a escada tende a cair. E o que é sempre mais provável: a queda daquele que se manteve lá em cima sem ao menos olhar pra baixo.
As revoltas e transformações começam a acontecer assim.  Chega um dia que a insuportabilidade do peso nas costas é tamanho que apenas um gemido de dor não alivia o corpo já dilacerado. O silêncio passivo é transmudado em palavra de insatisfação, esta logo se transforma em grito. E quando o grito ecoar certamente que o do alto estará por um fio para se esparramar pelo chão. Ora, tanto subiu e tanto encontrou que nem se lembrou daquele que sofrivelmente lhe dava sustentação.
Até parece com outras realidades tão conhecidas. Mas pode-se perceber que a escada não é apenas uma metáfora que envolve o poder como busca de facilidade a todo custo, a submissão humana como meio de conquista, o abuso como silenciosa imposição e a ingratidão como forma desumana e injusta de reconhecimento. A escada é, acima de tudo, o instrumento tanto de conquista como de derrocada. Tudo depende da forma como é usada.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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