Rangel Alves da Costa*
No jogo de xadrez, o xeque-mate é dado quando
o Rei, atacado por uma ou mais peças adversárias, não pode permanecer na casa
em que está, não consegue movimentar-se para outra ou ser defendido por outra
peça. Quer dizer, quando não há mais saída o Rei é considerado morto. Assim
também o xeque-mate no jogo urbano, no tabuleiro da cidade, quando as peças se
enroscam de tal forma que tudo parece não ter mais saída.
Ao projetar a nova capital sergipana, lá
pelos idos de 1855, traçando o denominado “Quadrado de Pirro” (quadras geometricamente
projetadas que iam da atual praça General Valadão até a avenida Barão de Maruim,
e a área que vai da avenida Rio Branco até a rua Dom Bosco), o engenheiro Sebastião
José Basílio Pirro certamente que estava mais preocupado em vencer as péssimas
condições geográficas de então. Jamais imaginaria que o seu tabuleiro de xadrez
mais tarde fosse tomado por peças tão desconcertantes.
Com
efeito, o projeto de Pirro primeiro teve de vencer as dificuldades da escolha
improvável de então. Uma localidade cheia de irregularidades topográficas,
tomada por dunas, morros e mangues, de repente teve de ser em grande parte
aterrada e planificada para dar lugar aos quarteirões de ruas que iam
desembocar no Rio Sergipe. E tudo na pressa exigida para colocar no devido
funcionamento a nova capital. Daí algumas indevidas intervenções no espaço
geográfico que até hoje apresentam problemas.
Contudo,
as imperfeições apresentadas hoje pelo tabuleiro de Pirro são minimamente
geográficas e maximamente administrativas. Ainda que aqui e acolá a cidade seja
alagada pelas imprevidências do antigo planejamento, ainda assim a culpa será
de quem pode dispor da moderna engenharia para resolver ou minimizar os
problemas surgidos. Mas parece praga: basta chover com maior volume e os mesmos
lugares transbordam iguais a rios urbanos. E não só canais como bueiros de
esquinas. Então o trânsito praticamente para em determinadas regiões da cidade.
Pirro
pensou numa cidade de fácil locomoção, com ruas simetricamente dispostas,
percursos geralmente retos, onde pessoas e meios de transportes de repente não
se confrontassem num caos. E certamente ficaria atordoado se pudesse avistar o
estágio atual de seu sublime e acolhedor tabuleiro. Não somente as peças do
xadrez ganharam características totalmente diferentes como a sua bandeja
quadrangular se expandiu de modo disforme e imprevisível. E desde muito se fala
em Plano Diretor sem que tal norteamento urbanístico - com as novas exigências
que a expansão da cidade tanto requer - se torne realidade.
São poucas
as vias construídas para o futuro, para o crescimento da cidade e do número de
veículos. Do mesmo modo, são raras as intervenções no trânsito que produzem
resultados satisfatórios, que permitam maior fluidez e mobilidade. Pelo
contrário, em muitos casos direcionam tanto o fluxo de veículos em determinadas
vias que a solução acaba se tornando problema.
Vergonhoso
exemplo acontece no trecho da Avenida Carlos Burlamaqui em direção à Praça
Godofredo Diniz (ou praça da jogatina). Somente aí é mão dupla, com táxis
lotação em alta velocidade cruzando em via apertada com veículos de passeio,
colocando em constante risco a vida de pedestres e de moradores. E um
verdadeiro caos na esquina da Rua Lagarto, com carros que chegam de três
direções diferentes. Contudo, ao invés de tentar resolver o problema, os órgãos
de trânsito se preocupam apenas em encaminhar guardas com seus formulários de
multas.
Grande
parte do centro da cidade se transformou em feiras livres a céu aberto,
desorganizadas e imundas, num misto de informalidade e ilicitudes. Da Avenida
Airton Teles até a Rua Geru, passando pelos arredores da Praça João XXIII e
seguindo em direção aos mercados, a situação é verdadeiramente dramática para
uma jovem cidade que se arvora de possuir tantas belezas e insiste em se
apresentar com a ilusória roupagem de capital da qualidade de vida. A
imundície, a desorganização e a criminalidade que povoam a Rodoviária Velha são
exemplos maiores de uma cidade que se enfeia cada vez mais.
Não, Pirro não queria assim, mas o tabuleiro
de xadrez aracajuano está tão avolumado que as peças parecem sufocadas,
estagnadas, sem ter mais para onde ir. E é xeque-mate na cidade com sua imobilidade
urbana, seu comércio clandestino tomando conta do centro, suas lixeiras a céu
aberto, ruas estreitas com calçadas esburacadas, falta de engenharia de tráfego
e seu descabido privilégio aos táxis lotação em detrimento de outros veículos e
pedestres.
Mas xeque-mate principalmente nas
administrações estadual e municipal que parecem totalmente omissas diante de
situações que chegam a ser vergonhosas. Afinal de contas, será que vão deixar
que o prédio do antigo Hotel Palace a qualquer instante caia por cima daqueles
ambulantes, lojistas e transeuntes, ou vão tomar alguma providência?
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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