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segunda-feira, 15 de setembro de 2014

A CONSTRUÇÃO E A DESCONTRUÇÃO DA LITERATURA BRASILEIRA


Rangel Alves da Costa*


No Brasil, foi o jornal que praticamente cimentou a fama dos grandes escritores, hoje vistos como clássicos. Numa época em que não haviam editoras especializadas em literatura, apenas os periódicos publicavam em capítulos o que atualmente se tem como marcos da literatura brasileira. Assim ocorreu com escritores renomados como José de Alencar, Machado de Assis, Raul Pompéia, Lima Barreto e tantos outros.
Todos estes, tendo como os exemplos vindos da literatura francesa desde os Dumas, tanto o pai como o filho, publicavam seus romances em folhetins, nas páginas dos jornais que circulavam nos principais centos urbanos. Mas o interesse do público era tamanho pelo desfecho dos episódios que mais tarde, ao final, inevitavelmente que tais enredos e tramas eram transformados em livros, como o publicado ou com ligeiras modificações.
Como observado, eram escassos os meios e as publicações eram bastante reduzidas. Por consequência, os autores saídos das páginas dos jornais alcançavam fama rapidamente, vez que com escritos já conhecidos e acessíveis aos leitores dos periódicos. E a situação não mudou quando começaram a surgir editoras especializadas em literatura nacional. Publicava-se mais pela fama do autor que pelo conteúdo da obra, abrindo pouco espaço para novos autores. E tal situação teve continuidade e possui a mesma feição nos dias atuais.
Certamente que naqueles idos muitos escritos de qualidade sequer ganharam espaços nos jornais. As gavetas antigas como as de hoje amargam a certeza que somente as traças serão assíduas leitoras e devoradoras. E assim acontece porque mais de noventa por cento dos escritos têm de amargar a triste sina do esquecimento das gavetas. Somente uma pequena parcela das criações literárias ganha sobrevida através das editoras ou publicações próprias. E é neste aspecto que emergem algumas considerações importantes.
Como dito, nem sempre o que é publicado possui melhor qualidade do que foi rejeitado pelas editoras, não obteve recursos suficientes para publicação ou simplesmente ficou esquecido nas gavetas. Autores existem que precisariam apenas de uma oportunidade e seus nomes logo seriam reconhecidos. Outros, mesmo cientes que produzem escritos de qualidade, acabam desistindo diante da falta de apoio cultural, de incentivos para publicação e dos infindáveis meandros burocráticos. Já outros fazem pequenas tiragens por conta própria na esperança que seu achado caia nas graças de algum editor. Mas dificilmente consegue pela peneira que é imposta e pelas políticas de privilégios nestas existentes.
Por mais que seja difícil aceitar, a verdade é que as editoras praticamente criam autores e sucessos literários. Para elas, tanto faz que um autor nordestino ou nortista seja verdadeiramente romancista, contista, poeta, cronista ou ensaísta, que seja de grande criatividade literária e produza um trabalho de qualidade, se não querem tê-lo no seu catálogo nem em qualquer lista dos mais vendidos. Mas diferentemente ocorre quando desejam fabricar celebridades literárias. Por mais que os escritos sejam medíocres, ainda assim o trabalho de marketing será tão intenso que a crítica passará a reconhecer alguma qualidade na obra. E não raro que a crítica receba “presentinhos” para falar bem do que não presta.
Não há dúvidas que seria impossível dar oportunidade indistinta a todo aquele que já está com livro pronto e esperando somente uma chance de publicação. As editoras ficariam abarrotadas de autores novos e de difícil escolha para os leitores. Estes, aliás, na maioria das vezes sequer folheiam o livro antes de adquiri-lo, pois se contentam com o nome do autor e se dá por satisfeito. Mas, como dito, tais autores são apenas aqueles escolhidos e lançados à fama pelas editoras.
Por consequência, se a qualidade da produção literária do Brasil não é das melhores, a culpa deve recair exclusivamente nas editoras, pois são estas que não dão oportunidade aos autores novos, privilegiam alguns nomes socialmente famosos e procuram a todo custo proporcionar reconhecimento ao que realmente não tem. Objetivando grande vendagem pelo nome influente do autor, acabam maculando a imagem e a qualidade da verdadeira literatura nacional.
Para se ter uma ideia desse processo destrutivo e excludente comandado atualmente pelas editoras, basta observar que a literatura brasileira parece ter chegado somente até a literatura contemporânea do século passado. Os livros escolares sobre literatura brasileira não citam autores atuais com igual consistência daqueles de escolas mais antigas. E isso é motivado pela falta de autores realmente bons estampando os livros publicados.
Para um livro ser bom e assim ser reconhecido não adianta que a editora gaste milhões para forjar de ouro o nome do autor. A boa literatura é reconhecida pelo leitor. Mas quando a fama é imposta, jogada na estante porque assim deseja a editora, então o que se terá é uma literatura nacional desacreditada e da pior qualidade. Ao menos pelo que é publicado.
Exemplo maior disso tudo é o tal do Paulo Coelho. Somente as editoras e os fracos de espírito para dizer que ali está ao menos qualquer resquício de qualidade literária. A fama do autor existe e se espalhou exatamente porque foi forjado como escritor. O que verdadeiramente não é.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com 

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