Rangel Alves da Costa*
Moro em Aracaju desde 1974 e na Avenida
Carlos Bulamarqui já em torno dos trinta anos e nunca presenciei um mês junino
tão triste e desanimado como o que se apresenta agora. Ao menos no trecho onde
moro e mais adiante, não se avista nada que faça lembrar que estamos no mês dos
três santos famosos: Santo Antônio (13), São João (24) e São Pedro (29).
O que mais espanta e entristece é o fato de o
mês de junho nunca ter sido relegado dessa forma. Mesmo estando na região
central da capital sergipana, a Carlos Bulamarqui sempre foi famosa pelo seu São
João. Ainda em maio e um grupo de moradores saía arrecadando contribuições para
a compra dos enfeites e pagamento da estrutura dos festejos. Já no ano passado,
contudo, observou-se um desinteresse que redundou numa comemoração desanimada e
com pouca gente. Nem mesmo os moradores estavam ao redor de fogueiras.
Ainda assim, mesmo sem o ânimo desejado, bandeirolas
coloridas eram avistadas balançando ao vento, balões estavam estendidos em
alguns pontos do trecho, as pessoas se sentiam diante do clima junino. O fole
roncou, houve apresentação de quadrilha junina, algumas brincadeiras, mas muito
diferente de outros tempos. O quadro apresentado já era o mais desalentador
possível ante a grandiosidade costumeira da festança.
Como dito, muito diferente de outros tempos.
Recordo a avenida apinhada de gente, de moradores, convidados e visitantes.
Enfeites multicoloridos dando uma graça especial e provocando sensações
alegres, festivas. Diversos sanfoneiros, geralmente duas quadrilhas, forró
pé-de-serra e chinelos ralando pelo asfalto. Uma fogueira adiante de cada casa,
mesas nas calçadas e sortidas das gostosuras juninas, fogos subindo pelos ares,
numa festança que não tinha hora para acabar.
O São João da Carlos Bulamarqui era um
verdadeiro reencontro de amigos, familiares e de gulosos e apreciadores do
licor, do quentão, da cachaça e da cerveja. Milho assado e cozido, pamonha,
arroz doce, canjica, pé-de-moleque, queijo assado, amendoim, carne assada, de
tudo que fosse ao coco, cravo, canela e milho. E chegavam as meninas bonitas
com seus chapéus, botas até os joelhos, calça jeans ou saia rodada, e os
rapazes com suas roupas quadriculadas e seus olhares admirados de tanta beleza.
E ninguém jamais imaginaria que tal tradição
um dia fosse acabar. E acabou de forma quase abrupta, sem ter nenhuma
explicação para tal. Que os forrós, as quadrilhas e as brincadeiras chegassem
ao fim por falta de pessoas interessadas em organizar e também pelas
dificuldades financeiras reclamadas por todos, mas não estender uma bandeirinha
sequer, aí já é demais. Nada mais triste que o anoitecer junino sem o som dos
enfeites sendo sacudidos pelo vento. Mas é esta a realidade de agora.
Ao chegar o mês de maio logo estranhei que
ninguém me procurou para contribuir com o evento. Também estranhei não ter
avistado cordames sendo estendidos para a arrumação das bandeirolas. Sobre a
comemoração, o silêncio era total, ninguém se manifestava sobre nada. E quando
junho chegou e manhã após manhã nenhum enfeite era avistado, então não mais
duvidei que o nosso São João houvesse acabado. E de vez. E da forma mais triste
possível, pois sem ao menos uma bandeirinha por todo o trecho.
Não sei como serão as noites da véspera e da
data festiva. Vai ser difícil sair para a calçada e nada avistar daquilo que
tanto me acostumei a ver, a sentir, a brincar. Talvez algumas fogueiras
solitárias e o silêncio melancólico por todo lugar. Tenho certeza que as
calçadas estarão vazias e nenhum cheiro bom de canjica será sentido. Um menino
ou outro estará soltando uma chuvinha, um traque, uma bombinha. E só.
Nada mais do São João e das noites juninas e
festeiras da Carlos Bulamarqui. Será somente o silêncio entrecortado por alguns
pipocos. E as bandeirinhas invisíveis balançando como lenços em triste adeus.
Ou apenas o esvoaçar de saudade.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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