Rangel Alves da Costa*
Logo após o falecimento do ator Antônio Abujamra,
fato acontecido em 28 de abril, li na Folha de São Paulo um texto do colunista
Nélson de Sá (Excessos de Abujamra não esconderam diretor singular –
29/04/2015), que me deixou intrigado pela desnecessidade na utilização das
expressões “derrisória” e “derrisório”.
Afirma o colunista que o teatro de Abujamra
carregava uma abordagem “derrisória. E mais adiante diz que mais tarde o
diretor se descobriu, mas era um Abujamra “derrisório”. Não é fácil encontrar
nos livros o conceito de derrisório. E não vejo necessidade alguma de um
colunista de um jornal popular cunhar tal termo no texto de leitura geral.
O termo derrisório se amolda muito bem à
intencionalidade do jornalista, pois significa exatamente na associação entre
humor e agressão. Derrisão significa ridicularização, escárnio, expressão do
ridículo. Mas se a intenção era dizer que Abujamra utilizava o humor agressivo
para ridicularizar, bem poderia ter utilizado outra expressão, pois a utilizada
foi inadequada ao meio.
Tal ânsia de expressar-se de forma
demasiadamente culta ou com exageros acadêmicos e rebuscamentos linguísticos,
ao invés de enriquecer o texto pode provocar efeito contrário e torná-lo
pedante, incompreensível, desprezado pelo leitor, ainda que de cultura igual ao
escritor. Ninguém suporta um texto enfadonho ou construído de forma ininteligível.
Desde muito que venho escrevendo alguns
textos criticando o “inteligentês” na literatura e na escrita em geral, o forjamento
das expressões com base em formalismos acadêmicos e o esquecimento de que o
leitor é um ser que apenas deseja compreender o que está escrito. E também
criticando o desprezo de muitos pela linguagem coloquial, pelos regionalismos e
o linguajar comum do povo. Sempre preguei a palavra escrita ou falada de
qualquer forma, mesmo tomada de erros gramaticas, mas que alcança sua função
comunicativa. O que importa é o entendimento do outro, do interlocutor ou do
leitor, e não a forma como foi expressa.
Estudiosos e filólogos como Celso Pedro Luft
já pregavam a insubmissão da palavra, sintetizada no termo língua é liberdade. A
verdade é que não há erro em qualquer fala ou escrita, mas tão somente uma
inadequação às normas impositivas da gramática normativa. E como ninguém está
obrigado a ser mais obediente às regras linguísticas do que à sua força de
expressão, então não deverá calar somente porque a linguagem formal exige de
outro modo.
A crítica se volta também aos livros cujos
termos parecem propositalmente escolhidos pelo autor para não serem entendidos.
Ou simplesmente porque desejam passar uma imagem de rebuscado e superior
conhecimento. Carl Sagan e Stephen Hawking, por exemplo, poderiam ter escrito
livros sobre o cosmos e a formação do universo com expressões somente
compreensíveis aos cosmólogos, astrofísicos ou outros cientistas, mas não, pois
conseguiram tornar seus escritos compreensíveis e de fácil leitura. Outros,
contudo, se tornam intragáveis até mesmo nas academias.
Minha alma foi lavada a partir da leitura de
uma entrevista publicada pela Folha de São Paulo neste sábado, 30 de maio, com
o linguista norte-americano Steven Pinker atacando o estilo pomposo de escrever
dos acadêmicos. Falando sobre o seu best-seller “O Senso de Estilo”, o autor
sintetiza sua visão sobre a linguagem padronizada, as regras de escrever bem e
o conservadorismo na escrita.
Segundo Pinker, a escrita, ao invés de
tencionar o rebuscamento, deve ser simples, clara, concisa. E diz que o grande
problema na escrita de hoje é “a maldição do conhecimento”, ou seja, o autor
pensa que sabe demais e escreve pensando que todos sabem igualmente a ele. Não
há o cuidado de transmitir um conhecimento de forma menos culta e mais
acessível. O resultado é uma escrita horrenda partindo de pessoas que se
aprofundaram no “academiquês” e esqueceram o leitor como aquele que precisa
compreendê-lo.
Comungo do pensamento do linguista. Não
somente contra os exageros formais da escrita e sua linguagem empolada, bem
como contra a utilização de termos generalizantes que significam tudo e nada ao
mesmo tempo. Não suporto ler qualquer coisa que contenha “obras estruturantes”,
“ideias estruturantes”. Os termos são bonitos, soam pomposos, mas quer enganar
a quem com tais imbróglios linguísticos?
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
Um comentário:
Excelente. Quem escreve, escreve para alguém ler. E a coisa mais chata do mundo é ler um texto pretensioso, cheio de palavras difíceis, daqueles que a gente precisa ler com o dicionário do lado. A impressão que eu tenho é que os escritores que escrevem desta maneira o fazem para parecerem mais inteligentes. Acabam entediando seus leitores.
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