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segunda-feira, 1 de junho de 2015

OS REBUSCAMENTOS NA ESCRITA (O ACADEMICISMO DEPLORANDO O TEXTO)


Rangel Alves da Costa*


Logo após o falecimento do ator Antônio Abujamra, fato acontecido em 28 de abril, li na Folha de São Paulo um texto do colunista Nélson de Sá (Excessos de Abujamra não esconderam diretor singular – 29/04/2015), que me deixou intrigado pela desnecessidade na utilização das expressões “derrisória” e “derrisório”.
Afirma o colunista que o teatro de Abujamra carregava uma abordagem “derrisória. E mais adiante diz que mais tarde o diretor se descobriu, mas era um Abujamra “derrisório”. Não é fácil encontrar nos livros o conceito de derrisório. E não vejo necessidade alguma de um colunista de um jornal popular cunhar tal termo no texto de leitura geral.
O termo derrisório se amolda muito bem à intencionalidade do jornalista, pois significa exatamente na associação entre humor e agressão. Derrisão significa ridicularização, escárnio, expressão do ridículo. Mas se a intenção era dizer que Abujamra utilizava o humor agressivo para ridicularizar, bem poderia ter utilizado outra expressão, pois a utilizada foi inadequada ao meio.
Tal ânsia de expressar-se de forma demasiadamente culta ou com exageros acadêmicos e rebuscamentos linguísticos, ao invés de enriquecer o texto pode provocar efeito contrário e torná-lo pedante, incompreensível, desprezado pelo leitor, ainda que de cultura igual ao escritor. Ninguém suporta um texto enfadonho ou construído de forma ininteligível.
Desde muito que venho escrevendo alguns textos criticando o “inteligentês” na literatura e na escrita em geral, o forjamento das expressões com base em formalismos acadêmicos e o esquecimento de que o leitor é um ser que apenas deseja compreender o que está escrito. E também criticando o desprezo de muitos pela linguagem coloquial, pelos regionalismos e o linguajar comum do povo. Sempre preguei a palavra escrita ou falada de qualquer forma, mesmo tomada de erros gramaticas, mas que alcança sua função comunicativa. O que importa é o entendimento do outro, do interlocutor ou do leitor, e não a forma como foi expressa.
Estudiosos e filólogos como Celso Pedro Luft já pregavam a insubmissão da palavra, sintetizada no termo língua é liberdade. A verdade é que não há erro em qualquer fala ou escrita, mas tão somente uma inadequação às normas impositivas da gramática normativa. E como ninguém está obrigado a ser mais obediente às regras linguísticas do que à sua força de expressão, então não deverá calar somente porque a linguagem formal exige de outro modo.
A crítica se volta também aos livros cujos termos parecem propositalmente escolhidos pelo autor para não serem entendidos. Ou simplesmente porque desejam passar uma imagem de rebuscado e superior conhecimento. Carl Sagan e Stephen Hawking, por exemplo, poderiam ter escrito livros sobre o cosmos e a formação do universo com expressões somente compreensíveis aos cosmólogos, astrofísicos ou outros cientistas, mas não, pois conseguiram tornar seus escritos compreensíveis e de fácil leitura. Outros, contudo, se tornam intragáveis até mesmo nas academias.
Minha alma foi lavada a partir da leitura de uma entrevista publicada pela Folha de São Paulo neste sábado, 30 de maio, com o linguista norte-americano Steven Pinker atacando o estilo pomposo de escrever dos acadêmicos. Falando sobre o seu best-seller “O Senso de Estilo”, o autor sintetiza sua visão sobre a linguagem padronizada, as regras de escrever bem e o conservadorismo na escrita.
Segundo Pinker, a escrita, ao invés de tencionar o rebuscamento, deve ser simples, clara, concisa. E diz que o grande problema na escrita de hoje é “a maldição do conhecimento”, ou seja, o autor pensa que sabe demais e escreve pensando que todos sabem igualmente a ele. Não há o cuidado de transmitir um conhecimento de forma menos culta e mais acessível. O resultado é uma escrita horrenda partindo de pessoas que se aprofundaram no “academiquês” e esqueceram o leitor como aquele que precisa compreendê-lo.
Comungo do pensamento do linguista. Não somente contra os exageros formais da escrita e sua linguagem empolada, bem como contra a utilização de termos generalizantes que significam tudo e nada ao mesmo tempo. Não suporto ler qualquer coisa que contenha “obras estruturantes”, “ideias estruturantes”. Os termos são bonitos, soam pomposos, mas quer enganar a quem com tais imbróglios linguísticos?


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

Um comentário:

Ana Bailune disse...

Excelente. Quem escreve, escreve para alguém ler. E a coisa mais chata do mundo é ler um texto pretensioso, cheio de palavras difíceis, daqueles que a gente precisa ler com o dicionário do lado. A impressão que eu tenho é que os escritores que escrevem desta maneira o fazem para parecerem mais inteligentes. Acabam entediando seus leitores.