Rangel Alves da
Costa*
Os falsos
elogios alimentam as vaidades; as vaidades cegam as realidades; e de ilusão em
ilusão tudo se transforma em mera aparência. E o que é apenas aparente muito de
podre esconde nas suas entranhas. Eis o contexto que envolve o puxa-saquismo,
algo assim como elevar às alturas aquilo que sequer se sustenta no chão.
E quanta
força e quanto sacrifício deve ter um bajulador ou adulador para vender como
preciosidade o imprestável. Mas não se imagine, contudo, que os servis estão
apenas na ralé da sociedade ou naqueles que fazem da bajulação um meio de vida.
Governantes adulam governantes, poderosos bajulam poderosos, autoridades lambem
as botas de autoridades. Tudo depende da hierarquia, de quem está mais abaixo e
precisa de quem está mais acima.
E são
tantos os bajuladores que se espalham por aí que, à primeira vista, torna-se
até difícil apontá-los perante características específicas. Agem como pessoas
comuns, e até parecem comuns; comportam-se como pessoas normais, e até são
normais em muitos aspectos. Muitos são irreconhecíveis, enquanto outros fazem
questão de serem vistos como os guardiães dos deuses apodrecidos.
Mas são todos
indivíduos perigosíssimos, com um desvio comportamental que há muito desafia a
ciência, mas que muitos chamam de servilismo. Ou a ação de bajular ou de servir
aos desejos de outrem por vontade própria. Mas outras vezes até como meio de
sobrevivência. Verdade é que se alguns satisfazem seus egos doentios bajulando
o poder, outros fazem disso uma obrigação, eis que dependem da migalha jogada
pelo endeusado.
Conceitualmente,
o puxa-saco é aquele que vive para agradar a outrem através de falsos elogios
ou propagando qualidades inexistentes; é o indivíduo adulador, “baba ovo”, que
“mata e morre” por um político com mandato - e até sem cargo eletivo -, pelo
seu superior; é aquela pessoa que vive elogiando o seu idolatrado sob qualquer
circunstância, ainda que esse o humilhe ou trate com desprezo. Sabendo que a
pessoa se mostra vulnerável a elogios, eis que o puxa-saco inteligente não
perde tempo em cantá-la em verso e prosa.
É bastante
característico o puxa-saco ser um indivíduo extremamente mentiroso. Cria uma
imagem tão irreal de quem bajula que de repente não sabe mais onde termina a
verdade e até onde vai a enganação. Contextualiza uma falsa noção sobre as
coisas que o distancia da compreensão da realidade. Porém, distingue
imediatamente e com perfeição se ouve pelas ruas ou principalmente pelo rádio
alguém falando ou ao menos tencionando falar mal daquele que adula. Nesse
momento, ataca a crise de bajulice e não sossega enquanto não age com
intransigente defesa.
São muitos
os meios utilizados pelo bajulador para expressar seu puxa-saquismo. Além da
verbalização, o rádio acaba se tornando um dos instrumentos mais eficazes.
Contudo, nenhum meio de comunicação está imune ao puxa-saquismo. Televisões,
rádios e jornais de vez em quando são acusados de propagar além da conta a
imagem positiva de determinadas pessoas, mas também de fazer o inverso. E o que
se vê é uma mídia tantas vezes engajada em partidarismos.
O puxa-saquismo,
contudo, não é contagioso, mesmo que os portadores dessa anomalia moral tudo façam
para contaminar os demais. Os seus agentes são geralmente encontrados nos
escritórios de autoridades e nas antessalas de políticos; são sempre vistos
sentados nas assembleias e câmaras, nas prefeituras e ao redor das lideranças
políticas. Ficam noites sem dormir, verdadeiramente contagiados, se recebem um
elogio pela infame prática.
Como
observado, o puxa-saquismo pode ser infinitamente caracterizado, possui
inúmeras subespécies e está enraizado por todos os lugares e setores. Contudo,
o que realmente mais impressiona é a característica mutável que sempre está
presente na maioria dos aduladores. E os exemplos são muitos. Basta que o
resultado de uma eleição aponte os vencedores para que ocorra uma debandada de bajuladores
saindo de um lado e indo pro outro, passando a elogiar apaixonadamente aquele
que ontem não valia nada. Isto é mais comum do que se imagina e tem a duração
do próprio mandato.
Por fim,
tem-se que o puxa-saquismo acaba sendo de suma importância para determinados
governantes e políticos. Todas as vezes que se veem desacreditados, cientes de
que as pessoas não mais acreditam nas suas palavras, eis que recorrem aos seus
bajuladores. Então os porta-vozes do indefensável, da imoralidade e da
improbidade, logo começam a jogar a culpa nos adversários, de dizer que a
honestidade está sendo perseguida pela inverdade.
O pior é
que o bajulado se reconhece imprestável e sabe muito bem que não é flor que se
cheire. Mas que fragrância delicada e preciosa perante o bajulador.
Poeta e cronista
blograngel-sertão.blogspot.com
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