Rangel Alves da
Costa*
As
alegrias não costumam fazer festa ao final do ano. Neste e nos demais, sempre
um tempo de tristeza e solidão. Os encontros e confraternizações não são
suficientes para afastar a sensação angustiante que se apodera de mentes e
corações.
Muitos
encontram tristezas nas recordações. Não só o percurso do ano que se finda, mas
todo um calendário de vida. As lembranças se acumulam e tomam a feição da
saudade e da melancolia. Essa visão do passado acaba ofuscando o presente e
sombreando o futuro.
Muitos
simplesmente não conseguem mais esconder os sentimentalismos guardados dentro
de si. Tudo fizeram para que as flores frágeis dos sentimentos não
desabrochassem de vez e um outono de folhas mortas despontasse na janela e
invadisse a alma. Mas o tempo do ser se aproveita desses instantes mais tristes
e entristece a vida em flor.
Tantos
outros tentam fingir alegrias, contentamentos e simpatias, porém acabam apenas
disfarçando por fora o que não conseguem esconder por dentro. Não podem fugir
do espelho, não podem arredar do pensamento, não conseguem ser outro quando o
silêncio íntimo esbraveja mais que qualquer grito no mundo lá fora.
E ainda
aqueles que se mostram apenas o que realmente são. Não escondem tristezas,
angústias, aflições, tempestades íntimas. As lembranças e as saudades são as
mesmas, apenas mais vorazes que em outros instantes, vez que os momentos
presentes se mostram sempre mais férteis para os enternecimentos.
Dificilmente
alguém poderá dizer que nada sente de diferente a cada final de ano. Será
difícil se ouvir que tanto faz como tanto fez que seja dezembro ou não. Contudo
não creio haver tamanha insensibilidade que possa petrificar o espírito diante
de instantes tão delicados e reflexivos na vida do ser humano.
Não há
indiferença que não sinta o espírito afetado, transformado a cada final do ano.
Diários íntimos são reabertos, álbuns são revisitados, as lembranças empoeiradas
ganham molduras com dolorosa nitidez. Não são instantes que signifiquem apenas
sofrimentos, pois envoltos também no prazer dos reencontros, mas que acabam comovendo
a alma.
Não há,
pois, apatia sentimental que não abrande o ser nessa época. Por mais que o
natal seja visto como insignificante, que a paisagem natalina nada represente,
que a virada do ano seja visto como instante qualquer, ainda assim o coração
baterá no compasso da nostalgia, do passado, do vivenciado. Para depois seguir
o relógio e o calendário do novo tempo.
Mas tudo
acontece de modo tão estranho que mais parece um tempo de abrigo para fugir de
voraz tempestade. Na casa ou no quarto fechado apenas velas cintilam suas
chamas tênues e frágeis; o vento vai entrando pela janela e parece trazer no
seu passo uma música antiga, uma canção que desperta a saudade e a dor. Mas
não, não existe abrigo escurecido nem tempestade, apenas um dezembro com suas
cinzas e sombras.
Dezembro
que bem poderia ser um outono. Tudo dessa estação pode ser avistado nesse mês
de final de ano. A ventania murmurante que vai avançando sobre folhas secas,
ocres, acinzentadas, frágeis, extasiadas. Vidas desnudas de braços esquálidos,
entristecidos, tendo ao fundo um entardecer de brasa adormecida. E as folhas
esvoaçando, sendo levadas, seguindo para bem distantes, sem saber que
renascerão noutra estação. No novo ano, na estação que logo se iniciará.
Por isso mesmo
que dezembro é sempre envolto em dias cinzentos, corações sombrios e olhos que
miram sem saber o que desejam enxergar. Pouco encontrarão adiante, pois apenas
moldura com faces e feições do passado. E ainda não houve tempo de tentar
enxergar o futuro. E simplesmente porque impossível querer ir em frente quando
o coração ainda dialoga com o que ainda não foi esquecido.
Mas é
preciso viver o dezembro. E principalmente ultrapassá-lo, seguir adiante. E
abrir janelas e portas para receber o sol e as esperanças de um novo dia no
novo ano que se inicia.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
Um comentário:
Bom dia! As ausências que mais doem no final do ano, durante as comemorações das festas, não são as dos que se foram, mas as dos que ainda estão por aqui e não sabem valorizar a convivência.
Feliz 2014!
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