*Rangel Alves da Costa
Em seu
poema “Confidência do Itabirano”, Carlos Drummond de Andrade relata suas
heranças mineiras a partir das doces recordações de Itabira, cidadezinha onde
nasceu. E acrescenta que do seu chão e do seu povo herdou todo o seu jeito de
ser, sua simplicidade, sua cabeça baixa, sua pouca palavra. E finaliza dizendo
que teve tudo na vida, mas hoje só lhe resta uma fotografia na parede, e como
dói.
Contudo,
mesmo afirmando que já teve ouro, gado e fazendas, e hoje só lhe reste uma
fotografia na parede para lhe doer, o real sentido de tais palavras é para
dizer que a riqueza maior perdida foi ter saído de seu lugar, de sua
cidadezinha, de seu berço de nascimento. E o que mais lhe dói é ter Itabira
apenas como uma fotografia na parede. Ora, Drummond me espelha e me reflete.
Minha
“Confidência do Poço-redondense” é no mesmo sentido, ainda que eu jamais tenha
escrito poema tal. Mas, com mil vênias e perdões, ouso parodiar o poema do
mestre ao meu modo, assim:
Alguns
anos vivi em Poço Redondo.
Principalmente
nasci em Poço Redondo.
Por isso
sou sertanejo, orgulhoso: de sol.
Noventa
por cento de sol nas estradas.
Oitenta
por cento de sol nas cabeças.
E esse
alheamento do que na vida é qualquer palavra.
A vontade
de lutar, que me dá força e fibra,
vem de
Poço Redondo, de suas dores, sofrimentos e agonias.
E o hábito
de sonhar, que tanto me cativa,
é doce
herança poço-redondense.
De Poço
Redondo trouxe prendas diversas que ora te ofereço:
esta
chapéu de couro, que um dia foi de valente vaqueiro,
esta Santa
sem Face, bela relíquia da arte do Mestre Tonho;
este terço
benzido, que com reza me ofertou Zefa da Guia;
esta
humildade, esta cabeça baixa...
Tive
riquezas, tive dinheiro, tive roupa de festa.
Hoje sou o
que me foi destinado ser noutro lugar.
Poço
Redondo é apenas uma fotografia na parede.
Mas como
dói!
Poço
Redondo é apenas um retrato na parede, mas como dói. Por que não desejo Poço
Redondo como retrato na parede. Por que não quero que me doa a saudade de Poço
Redondo. Por que preciso ser rico novamente. Rica da terra, rico de povo, rico
de meu sertão. E nunca mais irá me doer a distância. Pois o retrato na parede
estará adiante do meu olhar.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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