*Rangel Alves da Costa
Agora mesmo ouço muitos trovões no sertão.
Ainda se aproxima das quatro horas da tarde, mas o semblante sertanejo já é de
escurecimento. As nuvens prenhes, carregadas, escurecidas, estão por todo
lugar. Não só trovões como relâmpagos cortando os céus, e das torneiras de cima
já começou a cair chuvarada boa.
Ontem foi assim também, de chuvarada forte,
porém rápida. De um instante pra outro e um pé d’água começou a cair, e no
momento seguinte as águas já estavam escorrendo pelas ruas, as poças se
formadas por todo lugar, rios finos escorrendo pelos caminhos de chão. Muita
chuva em pouco tempo, mas uma esperança imensa de logo mais haver um retorno em
maior pujança.
E parece ter chegado hoje, já próximo ao
entardecer. Perante o olhar dos mais velhos, daqueles sábios sertanejos perante
as feições da natureza, não é apenas chuva grande de repente caída, mas
prenúncio de trovoada. As nuvens gordas, o nublamento além do esperado, os
trovões e os relâmpagos, não deixam mentir. Sem falar de um calor de mil sóis e
de um mormaço que esturrica tudo. Tudo isso se afeiçoa a trovoada.
Em momentos assim, mas não igual a outros
tempos, certamente que muitas donas de casa ficam em tempo de se acabar com
medo dos relampejos e dos trovejamentos. O nome de Deus, dos santos e anjos,
não sai da boca. Padim Ciço e Frei Damião também são invocados contra o medo da
acabação. Os dedos buscam rosários e terços e a boca tremulante vai repetindo
antigas e poderosas orações.
Em momentos assim de trovões e relâmpagos,
nada de deixar espelho descoberto. Tudo que seja brilhoso tem de ser logo
encoberto para que os raios não sejam chamados. Igualmente com panela, copos,
raças, qualquer coisa possa reluzir e atrair a força relampejante da natureza.
Sem falar que muita gente se mete debaixo das camas, chora, grita, fica em
tempo de endoidar.
Assim, o que para a maioria é sinal de
esperança, pois as chuvas tão esperadas chegando, para outros se transformando
em verdadeiro tormento. Mas ainda assim a meninada, acaso encontre uma porta
aberta, logo sai em disparada pelas ruas. Sem temer as fúrias dos trovões e
relâmpagos, simplesmente procuram biqueiras, descampados, calçadas escorregadias
e até poças para os festins da chuvarada.
Certamente que os trovões e os relâmpagos
assustam, porém muito mais as estiagens grandes, as secas medonhas, os bichos
berrando com fome e sede e o homem na desvalia de tudo. Num período assim, ao
invés de as mãos se unirem em orações para que os trovões e os relâmpagos se
afastem dali, verdadeiramente imploram sua chegada. E há muito sertanejo que
até chora de alegria ao ouvir os primeiros ribombos lá no alto ou nas
distâncias.
A verdade é que os trovões sertanejos são
como anúncios de chuva grande. Não há medo que seja maior que a vontade que
chova muito, e sempre mais. São das trovoadas grandes que as esperanças
renascem em semente em grão. Com a terra molhada, com o tanque cheio, com os
brotos vingando de novo sobre a terra, então logo se terá fartura. E o sertão alimenta-se
dessa esperança entremeada de medo e alegria com as forças da natureza.
Não demorou muito e os trovões e os
relâmpagos foram embora. A chuvarada forte também. Mas a terra já está molhada,
alguma água foi juntada nos açudes, barragens e tanques. E o homem da terra já
faz planos. Logo estará semeando o grão sobre o chão.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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