*Rangel Alves da Costa
Outro dia eu escrevi um texto onde falava
sobre a volta das andorinhas sobre os céus sertanejos de Alcino Alves Costa,
meu pai. “Sim, Seu Alcino, as andorinhas voltaram”, foi o título que dei.
Naquele texto, as andorinhas simbolizavam os
muitos amigos de Alcino que voariam sobre os sertões para celebrar a memória, a
saudade, a alegria de reencontrar o mundo-sertão que foi a aspiração, a síntese
de toda a vida do saudoso Vaqueiro da História.
Vaqueiro da História ou O Caipira de Poço
Redondo, como também se autodenominava. Vaqueiro por que indo nas entranhas dos
carrascais sertanejos e nos entrelaçados dos cipós e catingueiras para desvendar
a saga maior de um povo. Caipira por que não se via e se sentia senão como um
humilde narrador de seu mundo.
Naquele texto, os amigos simbolizados eram
aqueles aos quais Alcino se entrelaçava em profunda amizade e constante
diálogo, e com cada um construindo e reconstruindo a história do sertão e sua
saga de heróis, bandidos, covardes e atrevidos. Um mundo de cangaceiros e
volantes, de beatos e missionários, de coronéis e jagunços.
Que mundo tão rico e tão belo aquele (e este)
onde as craibeiras douradamente floravam ainda que sombreando uma raça tão
hostil e tão temerosa. Num mundo-sertão tão assim: o umbu despencando da copa
carregada e caindo bem na boca do mosquetão, do mosquetão, da arma sedenta de
sangue.
Que mundo tão feio e tão repugnante aquele (e
este) onde a catingueira seca e desfolhada era contrastada com o brilho soberbo
e os adornos ricos e coloridos daqueles que cruzavam os seus caminhos de armas
nas mãos e corações enferrujados pelas maresias daquele mar tenebroso chamado
cangaço.
Este o mundo onde Alcino e seus amigos
buscavam e rebuscavam, dialogavam e escreviam, a cada passo e cada encontro. E
que prazer imenso sentia Alcino em reencontrá-los, em chegar perto para um
abraço, em fazer parte de seus mundos e de suas vidas. Tanto assim que até
deixava suas havaianas num canto para calçar sapatos.
Mas um dia Alcino partiu, alçou voo pelas
distâncias do além. Subiu aos céus e se fez passarinho sertanejo de viver entre
as nuvens. Por isso que mesmo ausente, seu olhar ainda se estende e se alonga
sobre as vastidões do seu amado sertão, do seu povo, de sua terra e mesmo sobre
tudo aquilo que ainda está enraizado para ser descoberto.
Lá do alto, lá feito passarinho onde estiver,
Alcino agora aumenta o seu sorriso ao avistar nos horizontes a revoada das
andorinhas rumo seu sertão. Sim, Seu Alcino, as andorinhas já estão chegando,
já acenam do alto, já dizem que os seus destinos é Poço Redondo.
E não vai demorar muito para que as andorinhas,
todas elas voando no sopro mítico do Cariri Cangaço, pousem no seu chão sagrado,
coloquem os pés sobre a sua abençoada terra sertaneja. Aves de arribação que
fizeram a melhor escolha: fazer ninho em meio às folhagens de tanta história e
tanta glória!
E que bom avistar as andorinhas em pouso
firme, alegre, contente. E que bom receber as andorinhas com seus cantos e
canções pela felicidade do reencontro com o mundo de Alcino. E todas elas se
encantando com o já frutificado e com o que se mostrará como nova flor na
história sertaneja.
Não há como pensar diferente. O simbolismo
das andorinhas no chão sagrado de Alcino sintetiza bem o significado do grande
evento que se avizinha: uma revoada de amigos chegados para reverenciar a terra
e o chão daquele que tinha no coração um pulsar chamado sertão.
E que venham as andorinhas, que logo cheguem
e pousem as andorinhas. Pássaros amigos de Alcino, pássaros que trazem consigo
os grãos da sabedoria e do conhecimento para serem mais uma vez semeados sobre
a terra daquele que nela ainda se faz presente, mesmo do alto, mesmo entre as
nuvens.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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