*Rangel Alves da Costa
Pouco mais das duas horas da madrugada e os
ribombos de fogos começaram a ecoar. Após o amainar dos estrondos, logo as
vozes eram ouvidas bem adiante. Diversas pessoas, muitas, que foram chegando,
reunindo-se no local marcado para o início de um ofício caracterizado pela
devoção, fé, crença e religiosidade do povo nordestino: caminhada em louvor a
Nossa Senhora Aparecida.
Mas não uma caminhada comum, de um local a
outro dentro da própria comunidade ou pelas estradas nos arredores da região,
mas seguido um percurso intermunicipal de mais de cem quilômetros. Saindo dos
limites das terras de Poço Redondo, no sertão sergipano, e atravessando
divisas, cortando estradas, até chegar à sede do município cujo nome homenageia
a Santa e Padroeira do Brasil: Nossa Senhora Aparecida.
Tal caminhada surgiu como pagamento de
promessa. Após uma graça alcançada, supostamente pela intercessão da santa
devotada, iniciou-se a sagrada obrigação de a todo ano, à véspera do dia
dedicada à santa, seguir caminhando até o santuário naquela cidade sergipana.
No ano inicial, apenas umas poucas pessoas decidiram acompanhar, mas já neste
ano um grupo muito maior decidiu acompanhar o pagamento de promessa pelas
estradas sertanejas da religiosidade e da fé.
Tenha-se, porém, que o cumprimento da
promessa não se dá apenas com a caminhada de pessoas que vão parando para
descansar assim que os cansaços e os suores da distância cheguem. Tudo é
estratégica e logisticamente programada. As pessoas caminham, mas veículos de
apoio proporcionam toda assistência que necessitem. Após a chegada ao santuário
e os ofícios religiosos, o retorno se dá nestes veículos. Não há mais uma
exaustiva e cansativa caminhada, mas apenas a boa e espiritual sensação de
dever cumprido.
Mas como dito, logo após das duas da madrugada,
no trecho defronte aonde me acomodo na cidade sertaneja de Poço Redondo, eis
que sou acordado do sono tranquilo na rede pelos fogos e pelas vozes. Gente e
mais gente chegando, tudo em preparativos para a caminhada de fé, até que todos
seguiram em direção a igreja matriz. Ali foram para serem abençoados por Nossa
Senhora da Conceição, padroeira local, na caminhada. Entoando cantos, levando
rosários de fé, com os corações tomados pela devoção, em seguida tomaram os
caminhos distantes.
Tudo isso aconteceu no último dia 11, às
vésperas do Dia da Padroeira do Brasil, a Nossa Senhora Aparecida, que com sua
força de transformação e de reparo nas linhas tortas da vida, torna possível que
cada vez mais gente ao seu manto se entregue em busca de cura, salvação ou
simplesmente para agradecer a certeza de sua intercessão. No dia seguinte já
estavam no santuário. Neste dia, as promessas foram pagas, os agradecimentos
chegaram acompanhados das palavras da alma.
E tanto na ida com no retorno, apenas a
caminhada. Nenhum cansaço, nenhuma dor, nenhum sofrimento. Eis os caminhos da
fé e da devoção.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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