*Rangel Alves da Costa
A seca
avança cada vez mais, a falta de chuvas amedronta. Pelos campos, o verdor deu
lugar ao acinzentado. A planta encolheu, morreu, virou pó. Paisagens tristes,
desoladas, de um melancolismo angustiante.
Água
lamacenta no fundo tanque. Um barreiro que ressecou de vez. O barro onde antes
havia água empoçada. Uma carrada d’água? Ou os olhos da cara ou a humilhação.
Dias de angústia e de sofrimento.
Por
consequência, em diversas situações, o retrato de secura que se avoluma não
está mais sendo suportável ao sertanejo, principalmente aquele sem recursos
suficientes para manter o que lhe resta de rebanho de cria.
Nos fins
de semana em meio ao sertão, de passo em passo eu ouço palavras de aflição e
sofrimento. O estado agrava-se de tal modo que em muitas localidades não há
mais sequer um resto seco de pastagem e que permita que a vaquinha magra vá
iludindo a fome.
Triste é o
momento chegado de ter de comprar palma, farelo ou outro alimento para o bicho.
Até quando vai poder tirar do pouco que já tem para comprar ração para o bicho
na pele e no osso?
Ora, o
sertanejo já não tem além daquilo que pouco tem para sobreviver, e tirar do
quase nada é sacrifício demais. Contudo, um sacrifício que insiste em se tornar
prática no dia a dia. Mesmo sabendo que nada pode fazer ante a seca, insiste em
se armar com todas as forças.
Mas
existem outros sacrifícios. A pequena feira é reduzida ainda mais, a roupinha
do menino fica pra depois, o remédio só se não houver mesmo jeito, nada além do
necessário ao comer e beber. O cuscuz com ovos, de repente se transforma
somente no pão.
O feijão
com tiquinho de carne, de repente se transmuda apenas em qualquer coisa com
ovo. E assim por que a vaquinha magrela também é vista como da família. O
cavalo ossudo também é da família.
E não há
verdadeiro sertanejo que se sinta bem colocando um pedaço de pão na boca ou
bebendo uma caneca d’água e sabendo que o seu bicho está berrando de fome ou de
sede. Há bem dizer, chora a mesma lágrima do bicho, sente a mesma dor de seu
animal de cria.
Imenso é o
amor sentido pelo sertanejo por aquilo que possui. Padece pelo bicho uma dor
parecida com a sentida quando um filho seu está doente. Agoniza na magrez do
anima, muge por dentro a mesma sangria do animal. E isso é fácil de ser
percebido.
Por que o
homem da terra gasta mais para manter sua vaca viva do que o valor que ela
possua mesmo gorda? O amor sentido, só isso. A abnegação sentida por aquilo que
lhe está presente desde o alvorecer ao anoitecer, e dia após dia numa relação
de amizade sem fim.
No sertão,
homem e terra são uma coisa só. E homem e bicho fazem parte da mesma família.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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