SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



sexta-feira, 23 de novembro de 2012

PALAVRAS SILENCIOSAS - 83


Rangel Alves da Costa*


“Estou em falta com a natureza...”.
“Sublime preocupação...”.
“Nunca mais uma plantinha sequer...”.
“Terá tempo de reflorestar o universo...”.
“Mas preciso tomar iniciativa...”.
“Então escolha muda ou semente...”.
“Prefiro a semente...”.
“Por quê?”.
“Porque se completa o ciclo da gestação...”.
“É sempre bom acompanhar cada passo...”.
“É como um filho que está sendo gerado...”.
“Não deixa de ser assim...”.
“Mas surgirão os problemas...”.
“Imagino o que queira dizer...”.
“Os filhos são gerados, trazidos ao mundo e a sobrevivência depende basicamente dos pais...”.
“E com a planta...”.
“Foge mais ao nosso controle, pois nem sempre fica dentro de casa...”.
“E depois de a planta nascida cada um quer ser dono...”.
“E não para conservar, na maioria das vezes...”.
“E nem para deixá-la lá quietinha...”.
“Crescendo com as forças do tempo...”.
“Pois chega para pisar, arrancar, destruir...”.
“Lembrei agora da sina da semente...”.
“Uma história nova?”.
“Até que eu soubesse...”.
“Ouvirei como novidade...”.
“Então ouça. Vai uma mão, escolhe a semente e o local de semeá-la...”.
“E lá deposita cuidadosamente o grão...”.
“Vai cuidando, regando...”.
“Afastando as ervas daninhas...”.
“E vai crescendo, crescendo, bonita, imponente...”.
“Que planta é?”.
“Uma árvore de grande porte, de madeira nobre...”.
“Talvez um jacarandá...”.
“Talvez. Então chega o dia que a planta tomará sozinha o seu destino de árvore...”.
“Então...”.
“Então todo o cuidado e zelo do semeador estarão ameaçados...”.
“Pelos outros homens...”.
“Infelizmente sim...”.
“O que acontece, então?”.
“Chega um e repousa na sua sombra. E que belo e confortante sombreado...”.
“Chega outro e...”.
“Chega outro e crava no tronco um coração amoroso. E que poesia arbórea...”.
“Até aí tudo bem...”.
“Mas chega outro e logo vê a árvore com interesse comercial...”.
“Cortá-la, transformá-la em madeira com diversas finalidades...”.
“Chega outro com uma serra elétrica...”.
“E toda uma vida ao chão, em segundos...”.
“E com ela se foi o sombreado, os ninhos de passarinho, a moradia de muitos...”.
“Será transformada em móveis...”.
“O pior que não...”.
“Será transformada em que?”.
“Em milhares de armas...”.
“Em cabos de facas assassinas...”.
“Em cabos de punhais e canivetes...”.
“Em instrumentos de castigos...”.
“Em porretes e palmatórias...”.
“Em caixões de defuntos...”
“Em cruzes de cemitérios...”.
“Em objetos requintados de crueldades...”.
“E tudo da semente planta com tanto carinho...”.
“E que continuaria lá segundo o desejo do semeador...”.
“Mas chega o outro e se arvora de tudo...”.
“Apenas para destruir...”.
“Como sempre acontece...”.
“Não só com a natureza...”.
“Também com a vida!”.

  
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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