Rangel Alves da Costa*
Hoje está em total desuso, é ofício que não se pratica mais, mas nos tempos antigos a arte de acender vaga-lumes era uma nobre e valorosa ocupação.
E tão valorizada era a arte que os acendedores de vaga-lumes só eram encontrados entre os sábios, filósofos, aqueles mais judiciosos e prudentes.
E havia razões para ser assim: só consegue acender vaga-lumes que tem o espírito iluminado, quem consegue enxergar o dia na escuridão, quem vive buscando explicações para a realidade do mundo.
Só consegue acender vaga-lumes quem não se contenta com o dado e vive perquirindo outras respostas, quem encontra motivos para conversar e ouvir a pedra ou dialogar com as forças da natureza.
Só faz surgir a luminescência no pequeno inseto coleóptero da família Elateridae, Fengodidae ou Lampyridae aquele que não necessita de um pirilampo voando ao redor para fazê-lo fosforescer. A luz é ideia, e o vaga-lume idealiza o mundo na sua imperfeição, devendo ser aceso para proporcionar os sinais.
Muitas vezes, em meio ao negrume da noite, debaixo do mais tenebroso breu, o sábio chamava o seu discípulo e ensinava-lhe como encontrar a luz em momentos difíceis, como avistar uma réstia quando tudo já está desesperançado. E o discípulo começa a avistar vaga-lumes.
Outras vezes, caminhando solitário pela via escura, o filósofo encontrava pessoas que logo lhe perguntavam aonde ia assim debaixo de tamanha escuridão, onde apenas os grilos cantam nos escondidos e os vaga-lumes nem ousam aparecer. Vou acender vaga-lumes, respondia ele.
Alguns seguiam adiante dizendo da loucura encontrada, outros apenas ouviam para dizer que ali era mais fácil encontrar os seres maldosos da noite a um só vaga-lume. Mas houve alguém que se interessou pela resposta do filósofo e indagou-lhe como era possível encontrar vaga-lumes para acendê-los se ao encontrá-los logicamente já estariam piscando.
O velho filósofo logo entendeu aquela indagação e intimamente se encheu de uma felicidade indescritível. Até que enfim encontrei um vaga-lume, disse a si mesmo. Mas ao abrir a boca perguntou se a pessoa estaria disposta a ajudá-lo nessa difícil empreitada. Com a afirmação positiva, só restava dizer o que deveriam fazer.
E continuando ali mesmo, os dois em pé envoltos na escuridão, o filósofo disse: Creio que os vaga-lumes nem sempre estão piscando, nem sempre estão emitindo aquelas luzes fosforescentes. Deve haver um motivo para que continuem apagados, em repouso, como deve haver um motivo para que comecem a piscar.
E continuou. Portanto, pode haver vaga-lumes ao redor e que, por estarem em inércia, nossos olhos não conseguem enxergar. Mas mesmo que continuem assim será possível avistá-los. Se você acha que eles estão por aqui, haverá sempre uma grande possibilidade de eles estarem realmente por aqui. Mas se você tem certeza que eles estão aqui, então não demorará muito para que comecem a piscar.
E disse mais. Eis a noite do vaga-lume e a noite do homem. Tudo uma possibilidade, mas também tudo impossível, se assim desejar. O homem que teme a noite, que concebo como a realidade desconhecida, jamais encontrará vaga-lumes. Tão preguiçoso é para buscar respostas, tão inerme é para descobertas que permanecerá na escuridão diante de milhões de pirilampos incandescentes.
Então, a pessoa que permanecia ao lado ouvindo as explicações, ansiosa para dizer que talvez tivesse entendido tudo, humildemente falou: Palavras tão sábias e verdadeiras chegam a mim como luz. E só agora sei como posso iluminar a noite do medo, do desconhecimento, da incerteza. Basta seguir adiante, ter determinação e perseverança, procurando sempre a razão em tudo que possa existir, e certamente encontrarei vaga-lumes.
E depois disso os dois seguiram adiante, tão iluminados como pirilampos.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário