SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

O OUTRO LADO DA LUA (Crônica)


Rangel Alves da Costa*


Como afirma Mark Twain, cada um de nós é uma lua e tem um lado escuro que nunca mostra a ninguém. E quem se oculta no outro lado da lua jamais avista o que acontece na terra, adiante, na rua.
Seria também correto afirmar que cada pessoa sempre quer ser vista como uma lua bonita, cheia, dourada, radiante, derramando graça diante de todos. Imagina-se sempre lua cheia, e ainda que a maior parte de sua face esteja escurecida.
Mas será na comparação entre as faces da lua e as faces humanas, incluindo-se aí as fases de mais ou menos brilho, de sombreamento ou escuridão, que será mais fácil demonstrar essa propensão humana em querer revelar somente o lado que brilha.
A face escura da lua se apresenta conforme o ângulo pela qual ela é vista. Na conjunção com o sol, a face escura está totalmente visível. É lua nova e tudo está escurecido. Na lua cheia a face mostra-se totalmente iluminada.
Por sua vez, a face iluminada da lua é aquela voltada para o sol. E a fase da lua diz respeito o quanto dessa face iluminada pelo sol está voltado também para a terra. Assim, nenhuma face iluminada na lua nova; vestígios de luz na lua crescente; toda resplandecente na lua cheia; perdendo a luz ou decrescendo no quarto minguante.
Mas as fases da lua se modificam constantemente, diariamente. Se a cada momento o sol a ilumina sob um ângulo diferente, do mesmo modo ocorre com suas fases e o poder de luz que recai na sua face. Assim, a luz da lua está em constante transformação. E nada diferente no ser humano.
Reafirme-se que nas pessoas é assim também. Ninguém pode se mostrar permanente como lua nova, toda sombreada, nem como lua cheia, completamente tomada de fulgor e claridade. Mesmo imperceptivelmente as situações vão se modificando a cada instante, para mais vivacidade ou sombreamento.
Tais feições em constante transformação, contudo, ou são negadas pelas pessoas ou estas tudo fazem para fingir que não estão imunes a mudanças repentinas, e muitas vezes com radicais transformações. A única preocupação do ser humana é mostrar-se sempre lua cheia, radiante, esplendorosa.
E são tais mudanças que interferem nos temperamentos, nas incidências de raivas e atritos, arrogâncias e gestos impensados; no surgimento de sensações de tristeza, angústia, melancolia; no distanciamento ou negação da realidade; nos momentos difíceis de serem administrados pela feição que a todo custo quer mostrar outra imagem.
Ora, sendo lua o ser humano, e sendo tão próprio de cada um querer-se mostrar tão belo, poético, tão encantador, outra coisa não faz senão esconder, forçar que se torne invisível em si, tudo que mostre uma face mais realista. E a realidade nem sempre é tão lua cheia quanto se deseja.
Eis que o sol que ilumina uma face - a face da lua humana - deixa sempre à mostra aquilo que a pessoa tenta esconder. A alegria é desmentida pela feição entristecida, a felicidade é negada no olhar que vagueia em busca de significados, a perfeição é contradita pelas máculas que são tantas.
Assim, por mais que a pessoa tente negar, esconder, colocar atrás de cortinas do ser e dos sentimentos, jamais se mostrará somente no seu lado perfeito de lua. Ademais, por mais brilho que tenha ou tente impor aos olhos dos outros, logo a falsa luminescência se verá visitada pelos sinais, pequenas sombras que vão se instalando na verdadeira feição.
Seria demasiadamente artificial e até inconcebível que o ser humano, tentando ostentar sempre uma lua cheia diante de si, esconda sempre ou por tanto tempo a lua nova que na mesma proporção carrega. O mesmo ser da alegria é o da tristeza, o mesmo homem que se diz indestrutível se ajoelha em prantos. Não há como fugir, ou fingir, da realidade sem maquiagens ou acobertamentos. E, irrefutável verdade, toda luz se apaga.
No homem, portanto, nem tanta noite nem tanto dia, nem somente lua nova ou lua cheia, mas apenas o momento do viver. Portanto, não adianta esconder as sombras que carrega em si, pois é na luz demonstrada que estas aparecem. E às vezes com terríveis feições.
  

Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com      

Nenhum comentário: