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segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

E ERAM TÃO JOVENS... (Crônica)


Rangel Alves da Costa*


Vida cheia de vida, vida cheia de esperança, vida de planos e grandes perspectivas, vidas na flor da idade. E eram tão jovens...
Em meio à madrugada, talvez por um descuido terrível ou porque predestinado a assim mesmo acontecer, eis que a fagulha acende a chama. Um sinalizador de palco. E daí o incêndio, o pavor...
Vidas que estavam ali para brincar, comemorar entre amigos, reencontrar colegas, brindar as alegrias da vida universitária e todas as alegrias, pois na maioria estudantes. E eram tão jovens...
Nunca há espaço seguro, com rota de fuga, com facilidade de escape, quando o terror se alastra, a correria começa, cada um pensando somente em fugir e todos na mesma aflição. Tudo é difícil der transposto. Assim aconteceu.
Certamente que estavam acostumados a diversões em boates, casas de shows, espaços tão propícios aos jovens. E ali seria apenas mais uma noitada agradável. Apenas seria. E eram tão jovens...
Com o fogo se alastrando, os gritos ecoando, o espanto e o terror tomando conta de tudo, os mais frágeis, as meninas de salto alto e os que iam tropeçando, simplesmente caíam para em seguida serem pisoteados. Alguns se arrastaram para morrer adiante.
Muitos colegas de curso, amigos de universidade, conhecidos no convívio cotidiano da vida estudantil. Outros conhecidos destes e amigos daqueles, e todos ali sorridentes sob as luzes flamejantes do imenso salão. E eram tão jovens...
Aqueles que caíram dificilmente conseguiram se levantar; os que correram para os banheiros ou por lá já estavam não tiveram melhor sorte. Quando a fumaça fortemente se espalhou, aqueles que ali estavam foram sendo terrivelmente asfixiados.
Jovens casais participavam do evento, namorados tiveram de apartar suas mãos para nunca mais se reencontrarem. E somente o irromper da tragédia, da crueldade indescritível, para que um namorado solte a mão de seu amor. E eram tão jovens...
O fogo em si não provocou tantas mortes, mas a fumaça asfixiante sim, as pessoas agonizando pelos banheiros sim, os jovens pisoteados e desfigurados sim, o verdadeiro tropel em desesperada busca de fuga e salvação sim. E eram tão jovens...
A mocinha não havia avisado à família que participaria da festa. Somente depois das onze da noite chamou os seus para ajudar na escolha da roupa. Uma saia verde e uma blusa branca. Estava linda. Seu nome: Leandra Toniolo, de 23 anos. Uma das vítimas. E eram tão jovens...
O noticiário dá conta que a tragédia seria menor se a arrogância e a brutalidade dos seguranças da boate não impedissem a fuga dos jovens em desespero. Impediram que buscassem as saídas para evitar prejuízos com o não pagamento da comanda. Cobravam as vidas.
Muitos que ali estavam e foram vitimados, certamente retornariam na semana para repor aulas na universidade. As listas de presença estarão fechadas e em profundo silêncio. Os professores olharão sem ainda acreditar para as cadeiras vazias, os colegas estarão olhando em direção à porta para ver se o amigo chega. E eram tão jovens...
Um rapazinho viajou de lugar distante para reencontrar sua namorada, estudante universitária. Passariam o final de semana juntos, mas na noite do sábado participariam da festa. Ele, Roger Dall'Agnol,  de 21, e ela, Susiele Cassol, de 19 anos, não conseguiram sair do incêndio com vida nem planejar o futuro a dois.
Enquanto os corpos amontoavam-se pelos banheiros e salões, os celulares das vítimas, ainda junto com elas, tocavam incessantemente. Eram as famílias desesperadas que apenas queriam ouvir uma voz do outro lado dizendo que estava salva, estava bem, estava vivo. Mas os telefones tocavam, tocavam e tocavam. Ninguém atendia. E eram tão jovens...
O noticiário televisivo e os sites de notícias mostram a terrível e aflitiva situação das famílias que perderam seus meninos. Olhos assombrados, feições pasmas, gestos desesperados. E ainda não haviam feito o reconhecimento dos seus. E depois a dor e o sofrimento em toda a sua intensidade.
Quase duzentos e quarenta mortos e tantos outros ainda espalhados pelos hospitais em tratamento. Não só uma tragédia, um terrível sinistro ou demasiadamente funesto acontecimento, mas um mundo que de repente se acaba. E assim, de modo tão brutal e incompreensível à crença humana.
Tudo dói. Dói demais, porque tantas vidas ainda em construção. E eram tão jovens...


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com  

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