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sexta-feira, 21 de março de 2014

“VAMOS CUIDAR DOS MENORES” (UMA PREOCUPAÇÃO ANTIGA DA IMPRENSA SERGIPANA)


Rangel Alves da Costa*


Em 1960 eram poucas as vozes ecoando sobre a situação do menor e alertando acerca da necessidade de proteção aos meninos e meninas no percurso de sua infância. As leis então existentes, principalmente o Código de Menores de 1927, pouco efeito surtia diante de um quadro que já se mostrava preocupante.
Com passos lentos, as normas foram se aperfeiçoando até culminar com a Constituição de 1988, que previu o Princípio da Proteção Integral de Crianças e Adolescentes, em seu art. 227: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
O objetivo maior é resguardar a vida saudável e digna do menor, proibindo sua exploração. Como aperfeiçoamento das normas constitucionais, em 1990 surgiu o Estatuto da Criança e do Adolescente, definindo mecanismos de proteção integral aos menores e apontando seus direitos fundamentais, além da tipificação de crimes que contra eles possam ser cometidos, dentre outras diretrizes.
Antes do surgimento do ECA, as legislações protetivas dos menores sempre tiveram mais intencionalidade do que aplicabilidade. Tanto foi assim que os clamores sociais sempre provocaram mais reações que as leis existentes. Para se ter uma ideia, por mais que a legislação proibisse e combatesse o trabalho e a exploração infantil, era preciso o grito indignado da sociedade para que as autoridades se dessem conta das raízes nefastas já tomando conta daqueles caminhos tão indefesos.  
Ainda num tempo onde o descaso perante a formação do menor era visto com normalidade e a exploração do trabalho infantil não era combatida com veemência, somente a imprensa e a sociedade para mostrar a realidade dos fatos e exigir providências diante do grave problema social que já se instalava. E a imprensa de Sergipe, já nos idos de 1960, dava sua contribuição em defesa dessas mentalidades ainda em formação.
Neste sentido, a Gazeta de Sergipe (ano I, nº III, domingo, 24 de janeiro de 1960), na sua edição dominical trazia o suplemento “GS Tabloide”, cujo título estampava “Vamos cuidar dos menores”, e mais abaixo dizia “Eles são o futuro, mas nós preparamos o seu futuro - Não têm preconceitos raciais, não odeiam ninguém - São puros - Merecem tudo - São os monarcas do mundo - Por que deixá-los ao léu?”.
Na página seguinte do tablóide, o texto parecendo de escrita recente: “Poetas escrevem, inclusive das excelências e beleza ‘dos anos que não voltam mais’. Há concursos de robustez infantil. Muita gente viva pelos serviços que lhes presta. Falamos dos meninos, da infância. Os meninos são os ditadores do mundo.
Alguns, por demais prosaicos, e brandindo tratados científicos, chamam as crianças de ‘monstrinhos destruidores’, pois não há brinquedo que não quebrem, móveis, enfeites, janelas e vidraças. Mais alguns chamam a criança de o ‘futuro da pátria’ (esses pensam sempre em guerras).
Mas não estamos aqui para isso. O nosso interesse é despertar consciências para o problema do menor abandonado, para o menor que já é delinqüente, para o menor que não tem futuro. Precisamos resolver êsse problema para darmos um atestado de povo culto, porque a medida de civilização de um povo é o cuidado com a sua infância e a juventude.
A nossa Cidade de Menores, funciona como se fora um estabelecimento de instrução comum, com férias e tudo. Cuidam de lhes ensinar as lides agrícolas, sem outra preocupação mais alta. Imagine-se que já se faz festa de caridade para mantê-la como a ‘premier’ de ‘Irmãos Karamozov’. Vamos ter cuidado com os nossos menores?”
Reproduzindo a linguagem da época, eis o texto escrito por Gercinaldo, idealizador do suplemento dominical da Gazeta de Sergipe, e que segundo o professor Vilder Santos era um sempre elegante funcionário público federal. E a instituição aludida era a Cidade de Menores Getúlio Vargas, inaugurada em 1942, em Nossa Senhora do Socorro, objetivando o acolhimento de menores abandonados e delinquentes.
A Cidade de Menores, abrigando crianças e jovens entre os doze e os dezoito anos, recebia os indivíduos enviados pela assistência social ou pelo Juizado de Menores. Ali, diferentemente do que ocorre com a atual unidade de atendimento ao menor, procurava-se, a partir do trabalho e das vocações, o desenvolvimento das capacidades físicas e psicológicas, tornando-os aptos ao convívio social.
Apenas um texto de um suplemento de 1960, mas tão atual como a realidade estarrecedora que ainda envolve os menores, principalmente os abandonados ainda no útero materno. Eis que o abandono da mãe é certeza de desamparo ao filho.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com 

Um comentário:

Anônimo disse...

Caro Dr. Rangel: Muita paz é o que lhe desejo.
Conforme já havia lhe falado, por questão de tempo não tenho estudado profundamente seus artigos e crônicas. Contudo, estão salvos no meu HD e os que mais interessam para meus trabalhos de pesquisas, estão sendo encadernados, assim como os textos de MENDES e do Dr. Archimedes.
Porém, o texto de hoje faz-me lembrar quando entre 1976 a 1985 - dez anos portanto, exerci a função de Comissário de Menores na Capital da Bahia, onde tive a oportunidade de visitar todas Unidades de acolhimento de menores tanto na capital como nas cidades do interior baiano, juntamente com o Excelentíssimo Doutor Juiz de Menores (hoje de saudosa memória) EDMUNDO BENEVIDES DE AZEVEDO, logo que eu era uma espécie de Assessor do mesmo na área de palestras nas escolas de Salvador.
Trinta e oito anos são passados do meu ingresso naquela Instituição, e vinte e oito que dali me afastei, e só vejo a cada dia a situação se agravando em termos de delinquência neste vasto e querido Brasil. Não sei como anda a assistência menoril em nossa Bahia e nos demais Estados Brasileiros em termos de boas Escolas de Menores para a reeducação das crianças menos favorecidas pela "sorte", evitando assim a multiplicação da criminalidade entre os adultos. MAS, EU GOSTARIA DE MORAR NA FINLÂNDIA, NORUEGA, SUÉCIA, DINAMARCA ou SUÍÇA, onde em um desses países, estão fechando e até vendendo as casas de presídio por falta de prisioneiros. SERÁ QUE EM NOSSO PAÍS ESTÁ SOBRANDO PRESÍDIOS MEU CARO RANGEL?
Abraços,
Antonio José de Oliveira - Povoado Bela Vista - Serrinha -Bahia