Rangel Alves da
Costa*
Sob todos
os aspectos, de inquestionável permanência e lucidez a observação que Charles
Colton (1780-1832) faz com relação à ambição pelo poder. Diz o clérigo e
escritor inglês que “A ambição comete, em relação ao poder, o mesmo erro que a
ganância em relação à riqueza: começa a acumulá-la como meio de felicidade, e
acaba a acumulá-la como objetivo”.
É
exatamente assim que acontece. Contudo, as palavras poderiam ganhar um novo
contexto: “A política comete, em relação ao poder, o mesmo erro que a ganância
em relação à riqueza: começa a ser praticada como meio de transformação social,
e acaba sendo conduzida como forma de transformação pessoal”. Ou ainda,
simplesmente que o poder político nasce como idealização de um sonho a ser
conquistado, de modo puro e virtuoso, e acaba se transformando, quando
conquistado, num maquiavélico jogo para sua manutenção.
Maquiavélico
porque o poder traz consigo sensos de tirania, de ambição desmedida, de
senhorio de tudo e sobre tudo. O poder tem o dom de fazer apagar o passado ou
até de modificá-lo para justificar o presente. Quem chega ao poder passa a ter
a única e exclusiva preocupação de cimentar cada vez mais a sua permanência,
ampliar suas forças e fortificar ao redor com vistas ao futuro. Tem-se, pois,
como prevalecente, aquela frase tão conhecida: Esqueçam o que um dia prometi
fazer e apenas suportem o que exijo que façam.
Assim
acontece porque já houve um rompimento total com o compromisso social ou com as
legítimas promessas feitas no passado para o alcance desse mesmo poder
político. Eis que quando as promessas foram feitas e os discursos bem
intencionados foram ouvidos pela sociedade, o indivíduo ainda não havia passado
pelo rolo transformador da política. Mas, uma vez experimentado, dificilmente não
passa a pensar mais no presente do que em sua história. E assim porque a
manutenção e o crescimento do poder não obedecem a regras éticas nem morais.
De
qualquer modo, a política geralmente surge no indivíduo como uma possibilidade
de, através dela, agir sobre a realidade social que clama por transformações.
Neste sentido, pode nascer carregando em si aspirações legítimas, sinceras e
coerentes. Em tal nascedouro ainda não está maculada nem direcionada a
objetivos escusos ou de proveitos pessoais. Como exemplo aquele indivíduo que
se faz liderança ainda jovem por carregar bandeiras de lutas que espelham os
anseios sociais.
E são
muitos os exemplos onde uma juventude politizada vai demarcando territórios de
atuação porque, além de chegar irradiando ideias novas e promissoras, age se
contrapondo aos velhos, ineficazes e conhecidos modos de se fazer política.
Surge, assim, como promessa diante de uma sociedade descrente nas velhas
práticas das calejadas raposas e já martirizada demais com as submissões do
poder. Contudo, dificilmente o político nascido como promessa continuará por
muito tempo como esperança de salvação.
Mesmo que
o poder seja uma conquista que vai se alimentando por si mesma, a sua busca é
sempre pautada por aspirações louváveis e grandiosas. Ora, ninguém parte em
direção ao poder levando na bagagem de luta o senso ditatorial ou de tirania. Mesmo
o maior tirano um dia começou sua vida política envolto nas melhores intenções.
Entretanto, é o alcance do poder que vai despertando a cobiça, a ambição e
todos os males próprios daqueles que passam a confundir governança com
arbitrariedade.
Lamentável
que assim aconteça. Lastimável que o
indivíduo se transforme de tal modo e outra coisa não faça a não ser tirar
proveito de mandato que exerce ou do poder que dispõe. Os mais algozes e
sanguinários governantes da humanidade começaram assim, tendo o bom senso e o
compromisso social como primeira forma de atuação, para depois se transformarem
em ditadores, déspotas ou tiranos, exercendo a soberania de forma injusta e
cruel, e contra aquele mesmo povo que lhe confiou o poder.
E assim
acontece pela cegueira que o mando causa e pela lucidez inversa que o poderoso
passa a ter. Torna-se cego nas arbitrariedades e injustiças praticadas, mas
sempre atento para preservar o seu mando. E não mede consequências para se
perpetuar no seu posto, como se mais nenhuma valia terá o homem se não for
ordenando, submetendo, subjugando. E é até difícil imaginar que alguém assim um
dia buscou apoio nas camadas mais carentes e prometeu lutar pela melhoria de
todos.
Tais
lições continuam em plena validade e com exemplos em todas as esferas de poder.
São cordeirinhos que se tornam lobos e lobos que se transformam em velhas
raposas. E ávidas, famintas por mais poder. Sabem que aí estão as chaves para
todas as portas, principalmente para aquelas onde possam encontrar vantagens
pessoais. Logicamente que nem todos os políticos e governantes são assim. Mas
será preciso sair por aí com a lanterna de Diógenes.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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