SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



terça-feira, 3 de junho de 2014

VOO AO LIMITE DO CHÃO


Rangel Alves da Costa*


Voar no pensamento significa uma louvável esperança de alcançar objetivos, uma tentativa de, ao menos ilusoriamente, estar diante de algo tão desejado. Todo voo mental vai além de uma possibilidade terrena momentânea para se situar numa realidade ilusória, mas com plena validade se satisfaz os anseios do sonhador.
E os voos tomam rumo por diversos motivos. Como as realidades negam a concretização de planos e objetivos, como as dificuldades da vida impossibilitam o alcance daquilo que tanto se deseja, então só resta ao indivíduo tentar alcançar tais realidades de outra maneira, que é através do pensamento, da mente que alça voo em direção ao desejado.
E o voo no pensamento, desimpedido e sem barreiras, sem pessoas atrapalhando a viagem e sem aquelas invejas tão próprias na caminhada sobre o chão, não só leva a pessoa aonde ela bem desejar como lhe causa sensações indescritíveis, e todas boas, positivas, alvissareiras. Daí que muitos alçam voo a qualquer instante e outros procuram suas plataformas para esvoaçar as asas mentais.
E que viagem intensa, profunda, maravilhosa. Na mente, como uma realidade em perfeição, aquilo que foi buscado. E assim ser possível a imediata presença num lugar distante, o encontro com o ser amado, o sorriso da vitória, o reencontro com aquilo que seria impossível fisicamente. Contudo, como todo voo tem ponto de partida, momentos de estadia e instante de retorno, eis que uma nova realidade será encontrada quando do pouso forçado.
Pouso forçado porque ninguém quer descer da nuvem, do etéreo imaginário, da galáxia mental. Voou exatamente para fugir da realidade terrena, e eis que novamente os pés têm de enfrentar a mesma realidade. E dessa não pode fugir, não pode omitir-se nem fingir que as coisas não acontecem ou simplesmente negligenciar as situações. Chega-se, assim, ao que é tão conhecido, seja florido ou temerosamente espinhento.
Da maravilha do voo ao enfrentamento da realidade. Tal rompimento é que torna o voo, o sonho de olhos abertos ou idílio imaginativo, em algo tão doloroso para muitos. Mas impossível permanecer lá em cima, viajando, sonhando. É na terra, pois, rente ao chão, que a vida caminha e tem de prosseguir. É na caminhada, mesmo que por cima de pedras e com mãos lanhadas das marcas da luta, que a vida se perfaz.
Mas nem tudo está acabado quando a pessoa desce do voo para o enfrentamento da realidade. Sonhar é bom, mas é preciso aprender a se relacionar com as situações de vida com as mesmas asas do voo mais distante. Como isso pode ser feito? Ora, basta ter em mente que o sonhado pode ser concretizado na realidade presente, de olhos abertos e plena consciência de tudo o que acontece ao redor.
É preciso, pois, aprender a voar no limite do chão; aprender a sonhar sem sair da realidade; aprender a ir além sem fugir do momento presente. Se há na mente uma imperiosa vontade de conseguir realizar algo, o primeiro passo é a luta para concretizar tal sonho; se o pensamento insiste em querer alcançar algo até mesmo impossível para muitos, o primeiro passo é torná-lo possível diante da persistência, da certeza que irá conseguir. Assim, é a luta que traz asas, que torna possível o sonho. E faz o indivíduo alcançar aquilo que desejar.
Eis a lição de um sábio diante de um discípulo sonhador: Vai que a ti pertence aquela nuvem. Alça teu voo e vai. Mas antes tenha certeza de ter aprendido a caminhar o suficiente para conseguir levitar. Se tua vontade é conseguir chegar até lá, então que vá caminhando. Mas faça de cada passo uma certeza que logo adiante conseguirá levitar.  E depois voar. Assim acontece com os grandes desejos. Nenhum homem consegue voar sem primeiro aprender a caminhar. É pela persistência na caminhada que se alcança o mundo, o céu, a nuvem...
Então vai. Suas asas são belas e grandiosas, o céu é imenso é esperançoso. Então vai. Sua nuvem é rente ao chão, o horizonte está abaixo dos seus pés, mas vai. Sabe o que quer e se reconhece como pássaro, então vai. Se há luta tudo será possível, tudo será conseguido. Então vai. E sempre atento ao que disse Nietzsche: Quanto mais me elevo, menor fico aos olhos de quem não sabe voar.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

Um comentário:

Graça Pereira disse...

Ah, mas como eu levanto voo tanta vez... E alcanço tudo quanto eu quero na vida! E no regresso, para enfrentar novas realidades, como dizes... eu não me importo. A paragem será por pouco tempo... sei que, quando abrir de novo as minhas asas...tudo se concretizará!!
Adorei o texto.
Abraço e boa semana.
Graça