Rangel Alves da Costa*
Este mês de junho promete, e promete muito.
Se historicamente o mês junino é tido como um dos mais animados, festivos e
barulhentos, agora as coisas prometem ficar mais aquecidas, muito mais
crepitantes. Além dos acordes forrozeiros, bombas e chiados de chinelas,
gritos, brados e palavras de ordem certamente serão ouvidos. E por algumas
razões que ultrapassam os limites das festanças e das comidas típicas ao redor
de fogueiras.
As ruas já estão sendo enfeitadas,
bandeirolas coloridas já dançam ao sabor do vento, balões são pendurados em
barbantes, os ingredientes dos pratos típicos logo estarão à disposição da panela
e da fogueira. Já se sente o cheiro e o sabor do milho, das comidas com coco,
do cheiro bom de canela e de cravo da índia. Tudo para dar mais sabor ao arroz
doce, à canjica, ao mungunzá e logo mais ao quentão. É um mês de muitas
iguarias e opções de divertimentos.
Aqui e ali já se ouve o barulho dos fogos
sendo pipocados, os céus noturnos já começam a ser iluminados com brilhos
faiscantes, as cantorias e os acordes forrozeiros avisam que logo mais as
quadrilhas e os arrasta-pés darão a feição da festa. Sobressaindo-se em meio às
cores juninas, o verde e amarelo vão pontuando em cada lugar, eis que também é
mês de copa do mundo, de motivações ainda maiores para comemorações. E como o
brasileiro vive procurando motivos para se divertir, não há período e motivos
maiores que os atuais.
Mas, como dito, muito mais será ouvido além
do barulho do foguete e do rojão, muito mais será saboreado além da comida
junina, muito mais será erguido além das bandeirolas de enfeites e bandeiras
com as cores da nação de chuteiras. Muitos começam a aquecer suas gargantas
para os gritos, para os desabafos e cobranças desde muito guardadas. As
ideologias vão reacendendo suas chamas, as vozes da indignação vão ganhando
fôlego. Chega a hora também da prestação de contas.
Se é um período onde os cachorros ficam em
tempo de endoidar, correndo para debaixo dos móveis toda vez que ouvem ribombo
dos fogos, não será muito diferente para a classe política, principalmente para
a presidente Dilma que tentará a reeleição e terá nesse mês junino um
verdadeiro teste de fogo. Eis que as lascas da revolta e as toras da repulsa já
estão sendo apinhadas para a grande fogueira. E esta, aliás, já foi acesa em
muitas regiões do país.
Desde muito que os noticiários dão conta do
preparo do povo para a festança. Aproveitando o período junino e principalmente
os eventos e jogos da copa do mundo, os foliões que desejam um Brasil mais
ético e justo, e os torcedores por uma nação com menos gastança para o agrado
da Fifa e mais investimentos na saúde e educação, prometeram sair às ruas em
profusão. Vai ser um misto de comemoração e de rebeldia, de erguimento da
bandeira pela seleção e contra os políticos e a política, de fazer ecoar o
grito de paixão e de aversão.
Até poderia ser festa de aniversário, pois
também foi em junho que teve início a onda de manifestações por todo o país.
Naquela oportunidade - e fato que fez tremer as bases palacianas e causou
insônia na classe política -, os manifestantes abriam seus baús e reivindicavam
desde diminuição no valor da passagem de ônibus a aprovação de leis. E foi um
rebuliço danado, um corre-corre desenfreado dos políticos e governantes para
apagar aquelas imensas fogueiras que já ameaçavam seus gabinetes.
Em pouco tempo poucas chamas ainda se
mostravam vivas. E como sempre acontece nos meandros do poder e da governança,
basta que as ameaças imediatas se dissipem para que tudo volte ao normal, eis
que contam a seu favor com o esquecimento do brasileiro com o acontecido no
instante atrás. Desse modo, as promessas foram esquecidas, as mudanças foram
postergadas, e tudo a acontecer como antes no reino das espertezas,
improbidades e corrupções. Mas a fogueira do povo não estava morta, apenas
encoberta de cinzas. E agora renasce novamente assustando os donos do poder.
As ameaças de estrondosamente retornarem às
ruas podem não ser confirmadas, mas nunca se sabe o que pode acontecer num povo
que de vez em quando faz menção de levantar decidido do sono secular em berço
esplêndido. Verdade é que prometeram voltar às ruas para buscar respostas de
algumas questões omitidas pelo governo. Querem saber, por exemplo, por que a
Fifa mudou a legislação brasileira a seu bel-prazer, por que as obras de
interesse da população não foram concluídas no mesmo esforço que os estádios,
por que muito do prometido jamais será realizado.
Estas são apenas algumas das muitas questões
que estarão no bojo das velhas e nunca atendidas reivindicações. Contudo, o que
causa medo aos políticos e governantes não são as manifestações nem as palavras
de ordem. O que causa verdadeiro terror no poder é não saber ou não prever até
onde e quais os rumos e forças que tomarão tais manifestações. É a perda do
controle da situação que faz o milho do governo assar sem ao menos chegar perto
da fogueira.
Mas quem viver verá. O mês promete, e muito.
As fogueiras logo serão acesas e ninguém sabe ao certo os danos que um eventual
descontrole das chamas poderá provocar.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário