Rangel Alves da Costa*
Mesmo que alguns insistam em afirmar que não
deixam que problemas e preocupações específicas interfiram nos demais afazeres
da vida, é muito difícil que realmente assim aconteça. As inquietações afetam o
indivíduo como um todo, e não há mente que consiga separar esse joio do trigo
psicológico.
As aporrinhações da vida sempre chegam em
cardume. Surge um probleminha, depois outro e ainda mais outro e tantos outros.
De repente a pessoa já não sabe o que deva tentar resolver primeiro, se o
problema familiar, a inquietação pessoal ou a chateação profissional. Mesmo que
seja chamado a debelar apenas um problema, já não terá conseguido evitar que o
mesmo tenha se alastrado e interferido nas demais feições de sua vida.
A verdade é que uma mera inquietação tende a
afetar tudo que diga respeito ao indivíduo. Uma desavença familiar terá reflexo
no aproveitamento profissional; um problema no trabalho provocará consequência
no lar, pessoalmente e perante os demais. E tudo em cadeia, e tantas vezes como
bola de neve, vez que a mente já afetada tende a ser um pavio curto demais.
Qualquer coisa já provoca uma reação além da normalidade e, consequentemente,
outro problema.
É realmente difícil conviver com problema,
ainda que se imagine fácil de ser resolvido. Sempre surgirão consequências
desesperadoras. Para se ter uma ideia, uma simples preocupação tem o dom de
colocar a vida em perigo numa situação de desatenção no trânsito, de
negligenciar naquilo que deveria ter a máxima atenção, de fazer mal feito o que
se costuma fazer com perfeição. O trabalho é afetado, a vida desnorteada, tudo
parece desandar de vez. E não adianta minimizar sua existência, pois a
visibilidade já não pode ser disfarçada.
Um velho sábio já dizia que somente uma mente
sã, despreocupada e livre, pode alcançar os objetivos almejados. Não adianta
subir à montanha com medo de altura, não adianta caminhar descalço por medo de
espinho, não adianta fazer qualquer coisa temendo ser repreendido pelos outros.
A montanha se tornará ainda mais alta e medonha, os espinhos surgirão onde não
existem, sempre se imaginará ouvir alguém dizendo que não faça ou faça
diferente. Ora, se é preciso realizar, então que o passo dado seja desacompanhado
de qualquer coisa que possa interferir nos objetivos.
Contam que um velho rei se tomava de temores
todas as vezes que avistava nuvens escurecidas no céu. Achava que seria
desastrosa toda decisão tomada em tais circunstâncias. E por isso mesmo não
assinava nada, nada ordenava ou recebia alguém enquanto os horizontes não
estivessem límpidos. Acaso transgredisse seu imaginário supersticioso correria
o risco de ficar temendo as más consequências de suas ações. Então, nada fazia
enquanto problemas pairassem no ar. Contudo, no mundo presente as pessoas não
esperam inertes que passem as tempestades.
Mas também, na vida comum, a maioria das
pessoas sabe que não adianta colocar os pés pelas mãos. Nunca dá certo tentar
forjar situações inexistentes. Se os problemas existem e trazem preocupações,
então é preciso primeiro tentar resolvê-los, desde os pequenos aos maiores.
Assim como uma parte podre pode tornar todo o restante imprestável, bem assim é
com a preocupação. Ou se debela ou será vítima de suas silenciosas armadilhas.
E assim porque quando se parece esquecido de repente se vê diante de sua horrenda
feição.
Todo o relato acima se aproxima muito do meu
instante de vida. Os problemas surgidos cumulativamente parecem querer testar
meu poder de superação. O que faço é não ignorar nenhum deles. Agindo assim,
procuro tudo fazer para não deixar que o problema vença a necessidade de
continuar produzindo, realizando, trabalhando. Mas não é nada fácil. Por mais
que eu tente fugir da inquietação mais me vejo diante do que tanto me inquieta.
E como os problemas não desaparecem ao acaso, então que a ventania dissipadora
seja minha própria ação.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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