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quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

“QUEM BEIJA ESSA FLOR NÃO CHORA...” (O VOO ALTO DA BEIJA-FLOR)


Rangel Alves da Costa*


Parabéns, Beija-Flor, merecidíssimo o título de campeã entre as agremiações do grupo especial das escolas de Samba do Rio de Janeiro. Foi o 13º título de uma trajetória ainda jovem na história do carnaval carioca. Numa disputa acirrada com o Salgueiro, ainda assim prevaleceu a força de um trabalho que se desenvolveu com técnica e perfeição ao longo de toda avenida.
A vitória da escola da baixada fluminense logicamente que não agradou a todos. As escolas rivais, contudo, parecem ter aceitado mais a pujança nilopolitana que muitos internautas e participantes de redes sociais. Estes sempre apontam o apoio recebido da Guiné Equatorial como forma de contestar o título. Esquecem-se da força da escola em si, do seu trabalho de barracão, no seu perfeccionismo na confecção das alegorias e adereços, na concepção dos carros alegóricos e na elaboração das fantasias.
Não se deve criticar o título de campeão àquele que fez por onde ser o melhor e deu provas disso na avenida. Seja com apoio de governo ditatorial ou não, a verdade é que a Beija-Flor fez por merecer mais um campeonato. Uma escola de samba pode receber cem milhões de dólares de patrocínio e ainda assim não apresentar o resultado esperado. Mas com a Beija-Flor não, pois do seu barracão só sai o que é da melhor qualidade, seja num simples adereço ao carro mais luxuoso.
Lógico que tudo planejado pela Comissão de Carnaval, tudo devidamente desenhado por experientes profissionais, tudo longamente ensaiando pelos diretores de alas, de modo a ter harmonia e poder evoluir com precisão, mas sempre com um diferencial na Beija-Flor: o brilho, a perfeição maior, a riqueza de detalhes, a grandiosidade luxuosa. As máscaras africanas estavam deslumbrantes, bem como as faces negras em cima dos carros. Uma maestria que remonta Joãosinho Trinta e que prossegue dando excelentes frutos.
E o título lavou a alma, serviu para dar a volta por cima depois do injusto 7º lugar do ano passado, quando não participou sequer do desfile das campeãs. As motivações são passadas, mas a perseguição à escola deu-se unicamente por causa da ligação de Boni, o homenageado, com a Rede Globo. Com raiva ou ciúmes da poderosa, sobrou para a escola.
Não achando pouco a injustiça praticada no carnaval de 2014, novamente quiseram prejudicar – e a todo custo – o desfile da agremiação carnavalesca de Nilópolis neste ano. Sob a desculpa de que o patrocínio veio do governo da Guiné Equatorial, acusado da prática daquelas atrocidades próprias da maioria dos países africanos, logo cuidaram de repassar a ideia de que a Beija-Flor estaria conivente com os desmandos governantes daquele país.
Ora, mas não se pode esquecer que a nosso lamacento e corrupto governo também patrocinou, através da não menos lodosa Petrobras, o carnaval carioca e com o repasse de muitos milhões. Desse modo, criticar a Beija-Flor por haver recebido patrocínio do país africano e não dizer que todas as escolas do grupo especial também receberam dinheiro de um governo sujo, no mínimo é não querer fazer um correto juízo de realidade. Ou será que o atual governo brasileiro é mais honrado e honesto que o da Guiné Equatorial?
Creio que o problema todo tenha sido ocasionado por ciumeira, afinal foram dez milhões de dólares. Esta foi, segundo dizem, a quantia disponibilizada pelo governo da Guiné Equatorial para que a Beija-Flor desenvolvesse o enredo abordando as riquezas culturais e históricas daquele país. Contudo, o enredo foi muito além, pois cuidou da África como um todo, levando para a avenida toda aquela força mística e cultural de um povo ainda não devidamente compreendido.
E a Beija-Flor parece realmente gostar de desenvolver enredos africanos. Numa junção de riqueza histórica e cultural do continente africano, com suas lendas, aspectos tribais, discriminações e sofrimentos, e a maestria da escola em transformar tudo isso em máxima beleza na avenida, não poderia dar outro resultado senão um desfile para calar toda a crítica e fazer novamente ecoar o grito de campeã.
Como resultado, uma impecável e belíssima apresentação, bem ao estilo rico e majestoso da escola nilopolitana e do sempre genial Neguinho da Beija-Flor, ecoando seu grito inconfundível: “O mar que trouxe a dor riqueza aflora/ Tem uma família agora/ Quem beija essa flor não chora...”.
Enquanto o Griô conta sua história, a Beija-Flor vai fazendo a sua. E com genialidade e perfeição. Parabéns!


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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