*Rangel Alves da Costa
Acaso houvesse canonização dos beatificados
pela política, certamente que a Congregação Para a Causa dos Santos teria muito
trabalho para tornar em santidade todos os políticos brasileiros que agora se lançam
como candidatos a deputado, a senador, a governador e a presidente.
Ora, pelas biografias apresentadas, pelos
históricos espalhados, pelos atributos divulgados, pelas grandes virtudes
propagadas, nenhum destes candidatos veio da casta dos homens comuns, daqueles
de carne e osso, de erros e acertos, de pecados e falhas. Todos eles são
mostrados como intocáveis, perfeitos, verdadeiros pastores de pobres rebanhos e
prometidos como salvadores.
As assessorias e o círculo de bajuladores de
tais candidatos divulgam seus perfis como se estivessem tratando de seres
completamente incomuns. São verdadeiras perfeições humanas. Nunca maltrataram
ninguém, nunca praticaram improbidades, nunca descumpriram promessas, nunca
abandonaram seus eleitores, nunca se arrogaram do poder, nunca foram contra
direitos do trabalhador, nunca tiveram um só desvio de conduta nas suas vidas
pessoais e políticas. Uns santos.
Os próprios candidatos tentam, a todo custo,
reescrever suas histórias. E não há gente mais esquecida que pleiteante a cargo
público através do voto. A população mais atenta diz que mentem tanto que até
se esquecem de que as mesmas mentiras já foram tão repetidas que já se tornaram
lorota. E por isso mesmo ninguém mais acredita numa só palavra do que digam ou
prometam. Ainda assim se apresentam como milagreiros e dotados de virtudes até
sobrenaturais. Ora, prometem o impossível.
Tudo num candidato parece angelical. Que
sorriso lindo, que gesto dignificante, que mão tão estendida em busca de todas
as mãos, que contínuo sorriso na face. Não são nem anjos, mas verdadeiras
santificações. As pessoas mais bondosas do mundo, nunca dizem um não, nunca
negam nada, nunca deixam os leitorados desesperançados, nunca deixam de abraçar
cada um como irmão e até dividir um pedaço de pão. Mas tudo na falsidade.
Muitos lavam suas mãos em álcool assim que retornam aos carros. Muitos deixam
afastar um pouquinho para baixar os vidros e vomitar.
São as comunidades mais pobres e perante
pessoas humildes que se apresentam como verdadeiro céu aos santos da política.
Agem como se santificados fossem por todo lugar, mas é em meio às classes mais
desfavorecidas que eles chegam envoltos e auréolas e luzes. Nunca o homem, o
mentiroso, o falso, o covarde, o corrupto, o processado, o envolvido em maracutaia,
mas sempre como pessoa tão doce e virtuosa que até os já de mais tempo na
igreja lhes deve reverência. Só faltam levar as mãos à cabeça dos enfermos e
curá-los, só faltam fazer o milagre da multiplicação.
Sempre assim a cada novo pleito eleitoral. Todos
os candidatos achando que o povo é esquecido por natureza, é idiota de
nascença, é desconhecedor de tudo e de toda verdade. Não há como pensar
diferente. Ou será que acham que não são uns vendilhões do povo, que vivem
envolvidos em trambicagens, que utilizam seus mandados para proveito próprio e
vendendo suas almas para ter mais e mais? Ou será que acham que o povo não
recorda das votações contra os interesses do povo, de suas omissões aos
interesses sociais e dos seus conluios com os lamaçais do poder?
De que céu estes candidatos acham que
desceram para ludibriar assim tão desavergonhadamente o povo, ou com que cara
de pau eles subiram das trevas para fazer de suas artimanhas um meio de
conquista? Será que acreditam no que dizem, será que creem no que prometem,
será que depois de tudo ainda têm coragem de se olhar em espelhos? Logicamente
que não sentem vergonha de nada. Sabem que são loroteiros, mentirosos,
enganadores, mas ainda assim se esforçam cada vez mais para aperfeiçoar suas
desavergonhadas artes. Ofícios que sempre negam o que são para conseguirem o
que querem.
Certa feita, Janjão Aroeira negou a entrada
em sua porta de um desses candidatos, e logo dizendo: “Daí mermo ói pras parede
e veja cuma tá cheia de santo, São Benedito, São Jorge, São José e mais um
monte de santo, tudo ali. E sei munto bem que o sinhô vem aqui pedi voto e
tomem mostrar que é mais um santo. Toda eleição aparece um monte de santo aqui.
Todo mundo quer voto, mai ninguém quer que eu pendure na parede. O sinhô quer?
Entonce dê a vorta e vá fazê seus milagre noutra freguesia”.
Mas não tem jeito. Os santos estão por todo
lugar. O sertão sergipano, por exemplo, transformou-se num verdadeiro céu. Não
há um só dia que os milagreiros cheguem para prometer chuva o ano inteiro e
comida em fartura pra toda mesa. Mas sei que muita gente ainda acredita. E por
isso mesmo as trevas da política devoram consomem o tempo presente e a
esperança de qualquer futuro.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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