*Rangel Alves da Costa
Decididamente, prefiro a palavra sem voz.
Prefiro ouvir o grito e a pronúncia sem ter de ouvir qualquer tipo de voz
humana. Preciso, necessito, tenho de ouvir sempre a palavra sem voz. Triste do
ser humano que desde o amanhecer ao anoitecer tem de continuamente estar
ouvindo a palavra maldosa do vizinho, a fofoca do conhecido, a arrogância da
autoridade, o esnobismo do poder, o tiro verbal disparado nas ruas, as
hipocrisias da língua. Não, não quero mais isso pra mim. Não quero mais ter na
palavra ou na voz do outro a desfeita da vida. Preciso, pois, de palavra sem
voz. Uma palavra vinda do vento, chegada da boca da noite, expressada do lábio
da brisa. Uma palavra que se traduza no olhar um pôr do sol, um amanhecer
ajardinado e perfumado, um horizonte pronunciando sonhos e desejos de partida.
Quero uma palavra assim, nascida na memória, no pensamento, na nostalgia. Quero
uma palavra que me chegue cheirando a café torrado, a pão saindo do forno, a
fruta madura de quintal. E a tudo responderei pela voz do coração. Sem
palavras.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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