AS COISAS E SUAS REALIDADES
Rangel Alves da Costa*
A sabedoria popular já disse que aquilo que a gente vê nem sempre é aquilo que é; na aparência há um conhecimento, dentro há a certeza; as coisas que aparentam ser de uma forma, se tornam de outra forma quando as conhecemos; quem vê cara não vê coração; a face nem sempre é a mesma feição. Seja de qual modo for, tudo para significar que a realidade das coisas está muito além daquilo primariamente visível.
Sem dúvidas, ninguém pode dizer que conhece alguma coisa somente pela aparência. Como verdadeiro trabalho sociológico, antropológico, de cunho etnocêntrico, o conhecimento mais aprofundado das realidades existentes exige exploração de campo, um caminhar na perspectiva de que as impressões vão se configurando numa identidade maior, e desta para a certeza. Contudo, certeza também aparente, pois nada no mundo é definitivamente verdadeiro.
Contudo, a busca do conhecimento das coisas e suas realidades só se torna possível exatamente porque houve um conhecimento anterior, e deste nasceu a dúvida e a curiosidade. Exatamente assim porque não se pode tirar conclusões por antecipação nem confirmar como verdadeiro aquilo que não passa de mera especulação, de suposições que precisam ser confirmadas. É também nesse passo que surge a necessidade de que não se pretenda conhecer levando-se para o encontro um ponto de vista já firmado ou um posicionamento positivo ou negativo.
Tudo o que foi dito até agora serve de base para qualquer investigação, para qualquer pesquisa, para qualquer conhecimento que se queira sobre o até então pouco conhecido. Contudo, é importante que tais premissas sejam aplicadas também nas relações entre os seres humanos, principalmente nos aspectos referentes aos conceitos antecipados, prejulgamentos e exposição perante os outros dos indivíduos que nem conhecem. E o que mais se vê é isso: as pessoas não conhecem outros nem as suas realidades e já começam a soprar pelos quatro cantos que ali há um verdadeiro deus ou uma coisa abjeta.
Muitas vezes, aquele que caminha lentamente está com muito mais pressa de chegar do que o que poderia estar correndo. Não se apressa porque o que tem de fazer é tão importante que tem medo de cair e não poder seguir adiante. Aquele que se mostra com um sorriso largo e gargalhando de palmo em palmo, talvez não esteja internamente com aquela mesma força festiva. Alegra-se por que não tem o que fazer por enquanto, e é melhor sorrir do que chorar. Aquela menina que passa todas as noites arrumadinha e volta já muito tarde não vai fazer o que os da esquina pensam e falam não, pois ela faz um sacrifício danado para ir estudar depois que sai da casa da patroa. Aquela senhora que está sempre sentada na varanda toda séria e carrancuda não possui um pingo de maldade nem na face nem no espírito. Alguém já pensou o quanto dói ter saudades de toda uma vida?
Tais exemplos servem apenas para confirmar que as coisas nem sempre são como os outros imaginam nas pessoas. Quem olhou viu um homem andando lentamente, quando este estava apressado; o todo contente estava infeliz por dentro; a menina não era nenhuma prostituta, mas sim uma estudante esforçada; a senhora é um doce de pessoa naquela feição tristonha. Daí que é preciso muito cuidado para não criar uma falsa realidade naquilo que se conhece. Ademais, ninguém gosta ser chamado de feio e arrogante, quando o próprio indivíduo e o seu espelho acham que é bonito e educado.
Se tudo fosse como vemos apenas à primeira vista, aquela pessoa não passaria apenas de mais uma pessoa, e não meu amor, meu viver.
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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