SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



terça-feira, 20 de julho de 2010

LUA, LUAR, LUARAR (Crônica)

LUA, LUAR, LUARAR

Rangel Alves da Costa*


Quando quero luarar eu vou pra qualquer lugar, que tenha noite bonita ou não, que tenha silêncio e medo, que tenho escuridão de mistério e segredo, que tenha ou não estrela ao redor, acompanhado ou só, eu vou pra qualquer lugar só pra ver o luarar.
Lua, luar, enluarar, luarar é a mesma coisa boniteza, lindeza que os olhos entendem mais que a pessoa, que cintila só de ver e falar com ela toda bonita lá em cima, amarelada, dourada e cheia, com olhos de fogueira abertos e jogando sobre a terra um brilho que é de cegar apaixonado e esmagar coração.
Da terra de onde vejo o luarar, endoideço se não vejo lá por riba lá em cima, no meio das nuvens ou sozinha, imperando na celeste escuridão, ao lado das estrelas fogosas e namoradeiras, aquele círculo encantado que se derrama em mim e sobre o poeta da rua espalha versos de inspiração. Ai, quanta canção boêmia e versos cambaleantes a lua enluarada já bebeu comigo. Poemas cheirando a limão, rimando com a lua no meio da rua.
Enlouqueço, endoideço se na minha noite que prometeu mais triste me faltar a lua enluarada, mesmo que numa réstia escondida lá em cima. Perco e juízo e amoleço a ideia, dou uivos feito lobo solitário, barulho feito cachorro louco, mio no telhado do gato, me espanto igual lobisomem na mataria. Cadê minha lua São Jorge, cadê meu luar seu dragão, cadê a auréola da noite, cadê poesia do coração, cadê da noite a razão?
Que não brinquem comigo tempo de enchuvecer, nuvem negra engravidar, tempestade se formar por todo lado e o negro retinir só porque vem relâmpago e trovão. Não quero saber não, não mandei chover agora e quero minha lua no lugar, quero luarar de volta, pois é noite e quero me apaixonar. Se ficar no duvidar, nesse chove sem molhar, nesse mais ou menos esquisito, pego uma escada e vou subindo ao céu pra plantar jardim defronte da lua e sentar lá só pra espiar. Não tenho culpa, é noite e quero me apaixonar.
Alguém lá de cima por favor afaste as nuvens, desilumine esse raio e cale de vez o trovão, espante essa coisa pra longe, chame chamando as estrelas que certamente não virão só. Logo a lua surge ao redor pra clarear os olhos de quem não aguenta mais buscar a lua num poste. Lua de poste também é bonita, porque a rua parece um céu quando tá solitária.
Sou assim, doido de lua cheia, apaixonado de lua crescente, solitário de lua nova, abandonado das outras luas. Mas mesmo assim sou teimoso, não perco uma noite sequer sem sair no meio do mundo, vagando no meio do tempo, só pra ver em qual cantinho a lua vou encontrar. A escuridão já me conhece e deixa passar quando quero.
Não troco um quarto bonito, com uma lâmpada acesa e um montão de coisa em redor, por uma janela porta aberta e uma vereda lá fora pra botar pé sem ter medo de sair na noite e olhar pra cima pra ver meu amor onde está. E tem dias que nem precisa olhar que ela já vem por cima como se quisesse engolir, numa doçura que é melhor do que a lua de mel. Lua tem dessas coisas, de querer safadar às vezes.
Se me falta a lua no céu, saio da janela e vou pra rua mirar a lua no poste, que também é bonita, incandescente, que não se esconde quando o tempo tá fechado e que também faz tudo ficar mais triste e feio quando está quebrada. Essa lua do poste também tem muitos seguidores noctívagos, pois basta ver quantos bêbados se encostam bem embaixo dela para chorar suas desilusões, quantos cachorros levantam as pernas bem embaixo do poste só pra ver se a lua está segura lá em cima, quantas crianças brincam de astronautas com a lua e jogam espaçonaves de plástico bem nos olhos de sua luz. E plashtblou! a lua apaga e cai.
Um dia a lua caiu perto de mim. Como ficou tudo escuro, não sei mais se dali em diante vivi ou morri.




Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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