Rangel Alves da Costa*
Dificilmente alguém imaginaria um jardim sem
flores. Tanto faz que o espaço seja grande ou pequeno, que haja grande
diversidade de plantas, que os canteiros estejam bem cuidados ou pouco
conservados, pois o pensamento logo se volta para as espécies floridas dando
vida, graça e perfume ao ambiente.
Assim, pensar em jardim é pensar em flores. E
pensar em flores é ter em mente as rosas, azaleias, begônias, hibiscos, cravos,
lírios, crisântemos, copos-de-leite, bromélias, camélias, violetas, dálias,
hortênsias, gardênias, jasmins, gerânios, tulipas e margaridas, dentre outras
espécies.
Aos olhos do poeta, as flores são a própria
essência do jardim, e sem as pétalas floridas restarão apenas plantas sem vida
ao redor de canteiros. Portanto, impensável um jardim sem sua atmosfera
primaveril, sem suas cores perfumadas e colibris ávidos por mais um beijo.
Aos olhos de muitos, mesmo para os apressados
caminhantes, os jardins sempre chamam atenção e encantam, mas nada igual aos
dias em que amanhecem floridos, radiantes, cheios de cores. Em épocas assim, a
maioria passa a ter os olhos da sensibilidade e o coração muito mais amoroso.
Quantos olhares se fixam mirando um jardim
abandonado, triste, com plantas carcomidas e folhas mortas? Quantos olhares
apreciam um jardim sem encanto algum, sem poesia alguma, sem nada que desperte
sentimentos? Quantas pessoas caminham até os canteiros para recolher um galho
seco e espinhento?
Havia uma menina que pensava diferente da
maioria. Não que gostasse de jardins sem flores ou que apreciasse os canteiros
com folhas mortas e pétalas esturricadas. Não que sentisse prazer em ver o
outono transformando a florada em cinzas levadas pelo vento. Nada disso.
Diferentemente das outras pessoas, ela
avistava o jardim pelos olhos do coração, e não pelo olhar enxergando a
paisagem. Para falar a verdade, nem jardim ela possuía defronte ou dos lados de
sua casa. Após a janela de seu quarto existia apenas um pedaço de terra com
plantas secas e restos de folhagens à espera da ventania.
Verdadeiramente, ali nunca fora sequer um
lugar de cultivo de qualquer planta que florescesse. O que ali existiu antes de
secar pelo sol escaldante e falta de chuva, havia sido apenas uma plantinha ou
outra que nasce em qualquer lugar. Mas nada de jardim, e muito menos florido.
Contudo, aos olhos dela, ali estava o mais
belo e pujante dos jardins. Aos olhos dos outros seria um jardim sem jardim, um
local sem canteiros, canteiros sem plantas, e plantas sem flores. Nem flores
vivas nem mortas, simplesmente sem flores.
Mas ela avistava seu belo jardim. Onde havia
apenas graveto carcomido e torto ela avistava planta, onde existia apenas terra
nua ela enxergava canteiro, onde existiam apenas restos de folhas secas ela
enxergava ramos verdejantes. Mas não avistava flores.
Era um belo jardim sem flores. Mas que
estranho e triste um jardim assim. Mas não para ela, que logo cuidava de florir
cada planta que fazia surgir diante do olhar. E mais estranho ainda que quanto
mais entristecida ou lacrimejante mais seu jardim florescia.
Abria a janela para espalhar todo o
sofrimento sentido. Sabia que quanto mais triste ficasse mais sofreria, mais
seria atormentada. Então enxugava os olhos com a mão e cuidava de encontrar flores
onde não existia e num jardim que jamais existiu.
E assim, entre rosas e violetas, entre
gerânios e jasmins, ia criando a ilusão de um mundo bonito, de uma vida bela e
cheia de felicidade. Assim era que superava suas angústias e aflições
adolescentes.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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