Rangel Alves da Costa*
Se o fim do mundo dos dinossauros se deu com
a queda de um imenso asteroide sobre a terra, dizimando grande parte da vida
planetária, o fim do mundo presente parece mesmo que se dará pelo fogo. E fogo
vindo do sol, em forma de calor. Os sinais já estão aí, a cada ano, com as
temperaturas ficando elevadas a níveis quase insuportáveis.
O calor de agora está realmente aterrorizante,
e se a tendência é a elevação da temperatura a cada ano, então uma verdadeira
fornalha é o que se terá pela frente. Na verdade, sequer se reconhece mais as
estações, pois tudo mais quente ou menos quente. Muito diferente de outros
tempos, onde inverno era inverno e verão era verão. Agora é tudo uma feição só
em qualquer tempo, e sempre pegando fogo.
Contudo, verdade é que durante alguns meses o
dragão fica mais afoito, mais ensandecido. Do final do ano até março as chamas
parecem mais vivazes, as labaredas mais chamejantes, o fogo mais próximo do ser
humano. E que coisa terrível é viver assim no desconforto, no suor, na aflição,
com o corpo querendo assar feito pão.
Em Aracaju a coisa anda realmente feia,
terrível. Sendo cidade praieira, com uma imensa costa marítima ao redor, o sol
acaba incidindo ainda mais forte e o calor de forno soprando em máxima
temperatura. O vento que vem da barra já vem com papel laminado para assar de
forma igual.
E tudo vai se transformando em dias e noites
insuportáveis, ruas parecendo tremer, asfaltos soltando fumaça, pessoas em
tempo de enlouquecer. Os desmaios são constantes, os desalentos também. E não
há banho, abano, guarda-sol, ventilador, ar-condicionado ou nudez que adiante,
pois basta colocar o pé do lado de fora e a lava de vulcão sopra faminta. E o
pior é que dentro de casa é mais aterrorizante ainda.
Como consequência, algumas cenas podem ser
observadas no dia a dia da cidade em chamas, e todas envolvendo pessoas –
magras e gordas e de todas as idades – diante da insuportabilidade da situação.
Muitos tomarão por ficção ou invencionice, outros acreditarão serem relatos de
um atormentado pelo calor, mas não, pois tudo podendo ser constatado pelas ruas
e avenidas.
E andei sabendo de cada uma. Soube de pessoas
correndo desesperadas pelo Calçadão da Laranjeiras em direção ao Rio Sergipe,
logo adiante. E corriam gritando, esbaforidas, aflitas, se derramando em suor,
a ponto de pegar fogo, prontas para se jogarem com roupa e tudo naquelas águas.
E não eram duas nem três não, mas várias.
Soube de pessoas caminhando e deixando para
trás o rastro molhado. De tanto ferver e suar, um verdadeiro rio pegajoso vai
descendo do cabelo até os pés e deixando a molhação por onde passa. Quem olha
para o chão e percebe tudo molhado, até que pode imaginar ter caído chuvarada
repentina. Mas não, é o suor do povo encharcando tudo.
Soube de pessoas praticamente enlouquecidas
saqueando isopores de água mineral dos ambulantes, e trocando tapas na disputa
por uma garrafinha. O mesmo ocorre com vendedores de sorvetes. Bares e
lanchonetes já fecharam as portas diante do que fizeram com suas cervejas e
refrigerantes.
Um amigo revelou-me que presenciou umas três
pessoas em combustão. Quer dizer, pegaram fogo no meio do tempo, em plena rua.
Já outro presenciou umas cinco pessoas em tamanho desespero calorento que não
pensaram duas vezes e ficaram completamente nuas em pleno calçadão. E os
outros, com os olhos empapados de suor, sequer perceberam a extensão das cenas.
Não posso afirmar, pois ainda não presenciei,
mas dizem que alguns andam carregando baldes para jogar um copo d’água na cabeça
de passo a passo. E quando os baldes secam invadem jardins e arrebentam
hidrômetros em busca do precioso líquido. Já outros levam ventiladores
portáteis. O problema maior é a fiação de quilômetros que têm de puxar atrás de
si.
Mas, como já afirmou um conhecido, tudo isso
já era esperado. É o próprio homem que vive colocando lenha na fogueira do
universo. Cada planta que tira do chão, cada beira de riacho que desmata, cada
fornalha que vai construindo e cada ação tomada contra a natureza, outra consequência
não gera senão o aumento da temperatura e a degradação planetária.
Daí que não é o sol que está mais próximo ou
está mais quente. É o homem cada vez mais frio, insensível e negligente perante
os problemas ambientais. Ora, a natureza sopra com aragem perfumada, leve,
confortante, todo aquele que cuida da Terra-Mãe.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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