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quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

SER GENTE, SER POVO E SER HUMANO


Rangel Alves da Costa*


O ser humano deveria ser gente e ser povo; o povo deveria ser gente; e gente deveria ser cada vez mais humana. O mundo necessita de gente humana, de seres realmente humanos. O que faz com que gente não goste de gente, que povo odeie outro povo, que o ser humano se contradiga tanto a cada passo?
Criados para a pacificidade, de repente a liberdade humana se transformou em arma contra o próprio ser humano. O homem, ao preferir trilhar o caminho inverso aos bons valores, acabou por transmudar o seu meio numa selva brutal. Daí o homem ser lobo do próprio homem, ser o algoz de sua espécie, ser aquele que pensa no próximo como inimigo.
O senso de humano deveria estar cada vez mais presente em cada um enquanto gente e em cada sociedade enquanto povo. Não se admite que gente seja apenas gente e povo apenas povo, sem a característica maior do humano. Como tudo se entrelaça para caracterizar o viver e o fazer humano, tal contexto não deveria ser desvirtuado em nome de crenças, religiões, preconceitos, discriminações, ódios pessoais ou quaisquer coisas que ameaçassem a estadia humana sobre a terra.
Mas vamos aos conceitos, lembrando apenas que serão vistos de modos específicos e não na totalidade de suas compreensões, vez que, por exemplo, o significado de gente tanto pode dizer respeito à população em geral como a pessoas desse povo. Contudo, será visto de modo mais restrito ainda.
Gente, pois, é visto aqui como o indivíduo, o homem ou a mulher, vivendo em comunidade, dotado de inteligência, com poder de raciocínio e reflexão. Aquele que faz parte do gênero humano e que se individualiza perante os demais. Eu sou gente, você é gente, e assim deve ser visto.
Povo, por sua vez, deve ser visto como o conjunto da população, como os habitantes de um país, de uma cidade, de uma localidade. É um conjunto de indivíduos, de pessoas. Entretanto, para os fins aqui almejados, povo é a condição humana existente nas pessoas, é a sua capacidade de ser reconhecido pelas suas ações.
Neste sentido, se poderia dizer que gosta do cheiro de povo, que aprecia a atitude e a determinação do povo, que não pactua com a escolha do povo. Ou ainda, com relação a gente, que gosta do jeito de ser de determinada pessoa, que se sente bem em meio a gente educada. Assim, gente possui a conotação de pessoa, de indivíduo de sujeito.
Já o ser humano é a espécie humana. Ser enquanto indivíduo dotado de atributos humanos. Neste sentido é que se diferencia do animal e irracional e possui prevalência na cadeia da existência, exatamente por ser racional. Ou ao menos assim deveria ser, tão humano quanto a sua espécie, tão inteligível quanto à sua capacidade de raciocinar sobre o bem e o mal.
O humano distingue a gente e o povo do reino da irracionalidade. Não basta haver nascido de pai e de mãe, do sexo masculino ou feminino, ou mesmo híbrido, e não carregar em si o senso humanista. E ser humano implica em humanizar-se sempre e sempre mais, já sair do leito com a noção de servir e compartilhar, de ser socialmente útil, de tornar-se reconhecido como pessoa e não como bárbaro.
De pouca valia se tem que o mundo esteja cheio de gente, e de uma gente que forma o povo, se esta gente e esse povo apenas vivem sem se reconhecerem nos fundamentos da existência. Ora, se existem é porque nasceram com objetivos e finalidades, com caminhos a serem percorridos. Ao surgirem como dádivas da criação, no mundo foram colocados como promessas do bem e para o bem. E não para que transgridam a criação.
Talvez seja difícil compreender assim, mas todos possuem, na essência, o dom da existência, do conhecimento e do senso de comunhão, porém optam por irracionalidades. O ódio ao invés do perdão, a intriga ao invés da concórdia, o ciúme ao invés da compreensão, a agressão ao invés da proteção. Infelizmente é assim que o homem se pauta no seu lidar com a vida e com o seu semelhante.
Ainda que conheça as consequências das más escolhas e dos comportamentos de vida, ainda assim o ser humano acaba optando pelo individualismo, por atitudes egoístas e pela deturpação do caráter natural. Como se num mundo de concorrências pessoais, onde cada um quer se sobrepor ao outro para mostrar que é melhor, o resultado são confrontos e derrotados de todos os lados. E isto, irremediavelmente, leva a mundo desumanizado em todas suas vertentes.
Como visto, tanto povo como gente e ser humano fazem parte de um mesmo contexto de vida e de existência. O surgimento da espécie foi para a paz, para a comunhão, o amor e o respeito. Não se admite a opção pelo mal quando todos se ressentem das tantas maldades existentes. Contudo, falta o compromisso de cada um perante a sua própria vida e o viver de todos.


Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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