Rangel Alves da
Costa*
O ser
humano deveria ser gente e ser povo; o povo deveria ser gente; e gente deveria
ser cada vez mais humana. O mundo necessita de gente humana, de seres realmente
humanos. O que faz com que gente não goste de gente, que povo odeie outro povo,
que o ser humano se contradiga tanto a cada passo?
Criados
para a pacificidade, de repente a liberdade humana se transformou em arma
contra o próprio ser humano. O homem, ao preferir trilhar o caminho inverso aos
bons valores, acabou por transmudar o seu meio numa selva brutal. Daí o homem
ser lobo do próprio homem, ser o algoz de sua espécie, ser aquele que pensa no
próximo como inimigo.
O senso de
humano deveria estar cada vez mais presente em cada um enquanto gente e em cada
sociedade enquanto povo. Não se admite que gente seja apenas gente e povo
apenas povo, sem a característica maior do humano. Como tudo se entrelaça para
caracterizar o viver e o fazer humano, tal contexto não deveria ser desvirtuado
em nome de crenças, religiões, preconceitos, discriminações, ódios pessoais ou
quaisquer coisas que ameaçassem a estadia humana sobre a terra.
Mas vamos
aos conceitos, lembrando apenas que serão vistos de modos específicos e não na
totalidade de suas compreensões, vez que, por exemplo, o significado de gente
tanto pode dizer respeito à população em geral como a pessoas desse povo.
Contudo, será visto de modo mais restrito ainda.
Gente,
pois, é visto aqui como o indivíduo, o homem ou a mulher, vivendo em comunidade,
dotado de inteligência, com poder de raciocínio e reflexão. Aquele que faz
parte do gênero humano e que se individualiza perante os demais. Eu sou gente,
você é gente, e assim deve ser visto.
Povo, por
sua vez, deve ser visto como o conjunto da população, como os habitantes de um
país, de uma cidade, de uma localidade. É um conjunto de indivíduos, de
pessoas. Entretanto, para os fins aqui almejados, povo é a condição humana
existente nas pessoas, é a sua capacidade de ser reconhecido pelas suas ações.
Neste
sentido, se poderia dizer que gosta do cheiro de povo, que aprecia a atitude e
a determinação do povo, que não pactua com a escolha do povo. Ou ainda, com
relação a gente, que gosta do jeito de ser de determinada pessoa, que se sente
bem em meio a gente educada. Assim, gente possui a conotação de pessoa, de
indivíduo de sujeito.
Já o ser
humano é a espécie humana. Ser enquanto indivíduo dotado de atributos humanos.
Neste sentido é que se diferencia do animal e irracional e possui prevalência
na cadeia da existência, exatamente por ser racional. Ou ao menos assim deveria
ser, tão humano quanto a sua espécie, tão inteligível quanto à sua capacidade
de raciocinar sobre o bem e o mal.
O humano
distingue a gente e o povo do reino da irracionalidade. Não basta haver nascido
de pai e de mãe, do sexo masculino ou feminino, ou mesmo híbrido, e não
carregar em si o senso humanista. E ser humano implica em humanizar-se sempre e
sempre mais, já sair do leito com a noção de servir e compartilhar, de ser socialmente
útil, de tornar-se reconhecido como pessoa e não como bárbaro.
De pouca
valia se tem que o mundo esteja cheio de gente, e de uma gente que forma o
povo, se esta gente e esse povo apenas vivem sem se reconhecerem nos
fundamentos da existência. Ora, se existem é porque nasceram com objetivos e
finalidades, com caminhos a serem percorridos. Ao surgirem como dádivas da
criação, no mundo foram colocados como promessas do bem e para o bem. E não
para que transgridam a criação.
Talvez
seja difícil compreender assim, mas todos possuem, na essência, o dom da
existência, do conhecimento e do senso de comunhão, porém optam por
irracionalidades. O ódio ao invés do perdão, a intriga ao invés da concórdia, o
ciúme ao invés da compreensão, a agressão ao invés da proteção. Infelizmente é
assim que o homem se pauta no seu lidar com a vida e com o seu semelhante.
Ainda que
conheça as consequências das más escolhas e dos comportamentos de vida, ainda
assim o ser humano acaba optando pelo individualismo, por atitudes egoístas e
pela deturpação do caráter natural. Como se num mundo de concorrências
pessoais, onde cada um quer se sobrepor ao outro para mostrar que é melhor, o
resultado são confrontos e derrotados de todos os lados. E isto,
irremediavelmente, leva a mundo desumanizado em todas suas vertentes.
Como
visto, tanto povo como gente e ser humano fazem parte de um mesmo contexto de
vida e de existência. O surgimento da espécie foi para a paz, para a comunhão,
o amor e o respeito. Não se admite a opção pelo mal quando todos se ressentem
das tantas maldades existentes. Contudo, falta o compromisso de cada um perante
a sua própria vida e o viver de todos.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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