*Rangel Alves da Costa
Mal ela adentrava ao portão e ele já a
avistava completamente nua. Era o seu jeito de sempre avistá-la. Não por
maldade, por desejo exacerbado, volúpia ou tara, mas simplesmente por que seu
olhar a despia pela graciosidade sentida.
Um olhar que nela somente encontrava beleza.
Tanto fazia que ela estivesse vestida de seda ou recoberta de diamantes, tanto
fazia que ela estivesse em traje exuberante ou envolta em adornos. Seu olhar
avistava apenas outro tipo de beleza: a da mulher em si, nela mesma.
Mas não sem motivo para tal, vez que ela era
realmente bela, de doce feminilidade, de cativante sensualidade.
Morena clara, de pele jambeada, de leve
queimor de sol sobre o corpo, cabelos lisos e longos, negros e sedosos, boca
chamativa ao beijo, olhos entre o mel e a boca da noite. Na pele um suave
frescor de flor matinal, pétala suave, somente pétala. E nas curvas do corpo a
escultura de uma deusa em pleno viço da vida.
Talvez fosse por causa disso que o seu olhar
tanto se encantava perante sua presença. Mas certamente também em pensamento e
até em sonhos. Contudo, uma situação rara de acontecer. Não era mulher
desconhecida dele, de seus beijos, de seus abraços, de suas carícias mais
íntimas. Pelo contrário, era sua namorada.
Situação rara de acontecer pelo fato de já
conhecê-la na sua nudez e no seu sexo e ainda assim a cada reencontro a
avistava sempre com o olhar de um jovem que se encanta lascivamente perante uma
bela jovem. O olhar do jovem despe a bela jovem, imagina sua nudez, deseja
tê-la. E efetivamente a tem nessa ilusão carnal.
Mas ele, desde algum tempo, que já não era
nada de estranho a ela. Quando ele avistou-a pela primeira vez, certamente teve
o mesmo olhar e o mesmo desejo de qualquer jovem ávido por desnudar aquela que
passa ou está à sua frente. Mas a situação agora era outra, já era sua
namorada. E por que agir assim com tamanho encantamento perante ela?
O amor. Somente o amor para decifrar esse
mistério que existe nos cantos e recônditos da alma humana. Amor sentimento
indecifrável. Amor sentimento tão visível e tão oculto que mesmo avistado ainda
se mantem escondido. Amor que não se contenta como amor e faz do ato de amar
uma sujeição.
Aos seus olhos, a bela adormecida enquanto
dormia. Aos seus olhos, a flor mais bela brotada ao amanhecer entre os lençóis.
Aos seus olhos, o espanto e a gratidão de tê-la sobre a cama como uma vestal em
núpcias. Como acariciar uma flor, como beijar uma pétala, como fruir do perfume
sem macular a essência?
E então a acariciou, roçou-lhe os lábios,
beijou-lhe a boca, tocou-lhe os seios, sugou-os levemente. E então, frêmito,
caçou-a ainda mais, buscou no seu corpo os escondidos e os adormecidos. E
então, ávido de prazer, em excitada labareda, em fogueira chamejante, sentiu
ser recompensado no mesmo desejo.
E que instante mais distanciado da razão. Que
momento mais enlouquecidamente tórrido no corpo humano. Entre sussurros e
gemidos, o silêncio ofegante sendo entrecortado por raios e furacões, por
tempestades e vendavais, por ventanias e turbilhões. Cai a estrela, cai um
pedaço da lua, ondas arremessam sobre a cama, um vulcão desperta faminto. O
ápice.
Não. O prazer não se perfaz com o sexo. A
vontade do outro não quer apenas o sexo do outro. O desejo de tudo não quer o
gozo como um final de ato. O sexo não é tudo, mas o amor é tudo. O sexo nunca é
tudo quando o gozo buscado é o prazer pelo amor e não pelo uso e fruição.
Mas ainda assim amou. Amou por que amava e a
teve em si e dentro de si como normal consequência de dois que se amam. E cujo
amor carnal apenas nasce sem ser plantado em grãos de desejo meramente carnal.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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