*Rangel Alves da Costa
Eu tenho uma vida mais simples e humilde do
que se possa imaginar. Sou apenas Rangel em tudo o que faço. Pertinho das seis
da noite e já estava indo em direção ao pequeno e antigo oratório que tenho
como verdadeiro céu. Acendo uma vela, avisto mais alentadamente a face de Deus,
converso com os santos, silencio em gritos minha oração, e depois corro aos
outros afazeres. Hoje, por exemplo, molhei a massa de milho, deixei em repouso
por alguns minutos, depois coloquei no fogão. Ainda não era hora do queijo com
ovos. Enquanto o cuscuz aprontava, logo ali pertinho eu já lavava roupas.
Calças, camisas, tudo sou eu mesmo que lavo. Também passo ferro. E prego botões
e arrumo meu guarda-roupa. Certa vez li que as roupas carinhosamente guardadas
chegam ao corpo como um afetuoso abraço. Acredito que sim. Quando bem guardadas
elas parecem sonhadoramente adormecidas, satisfeitas, felizes. Mas não somente
isso, pois cuido do meu quarto e do meu escritório com todo carinho. Não
preciso forrar cama porque durmo em rede. E não preciso cuidadosamente levantar
na madrugada para o início do dia porque durmo sozinho. Tomo um primeiro banho,
bebo um café forte e sem açúcar e depois começo a dedilhar qualquer coisa. Um
poema, um artigo, uma petição, um nada. Tudo no silêncio da hora, na canção
distante que me chega à memória, sem uma voz que me chame e diga “amor”. O que
mais dói é isso: sem a voz que me chame dizendo amor.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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