*Rangel Alves da Costa
Na idade munta e já no cansaço das vista,
avistando sombra adonde via somente sol, o que mai me dói é num mai poder tudo
avistar direitinho sem anublar um tiquinho. Pru mode disso que digo:
Se meus zóio oiasse e do zoiamento
avistasse... Avistava o que queria ver sem imaginar diferente aquilo que nóis
tem na frente, sem ter da feiura incerteza naquilo que é só beleza.
Se meus zóio oiasse e do zoiamento
avistasse... Avistava um mundo munto mió sem tanta mardade de fazer dó, sem
tanto sofrer de juntar em aió. Coisa mai triste é num poder enxergar o que os
zoinho possa alegrar.
Se meus zóio oiasse e do zoiamento
avistasse... Encrontava ainda a frô, a beleza do mio que embonecou, a rama da
melancia que se espaiou, a frô do argodão que branca cor, mai meus zoio anuviou
e nada mais avistou.
Se meus zóio oiasse e do zoiamento
avistasse... Sorria com a saia levantada na ventania, com a roupa no varal em
rebeldia, com o menino mandano biete de poesia. Tempo bom quano podia avistar
as coisa simples da vida pro todo lugar.
Se meus zóio oiasse e do zoiamento
avistasse... A lua em noite escura, a manga caída madura, o pomar de fruta pura
e nos zoiá a ternura do coração em brandura. Mai é mió nem avistar a fruta de
hoje do pomar e o que aos zóio faiz chorar.
Se meus zóio oiasse e do zoiamento
avistasse... Vizinha varreno carçada sem se meter em conversada, sem a vida dos
outo ser falada e sem a inocença mardada. E quano a janela se abrisse os zóio
apenas sorrisse.
Se meus zóio oiasse e do zoiamento
avistasse... O entradecer nas carçada e as amiga em proseada, o menino em
arribada e a menina enfeitada, que coisa mai animada na vida desassustada.
Se meus zóio oiasse e do zoiamento avistasse...
A janela e a porta aberta, pelo dia e na hora mais incerta, sem medo da chegada
do que a vida desacerta. Que vida é essa no cadeado, no passo mais assustado,
no povo assim desamado?
Se meus zóio oiasse e do zoiamento
avistasse... Queria avistar um jardim, uma roseira um jasmim, um pirilampo, um
querubim, uma mão dada por fim. Mai nada disso avisto e pru isso me apregunto
preguntando se existo.
Se meus zóio oiasse e do zoiamento
avistasse... A nuve prenha e bonita, cheia d’água e bendita pra se derramar no
sertão, trazeno relampo e trovão, pra chover em floração. Entonce a terra
prantá e da coieta juntar o que o viver precisar.
Se meus zóio oiasse e do zoiamento
avistasse... A barra do arvorecer, a luz do sol a incandecer e toda luz puder
ter. Nada mais bonito ao oiá do que puder avistar toda cor a se espaiá do arto
a todo lugar.
Mai já num avisto não. Os ano apagou meu
clarão. O que meus zóio avistava agora é escuridão. Ainda avisto a sombra e o
que se mexe no chão, mai é tão pouco que avisto que me vejo em aflição.
A idade vai cegando o zóio, a gente já num vê
mais e toda luz ficou pra traiz. Para seguir adiante é na lentidão delirante,
cai aqui cai acolá, se não puder segurar naquilo a me guiar. O cajado no breu
agora nos zóio meu.
Tudo passa e pouco vejo, quando munto um
relampejo. A frô num avisto não nem do sol o seu clarão. A noite toda em mim
numa tristeza sem fim, nessa cegueira em mim. Mas a vida mermo assim, um dia a
luz e agora o breu ruim.
Ai Deus se meus zóio oiasse e do zoiamento
avistasse...
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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