Rangel Alves da
Costa*
O elemento
sal não significa apenas cloreto de sódio ou a definição repassada pelos
livros: substância cristalina, de cor branca, solúvel e que usualmente serve
para temperar alimentos, ou a substância que resulta da combinação de um ácido
com uma base química.
O sal
também pode significar preservação da vida, do espírito, da essência do ser. No
mesmo sentido o ânimo da fé e da perseverança. Através do sal do caráter e da
amizade se preserva as relações humanas. Diz-se também do sal que o ser humano
amarga em diversas situações da vida.
Neste
aspecto, tem-se que a vida não é feita apenas de coisas boas, agradáveis,
adocicadas aos olhos e ao coração. Nem tudo provoca apenas prazer, deleite, boa
experiência, pois há uma forçada degustação de coisas e fatos desagradáveis, de
instantes salgados e indesejados.
Em tais
situações, comumente se diz que a pessoa também experimenta no sal o sabor
daquilo que não desejou. Ante o sofrimento surgido, então se afirma do sal da
vida que usualmente chega com amargo sabor. A tristeza, a melancolia, a
aflição, as dores, os infortúnios, tudo isso pode ser tido como experiências
salgadas.
Diz-se
salgadas exatamente porque em contraste com os prazeres, as felicidades, as
doçuras da existência. É lógica e consequência, vez que absolutamente nada
permanece ou sempre acontece segundo o desejado. Desse modo, através das
experiências de sal é que também se experimenta as angústias e os dissabores.
A bem
dizer, quase nada existe sem que traga consigo um pouco de sal. É como uma
bula, uma receita de vida, sendo da normalidade que assim aconteça. Tanto para
não adoçar em demasia como para fazer recordar que o sal tempera todo sabor,
ainda que o açúcar prevaleça naquela fórmula.
Afirmar
que o sal tempera o sabor remete a uma reflexão. Sendo o sal também um símbolo
de sofrimento e de tristeza, experimentar o seu sabor significa não apenas a
consciência de que as coisas indesejadas também acontecem como temperar o
próprio espírito para as bonanças vindouras.
Contrariamente
do que se imagina, a experiência salgada não se desfaz quando desaparece o
motivo da aflição ou quando a dor se transforma em contentamento. O sal faz
parte da essência do ser, e assim permanece no seu interior. Daí ser preciso
que o indivíduo reconheça o gosto salgado que pode afluir a qualquer instante e
assim esteja preparado para senti-lo e também evitá-lo.
A verdade
é que a vida e o próprio homem são compostos de doçuras e azedias. A lágrima
desce temperada de sal, o suor escorre salgado. Não há quindim ou cocada que
não leve pitadas de sal na sua feitura, qualquer sobremesa doce traz a química
salgada no seu sabor. Contudo, o que é para ser salgado geralmente dispensa
qualquer porção de açúcar.
Nisto a
afirmação de que o sal está em tudo e prevalece sobre tudo. O sal da terra como
forma de luta, de esforço e cansaço, para produzir. Mas também o sal da terra
simbolizando a purificação. Eis que o sal tem de o dom de conservar aquilo que
foi gerado das boas sementes.
A Bíblia
se refere ao sal como gesto de firmeza e de aliança: “É uma aliança de sal
perpétua perante o Senhor, para você e para os seus descendentes"
(Números, 18:19). Como perseverança de fé: “Vocês são o sal da terra. Mas, se o
sal perder o seu sabor, como restaurá-lo? Não servirá para nada, exceto para
ser jogado fora e pisado pelos homens” (Mateus 5:13).
Nada,
pois, é insípido. Há sal em tudo. Na palavra dita, na palavra ouvida. No amor e
no afeto, de modo que o seu tempero seja suficiente para manter o sabor
desejado, numa medida onde o querer não se descuide da realidade. Nesta, o sal
em cada passo, como prova e lição de tudo. Amarguras que devem ser consumidas
como fortalecimento à alma e ao espírito.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
Um comentário:
E tudo deve ser sempre muito bem dosado.
Belo texto!
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